A Igreja Nova Esperança vai abrir as portas pela primeira vez no Amapá durante as comemorações da Semana Santa. Pelo menos são esses os planos do pastor missionário Danilo “Yeshua”, que na verdade chama-se Danilo Leandro de Souza Deodato, um paulista que descobriu a homossexualidade na adolescência quando já era evangélico, foi rejeitado pela família e agora se dedica ao trabalho missionário “inclusivo”.
Danilo chegou em Macapá no último dia 27 para organizar a criação da primeira “igreja gay” do Estado, e a segunda do Norte do país (já existe uma em Manaus de outra denominação). Em entrevista ao site SelesNafes.Com, Danilo disse que não veio confrontar outras denominações, mas sim, somar esforços com outras igrejas mais tradicionais que pregam o Evangelho.
Ele falou da infância, do rompimento com a família, da descoberta de sua homossexualidade, e das passagens bíblicas que, segundo ele, são usadas de forma equivocada para condenar os homossexuais. Danilo adiantou que pretende fazer um congresso aberto para membros de outras igrejas que queiram entender as bases do que ele chama de “Evangelho Inclusivo”.
SelesNafes.Com: Quando e em que circunstância você começou a frequentar igreja evangélica?
Danilo Yeshua: Vem da minha infância. Meus pais eram da umbanda, e em frente à minha casa tinha uma igreja evangélica. O pastor passava nas casas sempre pedindo que os pais permitissem que seus filhos fossem à igreja. Minha mãe deixou, e eu, pequenininho, comecei a frequentar. Ia para a escola dominical, ouvia histórias bíblicas. Minha mãe largou a umbanda e ficou um bom tempo sem religião. Eu continuei frequentando a igreja, cresci assim, só que dentro de mim tinha algo diferente, algo que me causava sofrimento. Quando chegou na minha adolescência começou a vir à tona. Eu tinha um conflito interno comigo mesmo, eu não era feliz…
SN: Era por causa da sexualidade?
DY: Sim.
SN: Como sua família reagiu?
DY: Tenho duas irmãs mais velhas e evangélicas de igrejas tradicionais. Com o tempo meus pais se converteram, mas minha família nunca aceitou minha sexualidade. Há oito anos não tenho contato com minha família por decisão deles.
SN: Seu pai ainda é vivo?
DY: Não sei. Não tenho qualquer contato com eles. Meu pai é o típico nordestino que foi de “pau de arara” (caminhão que transporta trabalhadores rurais ou migrantes) para São Paulo. Meus pais se mudaram da casa onde nós morávamos, e não me deixaram nenhum tipo de contato para mim. Fizeram questão que eu não soubesse onde estão. Eu não sei se estão bem, assim como eles não sabem que eu estou aqui em Macapá fazendo a obra do Senhor.
SN: Você é feliz sendo missionário?
DY: Sim, muito.
SN: Quando surgiu a igreja inclusiva?
DY: A igreja evangélica inclusiva surgiu nos Estados Unidos na década de 1960. Quando foi trazida para o Brasil, os missionários trouxeram essa nova visão. Até mesmo algumas igrejas mais tradicionais já aceitam…
SN: O fiel gay pode ser batizado e ser membro da igreja?
DY: Sim, nos Estados Unidos existem até reverendos gays, pastoras lésbicas…
SN: É assim na Igreja Nova Esperança?
DY: Sim.
SN: Heterossexuais podem frequentar?
DY: Claro, terão as mesmas oportunidades. Nas nossas igrejas temos membros que levam amigos, primos, pais, e outros parentes que são heterossexuais. Eu já ouvi de visitantes depoimentos de que se sentiram bem na nossa igreja, sentiram o acolhimento, o amor…
SN: Que embasamento bíblico a igreja inclusiva utiliza para dizer que a homossexualidade é permitida?
DY: Algumas passagens que são usadas para nos condenar, na verdade são distorcidas. Levítico (livro das leis no Velho Testamento) diz que quando o homem se deita com outro homem está praticando abominação (capítulo 20m versículo 13). Na verdade o povo judeu era um povo escolhido, a proibição ali era que o homem não se deitasse com outro homem pagão. Levítico é uma lei que foi banida, uma lei que determinava o apedrejamento, proibia o consumo de carne de porco, se seguirmos Levítico não poderemos nem tomar um simples tacacá por causa do camarão.
– Na primeira carta aos Coríntios (capítulo 6 versículo 9), Paulo lista quem não herdará o Reino de Deus. E lá diz que estão fora do Reino de Deus os homossexuais. Só que na versão original, em hebraico, a palavra original é “covarde”. Na tradução para o latim houve a distorção. Outra passagem que nos ampara é Atos capítulo 10, versículo 34, que garante que Deus não faz acepção (discriminação de pessoas). O amor de Deus é incondicional.
SN: As igrejas tradicionais proíbem o consumo de álcool, o tabagismo, o sexo antes do casamento…e na Nova Esperança?
DY: Seguimos a Bíblia à risca. Não distorcemos, apenas mostramos que a Bíblia não condena a diversidade sexual, mas o que destrói a vida da pessoa para nós é ilícito, não aceitamos aquilo que vai destruir a vida, o casamento e a família.
SN: E o sexo, é permitido?
DY: A legislação brasileira nos permite o contrato de união estável, então o sexo só é permitido nessa situação, com a união oficializada.
SN: Você está preparado para as críticas aqui em Macapá?
DY: Eu compreenderei as críticas negativas e positivas. É natural. O Evangelho Inclusivo é novo no Brasil, tem apenas 10 anos. Em São Paulo, por ser uma cidade mais cosmopolita e ter uma outra mentalidade, geralmente essas ideias são acolhidas mais rapidamente. Aqui no Norte, onde existe uma cultura diferente, entendo que será difícil a aceitação. Ninguém é obrigado a nos aceitar, mas todos são obrigados a nos respeitar, porque nosso país é laico (nação que dá liberdade a religiões).
DY: Não temos casos de intolerância religiosa aqui no Amapá. Sua igreja já sofreu ataques?
SN: Já. Em Fortaleza (CE) nossa igreja teve as paredes pichadas com frases do tipo “morte aos gays!”, “vão pro inferno!”. Nossa pastora, Sara Cavalcante, pediu ajuda e os nossos pastores foram até lá pedir que ela não desistisse. Hoje a nossa igreja de Fortaleza é a maior do Nordeste.
SN: Quantos membros a Igreja Nova Esperança tem no Brasil?
DY: Cerca de 10 mil membros
SN: Só da Nova Esperança?
DY: Sim. Abrimos até uma célula na Itália, onde um pastor nosso esteve e viu travestis brasileiras que se prostituem. Fizemos cultos com a participação delas.
SN: A igreja daqui já tem data para ser inaugurada?
DY: A programação de inauguração será realizada na Semana Santa. Penso em começar a programação com a exibição de um filme com a temática LGBT (sigla para Lésbicas, Gays, Bissexuais e Travestis). Escolhemos o filme “Orações para Bobby”. Farei um congresso de um dia sobre homossexualidade e a Bíblia, aberto, inclusive, para pastores e membros de outras congregações tradicionais que são curiosos sobre a nossa visão. Também estaremos batizando os primeiros membros.
SN: O que você diria para os outros Cristãos?
DY: Meu objetivo é plantar a Palavra, é falar da salvação, somar com as outras igrejas e dizer para as pessoas que elas não abandonem o amor em Deus. Não vim para afrontar ninguém, não praticamos nenhuma heresia, vim cumprir a missão de levar o Evangelho. Entendo que é polêmico porque nossa igreja está aberta com amor para todos que foram discriminados.