Um rapazola nem tão apegado aos estudos, mas já bem consciente que precisava estudar pra melhorar de vida —era o que os pais, ‘seu’ Benigno e dona Maria mais cobravam dele.
De mais dado ao futebol, acabou virando radialista, jornalista, bancário e, de repente, também empresário, no ramo da comunicação.
Casado e pai de 4 filhos, no rádio ganhou notoriedade também por conhecidos bordões — ‘Lugar de repórter é na rua’; ‘Nas ruas e com as ruas’; ‘Conte-me tudo, não esconda nada’; ‘Eu inventei!’, enfim … Tantos outros que ainda hoje andam de boca em boca por aí.
No rádio e também ainda bancário, Luiz Melo foi pra TV Amapá (afiliada da Rede Globo), onde permaneceu por algum tempo como diretor-geral da emissora de Phellipe Daou, em Macapá.
Depois mergulhou no jornalismo impresso, dirigindo o Jornal Novo Fronteira, ao lado de Ezequias Assis, pra depois, já com os filhos, fundar o Jornal Diário do Amapá. Paralelamente, fundou a Rádio Antena 1 FM (ex-Nacional FM/Radiobras) e, num passo seguinte, também a Diário FM, concessão que ganhou quando Hélio Costa (ex-Rede Globo e Voz da América) era ministro das comunicações.
Com 61 anos no costado, ele tem uma rotina quase militar. Sai do jornal perto das 11 da noite e já por volta das 5 madruga na Diário FM, quando começa a trabalhar o programa ‘Luiz Melo Entrevista’, que apresenta das 7 às 9, diariamente. E, a partir daí, já fica por conta do jornal, ambos no mesmo prédio, que pra ele é a segunda casa e onde passa a maior parte de seu tempo —mas sem descuidar da saúde, com sessões de ginástica pelo menos 3 vezes na semana.
“Faço os diabos durante o dia, mas acabo arrumando tempo pra tudo. Até mesmo pra botar conversa fora com os amigos mais chegados”, adita Melo.
Sobre música:
Luiz Melo: Ah, não desgrudo. Não sou do tipo ‘metido à besta’, que discrimina este ou aquele gênero musical. Pra mim é arte. Sempre tem algo do que se gostar. Mas adoro Bossa Nova. O João Gilberto é fenomenal. Também sou apaixonado pelo Gilberto Gil. O Caetano seria melhor se não metesse o bedelho em tudo que dá na telha dele. Acaba se desgraçando. Mas sábado, depois das 7 da noite, o DVD do Tim Maia não sai da tela da minha sala de trabalho. O cara é bom pra caramba. Gosto muito!
Pois, é, foi nesse clima que a repórter Cássia Lima trocou mais de 1 hora de animada prosa com o Luiz Melo, sobre a carreira dele na imprensa, momentos marcantes, política e, claro, o que ainda tem naquela cabeça pro futuro, nos negócios dele na comunicação.
E o papo rolou assim…
Então, Melo, como você ingressou no jornalismo?
Luiz Melo: Nada buscado. Planejado. Acho que acabou acontecendo assim, naturalmente. Se por acaso ou não, só Deus sabe. Se tinha talento praquilo, não sei. Aflorou depois, quem sabe. Acho até que ajudado pelo meu gosto pelo futebol.
O Jota Araújo, um radialista da época, namorava uma prima minha, que morava com meus pais. A gente conversava muito sobre esporte e ele gostava porque, coincidentemente, era o que fazia na Rádio Educadora, onde trabalhava. E acabou me levando pra lá pra ajudá-lo. Claro, queria mesmo era agradar minha prima, né?!
E as dificuldades?
Luiz Melo: Ah, muitas! Mas as superei porque fui tomando gosto, persistindo e aprendendo. Nem pensava em dinheiro. Queria mesmo era aprender a fazer aquela coisa nova que estava acontecendo na minha vida.. E, dedicado, fui em frente, superando barreiras.
O que você fazia no rádio?
Luiz Melo: Esporte. O futebol, principalmente, era forte aqui, naquela época. Comecei como ‘foca’. Cobria treinos e levava anotações pro Jota Araújo redigir o noticiário. Ele botava papel na máquina e eu ficava por trás, olhando como fazia e fui aprendendo. Depois — acho que a veia do talento já tinha aflorado — acabou ficando tudo por minha conta. Ia atrás da notícia, redigia e também botava no ar.
Eu e o Luiz Roberto, que também começava no rádio, chegamos a formar uma dupla (Luca Melo/Luca Roberto) que virou o rádio de cabeça pra baixo. Criamos juntos um tal de ‘RE dá Olé’, que foi um verdadeiro sucesso. Audiência absoluta aos domingos. Sorte nossa. Na época ainda nem se pensava em televisão. E a nossa única concorrente era a Difusora, que mantinha aquele padrão tradicional, sem muita inovação … essas coisas. Mas era uma emissora respeitadíssima, principalmente porque seu pessoal era bem mais experiente que a gente. Mas ganhávamos na audiência porque a Educadora era novidade na cidade e jogava com um time entusiasmado, era uma molecada ousada e cheia de vontade de fazer o melhor.
Como era o Amapá nesse tempo?
Luiz Melo: Os ‘milicos’ mandavam aqui. Quando comecei era o Gal. Ivanhoé Martins quem governava. Botava quente mesmo. Lembro que ele, todos os sábados, ocupava um horário das 8h às 9h (noite) na (Rádio) Difusora, com um pronunciamento escrito pelo Tio Alcy (pai da jornalista Alcinea Cavalcante), por onde prestava conta do que o governo havia feito durante a semana. E um certo dia, como a nossa rádio era mais potente (novinha em folha), um programa de nome ‘690 – O telefone do sucesso!’ estava penetrando no cristal do transmissor deles e exatamente em cima da gravação do governador.
Ele, ouvindo na residência oficial, ligou pra RDM pra saber que diabo era aquilo e o operador botou a culpa na Educadora, que já não era da simpatia dele, porque metia o pau no governo dele. Pegou o telefone e ligou pra Educadora e o Sabá Oliveira (apresentador), acreditando ser um ouvinte, botou no ar (era tudo ao vivo) e mandou bala: ‘690 – O telefone do sucesso!’ … Qual é a sua música? E o Gal. Ivanhoé mandou ver: “Música porra nenhuma! Aqui quem fala é o governador Ivanhoé Martins!
Resumindo: no dia seguinte quase ele bota o padre Botan (diretor da rádio) na cadeia. Foi um Deus nos acuda. E a gente (a molecada) adorava tudo aquilo. E nem ligava pras ameaças dele.
Havia liberdade de imprensa?
Luiz Melo: Nem sei te explicar. É o que acabei de falar. A gente não dava bola pra nada. Talvez nem se tinha noção disso. O que se queria mesmo era ousar. Fazer algo diferente. Ganhar da rádio do governo. Derrotar a rádio do general. Era o nosso barato! E a gente conseguia mesmo, porque a nossa molecada era boa pra caramba. E ousada. Muito ousada. A Educadora foi uma verdadeira escolinha pra todos nós. Sobre ‘cutucar’ o governo do Ivanhóe, eram os padres que mandavam a gente botar quente em cima dos ‘milicos’ e a turma fazia e acontecia. Às vezes dava uma cadeiazinha, mas sempre aparecia alguém pra arrumar as coisas, com aquela desculpa … ‘São garotos ainda, general. Não fazem por mal. São aqueles padres lá que botam esses meninos na perdição’. E acabavam soltando a gente. Tínhamos problemas, sim. Mas a gente dava uma dor de cabeça danada pra eles. Oh, se dava!
E a ditadura?
Luiz Melo: Acho até que a gente nem tinha tanta noção do que era aquilo. Preocupou um pouco quando houve um tal de ‘Engasga-Engasga’ na cidade, com mocinhas sendo agarradas por pessoas misteriosas nas ruas. Pelo menos era o que chegava aos nossos ouvidos. Ou mandavam chegar, né? O Exército foi pra dentro da rádio e eu que nunca tinha visto aquilo. Fiquei um pouco apavorado, principalmente quando levaram um colega nosso preso (Odilardo Mendes), retirado de dentro da rádio e com armas pesadas na cabeça dele. Fiquei com medo. Ficaram por lá, na rádio, umas duas semanas, mas depois desapareceram.
Diziam que aquilo era coisa de comunista e, por conta disso, andaram até botando a culpa no Capiberibe … Que comia criancinha, aterrorizava velhinhas … Tudo bobagem. Capi nunca foi flor de se cheirar, mas não fazia isso, não!
Enfim, esse negócio de ‘Engasga-Engasga’ era tudo bobagem. Tudo invenção deles pra criar clima de terror na cidade. Falaram que era pra justificar pra Brasília necessidade de aumento da tropa no Território. Mas nada claramente explicado … Tudo bobagem.
Trabalhou por quanto tempo na Rádio Educadora?
Luiz Melo: Se lembro bem, de 69 até mais ou menos 78, por aí. Não recordo bem. Saí quando passei no concurso do BASA (atual Banco da Amazônia), aí tive que ir pra Belém e depois Altamira, mas sempre fazendo rádio, apesar de o banco, na época, não permitir qualquer atividade paralela. Pagava bem pra caramba! Mas dava meu jeito, gostava demais daquilo, como gosto até hoje.
Enquanto fora de Macapá, passei uns tempos pela Marajoara e Liberal, em Belém, mas só como bico e nas transmissões esportivas. Me achavam um bom repórter esportivo e sempre me chamavam.
Lá em Altamira, tinha uma rádio tão ruim que eu até criei um ‘slogan’ pra ela: “Pioneira, 20 anos de besteira!” Mas era tudo molecagem, o dono era meu amigo e sabia que eu não ia levar aquilo pro ar. Era na hora do boteco, quando a gente enchia a cara. Fazer o quê? No meio da selva…(risos). Depois consegui voltar pra Macapá.
E como foi trabalhar na TV Amapá?
Luiz Melo: Ótima experiência. Era amadorismo puro. Uma câmera apenas pra externa e estúdio. Pouca coisa funcionava bem. Foi um desafio danado pra mim, enquanto diretor. Mas conseguimos avançar bastante, no telejornalismo principalmente, quando melhoramos o Jornal do Amapá (antes do JN), botamos no ar o Bom Dia Amapá (antes do Bom Dia Brasil) e o AP/TV (noite, antes Jornal da Globo). E com gente mais experiente, tipo Correa Neto, João Silva, Nilson Montoril, Guilherme Jarbas, Jota Ney, pessoas que já eram do meio e gozavam de respeito na comunidade. Ajudei, mas aprendi muito também. Mesmo porque procurava ficar na cola da Rede Globo e onde havia um congresso lá estava eu. Tanto que o Armando Nogueira, na época diretor de jornalismo, aprendeu a gostar de mim e volta e meia me ligava pra saber como iam as coisas por aqui. Me chamava de ‘meu menino’. Era um cara muito legal. Gostava de ensinar pros outros do muito que já sabia. Eu, menino vivo, fazia com ele o que faço hoje com o Sarney. Ouvindo muito e procurando tirar um pouco da ‘sabença’ (sic) que ele tem. Política à parte, Sarney é um intelectual. Um homem das letras. E gosta muito de conversar sobre tudo isso. Aí eu, oh, vou absorvendo, né? Quase sempre vai à minha casa, quando está em Macapá. E passamos horas conversando sobre tudo, menos de política. Nos respeitamos!
E depois da TV Amapá?
Luiz Melo: Fiz uma sociedade com os Borges (família do ex-senador Gilvan Borges) e fundamos a Antena 1. E nesse meio tempo, criei com o Ezequias Assis (tio do Silas, da Gazeta) o Jornal Fronteira, que tinha sede no Buritizal. O Fronteira era uma coisa meio artesanal. Começava com um ‘boneco’, tudo com cola e papel. Depois que passou a ser pelo computador. Foi assim que o jornal começou a se profissionalizar.
Quando você fundou o Diário do Amapá?
Luiz Melo: Foi muito difícil logo no início. Eu já participava de uma rádio, mas queria um negócio para tocar com a minha família, meus filhos. Aí parti pra briga. Aluguei um prédio (hoje é nosso), contratamos alguns colegas do ramo, que eu já conhecia e montamos o Diário do Amapá. Um diário que não circulava diariamente, que até virou gozação pra cima de mim. Mas sabia o que estava fazendo. Era quinzenal, passou pra semanal e depois virou diário. E nem tivemos que pisar no pescoço de ninguém.
E o programa Luiz Melo Entrevista, como surgiu?
Luiz Melo: Tinha saído da TV Amapá e, de repente, percebi que ninguém já não dava mais bola pra mim. Quer dizer, tinha perdido a importância. Sem audiência já era. Os caras nem mais te recebem. É um jogo cruel! Por isso que, hoje bem mais experiente, já não me iludo com paparicos e tapinha nas costas. É tudo porque você tem o que dar pra eles. E é esse o conselho que tenho passado praqueles que estão começando, pra que não se iludam, não se empolguem e, em vez disso, deem duro, mostrem competência, façam com que eles te respeitem. Hoje fico triste quando leio um colega de imprensa falando horrores de um outro … Quer dizer, nem nós nos respeitamos. Então, como cobrar respeito?
Qual foi o diferencial do programa?
Luiz Melo: Eu comecei a convidar prefeito, governador e deputados. Isso bombou o programa. Foi quando começaram a perceber que existia uma rádio com um diferencial. Eu que criei esse formato opinativo, com repórteres nas ruas, participação efetiva dos ouvintes e com toda essa interação que faz o sucesso do programa até hoje.
Qual a maior dificuldade que você já enfrentou no jornalismo?
Luiz Melo: Foi quando adoeci e passei mais de 2 meses internado em São Paulo. Voltei por baixo, porque para muitos eu não renderia mais nada. Mas, com meus filhos do meu lado, encaramos tudo como se fosse um novo desafio e, oh, recuperamos não só a audiência, mas principalmente o respeito das pessoas, porque agora estávamos sozinhos e sem qualquer envolvimento político.
Ao longo da rua carreira como você lidou com a liberdade de expressão?
Luiz Melo: Tem pessoas que inventam coisas, criam situações e gostam de aparecer. Eu sou realista e falo a verdade. Hoje mesmo um assessor me ligou tentando me censurar, mas eu não ligo. No jornalismo é assim, se você dá atenção a essas coisas, elas aumentam. Hoje a tudo escuto e se puder converso. Não sendo possível, procuro esquecer, mas só vou pra briga quando já não houver mais alternativa de entendimento. Antes eu era mais atrevido, atirado. Hoje converso, mas sem me acocorar.
Qual foi o momento mais marcante da sua vida jornalística?
Luiz Melo: Jornalisticamente, né? Isso aconteceu na rádio Antena 1, durante a Operação Pororoca, quando a PF prendeu um bocado de gente, alguns com os quais convivia no dia-a-dia, inclusive. E que viraram meus inimigos porque não tive como omitir o nome deles. Nesse dia, eu comecei o programa às 7 horas e terminei quase 2 da tarde. Eu consegui acompanhar a Operação todinha. A audiência era toda minha. E todos queriam participar do programa.
Como é concorrer com a internet ?
Luiz Melo: Eu não digo nem concorrer. A internet veio pra nos ajudar, tornar nosso trabalho mais veloz. Eu acho que os dois têm condições de conviver, assim como ocorreu com outros meios de comunicação. O digital chegou para deixar o impresso mais presente e rápido.
E sua passagem pela política, como candidato?
Luiz Melo: Isso foi bobagem. Os colegas começaram a me dar corda para me candidatar. E eu, maluco, fui lá e me candidatei a deputado estadual. Eu nem lembro o ano, foi pura tolice.
É filiado a algum partido?
Luiz Melo: Sim, me filiei ao PTB dessa época que me candidatei. Eu deixei de mão, mas sou filiado até hoje.
Já foi censurado judicialmente?
Luiz Melo: Eu respondo uns 70 ou 100 só do (senador) Capiberibe. Já fui condenado, mas também ganhei algumas ações. É, talvez, por isso que ainda brigamos.
O que o Amapá precisa hoje para se tornar um potencial econômico da Amazônia?
Luiz Melo: Primeiro que o próprio governo tem que atentar para o potencial que o estado tem e depois investir em capacitar pessoal.
Você é satisfeito com o atual governo?
Luiz Melo: Acho que Camilo está fazendo uma boa gestão. Mas andou se descuidando do lado popular do governo e isso pode acabar sendo ruim pro projeto de reeleição dele. Mas é cedo ainda pra se fazer um pré-julgamento sobre o que pode acontecer em outubro. Ele é competente e deve conhecer estratégias pra mudar rumos do jogo.