ANDRÉ SILVA
A história da música popular amapaense está recheada de episódios fantásticos e figuras ilustres. Bandas que fizeram sucesso na década de 1970, como Os Setentrionais e os Mucamos, trouxeram para o Amapá a novidade de músicas que já eram tocadas pelo resto do Brasil.
Era 1972, três amigos, cada um com seus instrumentos (guitarra, violão e uma bateria feita com latas), resolveram montar uma banda. No início, era só curiosidade e entusiasmo pelo novo, mas não demorou muito para a brincadeira ficar séria.
“No fundo de casa no Bairro do Trem, tinha um cara chamado ‘Barrasco’. Ele quem montou a bateria de lata e começou a tocar. Eu ouvi o som e como já tinha uma guitarra, decidi ir até lá. Depois apareceu o Waldene e começamos a brincar. Só que a coisa começou a ficar séria. Porque nós não queríamos mais aquilo assim. Queríamos uma bateria de verdade. Compramos de um policial que tinha uma encostada lá, mas o Barrasco não quis mais”, contou com saudosismo Lucivaldo Coelho dos Santos, dono do nome Os Setentrionais.
Após a saída de Barrasco, a banda teve que conseguir um outro músico. Desta vez, quem assumiria a cozinha da banda seria Pilão (falecido). A banda passou então a ser composta por Lucivaldo na guitarra, Marconde no violão e Pilão na bateria, mas ainda faltavam músicos.
Em 1974, a ex-deputada federal Fátima Pelaes completava 15 anos e a banda foi chamada para tocar. Neste ano um novo componente entrou na banda não como músico mas sim empresário: Manoel Góes, que hoje é empresário e proprietário de uma loja de importados na cidade.
“Como o Manuel não aprendeu a tocar nenhum instrumento ele foi nosso empresário. Ele quem fechou a nossa primeira tocada que foi no Esporte Clube Macapá. Alugamos um som pra fazer a voz, porque nesse tempo nem todo mundo tinha recursos para ter uma aparelhagem. Tocamos e foi um sucesso”, lembrou Lucivaldo.
Neste mesmo ano, algo aconteceu. Serra do Navio vivia o apogeu da exploração de minério. A Icomi era quem explorava o a matéria prima e realizava festas de fim de ano para os funcionários e moradores do local. Foi o primeiro cachê gordo da banda. E acredite, foi tudo por acaso.
“Era o lugar mais lindo de Macapá. Uma banda de Belém do Pará, ‘Musa’ havia sido contratada para tocar mas algo aconteceu e elas não puderam vir tocar. Todas as bandas de Macapá estavam ocupadas. Naquela época todos os clubes da cidade faziam suas festas de fim de ano, mas tinha a nossa, a banda sem nome”.
Dessa vez a banda teria que levar um baixista, mas o problema era encontrar um músico em cima da hora para viajar. Naquele ano havia um circo acampado na praça Nossa Senhora da Conceição. Neste lugar, havia um baixo e um baixista.
“Cheguei pro dono do circo e negociei com ele o contra-baixo e alugamos o baixista junto (sorri). O violão não tinha traste e só quem sabia tocar era o baixista do circo e levamos ele junto. Mas faltava algo: o nome da banda. E agora? Antes de sairmos apareceu o Asarias Neto e ele sugeriu o nome Meridional, ou Setentrional , por ser um nome que fazia parte da localização do Amapá. Nem um nem outro, decidimos colocar os Setentrionais sugerido por ele”, contou Lucivaldo.
Naquele tempo, as festas tinham hora para começar e para acabar pois o país vivia sob o jugo da ditadura militar. No dia do show a banda começou a tocar às 22 horas.
“No início não havia ninguém no salão, mas quando deu 23 horas o salão encheu”, lembra Lucivaldo.
Depois desse show a banda tomou outro formato. Novos músicos foram contratados, alguns componentes tiveram que viajar.
Músicos hoje consagrados começaram suas carreiras na Os setentrionais: Amadeu Cavalcante, Humberto Moreira, Carlitão (Banda Placa), Zé Miguel, Kzam Neri, Ronery, Osmar Júnior, dentre outros.
“Todos os artistas que fazem sucesso em Macapá hoje começaram comigo”, lembra o proprietário da banda.
Os Setentrionais gravaram dois discos compactos um em 1978 e outro em 1979. Os dois primeiros fizeram um grande sucesso. Cada disco teve 2 mil tiragens. Os Setentrionais foi a primeira banda do Amapá a gravar um disco profissional.
A banda já não toca mais. Lucivaldo diz que a culpa foi a chegada dos teclados que fazem o trabalho de 10 músicos. Nessa época, a banda estava no auge, e já havia ido tocar até no exterior.
Hoje, Lucivaldo continua sendo empresário e também é funcionário público. Guarda com carinho esse capítulo importante da cultura amapaense.
Ouça três canções no link abaixo