Vendendo e se escondendo, a vida de um camelô em Macapá

Ambulante fala sobre o seu dia a dia no Centro comercial
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Eles ocupam o passeio público, geram reclamações entre os lojistas, mas são muito procurados pelos consumidores de baixo poder aquisitivo, e que muitas vezes preferem comprar com eles os produtos que procuram. São os vendedores ambulantes. E é nesse período de Natal que mais se vê camelôs nas calçadas. Sem organização do poder público, eles dão um visual de desorganização para a cidade, mas no fundo são trabalhadores na luta diária da sobrevivência. Conversamos com um dos mais antigos ambulantes da capital sobre dificuldades, o medo da fiscalização, a indignação com o poder público e a luta pelo sustento da família.

Dos 34 anos de idade de J.O.G, metade foi vivida no comércio irregular no centro comercial. Ele prefere manter sua identidade em sigilo pra não chamar atenção da prefeitura.

SelesNafes.com: Há Quanto tempo o senhor foge das fiscalizações?

J.O.G.: Trabalho no centro comercial há 15 anos. E em todos esses anos sempre tento estar um passo a frente da fiscalização.

SN.com: O que acontece se a sua mercadoria for apreendida?

J.O.G.: Nós reclamamos muito com os fiscais, argumentando que eles estão levando o sustento de uma família, mas sempre somos rotulados de bandidos. Eles afirmam que no meio dos vendedores ambulantes há assaltantes, estupradores e drogados. Não coloco minha mão no fogo por ninguém, mas conheço muitos pais de família que estão nessa vida porque não conseguem um bom emprego por conta da falta de estudo. Esse é o meu caso.

SN.com: O senhor já tentou sair da ilegalidade?

J.O.G.: Nós ouvimos muitas promessas dos governantes, porém nenhuma se concretiza. Há cerca de cinco anos o projeto da vez era o shopping popular, que seria entregue pela prefeitura aos vendedores de rua, porém o tempo foi passando e o que observamos foi só o início de uma obra. Enquanto eles não nos dão um lugar próprio nós continuamos pelas ruas.

Material em destruição no pátio da Semur

Material sendo destruído no pátio da Semur – 2010 (Foto: Arquivo)

SN.com: Você já teve a sua mercadoria apreendida?

J.O.G.: Não faz muito tempo que fui pego por uma das fiscalizações. Acho que foi em junho. Estava na Feira do Pescado quando a fiscalização chegou e levou o produto de todos os vendedores. Alguns tentaram fugir, mas eu não corri, pois sei que não estou roubando, nem matando, quero apenas garantir o sustendo das minhas quatro filhas.

SN.com: Há alguma outra dificuldade além do olhar atento às fiscalizações?

J.O.G.: Com certeza! Só o fato de estarmos vendendo em barracas improvisadas nosso produto já perde valor, pois as pessoas afirmam que o que vendemos é tudo falsificado. Mal elas sabem que vendemos os mesmos produtos encontrados nas importadoras da cidade, com diferença de não termos um espaço físico próprio.

SN.com: Mas o senhor já vendeu produto é falsificado?

J.O.G.: Essa é a mentalidade que atinge todos os compradores. Eles chegam e falam isso só para tentar garantir um preço melhor. Mas isso é uma mentira, pois se meu produto é falsificado, muitas lojas também vendem os produtos falsificados, às vezes a preços mais altos, e nós somos chamados de falsificadores, pois colocamos um preço menor no mercado.

Fiscalização no centro comercial

Fiscalização no centro comercial

SN.com: Mas e se a fiscalização pedir as notas desses produtos. Você tem como provar que eles foram obtidos de forma lícita?

J.O.G.: A maioria dos vendedores que teme as fiscalizações está com as notas fiscais dos produtos. Eu sou um que guardo cada nota fiscal para comprovar que meus produtos são comprados dentro da lei. Até mesmo para comprovar a alguns compradores que fazem o tipo “linha dura” e afirmam que só vendemos produtos falsificados.

SN.com: Você já tentou arrumar algum outro emprego?

J.O.G.: Estudei até o segundo ano, quando tive de parar os estudos porque minha namorada estava grávida. Me segurei na forma mais rápida de emprego que consegui. Me tornei vendedor ambulante. Hoje, se quiser trabalhar de maneira formal vou ter dificuldade para encontrar emprego, pois não tenho experiência em outras áreas. Talvez conseguisse de maneira mais rápida trabalhar em lojas de vendas, mas esse emprego não garantiria o sustento das cinco pessoas que dependem de mim. O salário é baixo para muito trabalho.

SN.com: Atualmente só você sustenta a casa?

J.O.G.: Sim! Minha esposa era doméstica, mas está desempregada. Então é das vendas feitas no centro comercial que levo o sustento de casa. Talvez por isso eu esteja em tantos lugares ao mesmo tempo. Não podemos ter um lugar cativo, pois os fiscais estão de olho. Hoje estou aqui, mas amanhã posso estar em uma feira, na Avenida Padre Júlio (Maria Lombaerd) ou em algum ponto da Cândido Mendes.

Ambulante fala sobre o seu dia a dia no Centro comercial

Ambulante fala sobre o seu dia a dia no Centro comercial

SN.com: E nesse período de natal como está a fiscalização?

J.O.G.: Nesse período é o que demanda mais atenção dos vendedores. Às vezes passamos o ano todo sem receber uma fiscalização, mas no período de Natal é tiro e queda. Elas sempre acontecem. Mas é fácil de explicar isso, pois eles sempre apreendem e não sabemos o que é feito com o material. Acho que o Amapá é o único estado onde não vemos aquelas ações de queima de mercadorias apreendidas. Se você assiste os jornais na televisão isso sempre aparece. Aqui é diferente. Queria saber para onde esse material vai parar.

Seles Nafes
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