ANDRÉ SILVA
Desde que foi inaugurado em 2011, o Conjunto Habitacional Mucajá, localizado numa área nobre da zona sul de Macapá, não deixou de lado velhos problemas, como o tráfico de drogas, homicídios, arrastões e, há alguns meses, até prostituição infantil. Os moradores, dizem que o lugar está parecendo uma bomba relógio.
O conjunto que constantemente estampa as editorias policiais do Amapá, foi criado com o objetivo de abrigar famílias que moravam em uma área de risco no Bairro Santa Inês. A obra que fazia parte do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) tem 592 apartamentos distribuídos em 37 blocos, e abriga cerca de 2 mil pessoas.
Nos últimos anos, a distribuição de drogas cresceu assustadoramente no local. Segundo um morador que não quis se identificar por já ter sido ameaçado de morte, o conjunto virou o centro de distribuição de cocaína em pó na cidade. A maconha e o crack já eram encontrados com facilidade.
“Todo pó que circula na cidade sai daqui. É claro que os grandes traficantes não moram aqui. Eles vêm, deixam a droga para seus aviões e saem. Só voltam para buscar o dinheiro. Nunca imaginei que isso poderia estar acontecendo dentro da minha comunidade”, disse entristecido o morador.
Além dos traficantes maiores de idade e adolescentes, agora crianças de 10 e 11 anos estão sendo usadas como “aviõezinhos”.
“O que já era de se esperar. É só passar aqui altas horas da noite que você vai ver a quantidade de crianças brincando no meio da rua”, denunciou.
Prostituição infantil
Os traficantes, agora além de drogas, também têm aliciado meninas menores de idade para a prostituição. São adolescentes de 13 e 14 anos que em troca de sexo recebem dinheiro, drogas e respeito no meio de traficantes. Todas as noites é possível ver a grande movimentação de carros que entram e saem do local. Muitos em busca de drogas e das “meninas” que vendem o corpo.
“Já cansei de ver carros entrarem aqui para buscá-las, já cheguei a ver até van. É complicado ver isso acontecendo aqui dentro e não poder fazer nada”, comenta outro morador.
Para ele, o problema é estritamente social. Ele conta que a maioria dos pais destas meninas e das crianças não tem emprego, e com isso a impossibilidade de oferecer condições melhores a elas. Pesa também o estigma de morar no local.
“Algumas pessoas vão atrás de trabalho, e na hora da entrevista dizem que são daqui, logo são descartados”.
Ele, como a maioria dos moradores, se sente abandonado pelo poder público.
“É complicado criar um filho aqui dentro. Você ver de madrugada crianças, meninas novas andando por aí e sem ter uma fiscalização do Conselho Tutelar. Nenhum órgão de justiça vem aqui dentro fazer qualquer tipo de fiscalização, e os próprios pais são coniventes com isso”, revelou o morador.
O Conselho Tutelar da Zona Sul confirma que a prostituição infantil está acontecendo no conjunto e o uso de crianças para o tráfico também. O presidente do conselho, Márcio Barreto, explica que este ano a entidade realizou palestras na comunidade.
Ele disse que já chegou a falar com algumas meninas que dizem que entraram para a prostituição pela situação financeira complicada dos pais. De acordo com um mapeamento feito pelo conselho, cerca de 45 a 50 meninas estão nesta situação.
“Elas dizem que muitas vezes os próprios responsáveis as obrigam a fazer, mãe e pai”, denuncia o conselheiro.
Ele disse que em março vários órgãos do governo estarão no local para realizar várias ações voltadas à promoção de emprego e conscientização.
Crimes sem solução
Muitos homicídios vêm acontecendo na comunidade desde 2013, e a maioria sem explicação oficial. Em 2014, os cunhados, Bruno Oliveira Borges de 21 anos, e Bruno Gonçalves, de 15 anos, foram mortos a tiros enquanto dormiam.
Segundo testemunhas, dois homens desceram de um carro encapuzados e vestidos de preto. Eles se dirigiram até o apartamento das vítimas e dispararam várias vezes. A comunidade acredita que o crime pode ter sido acerto de contas.
Em fevereiro de 2016, uma mulher foi morta com vários tiros. Ela estava ao lado do companheiro que também foi atingido, mas não morreu. Em abril, uma jovem de 21 anos foi assassinada com 12 tiros, ambos os crimes não foram solucionados.
Apesar de todos os problemas, o Mucajá é composto, em sua maioria, por trabalhadores, estudantes e donas de casa que sonham com uma comunidade melhor.