Enviada especial a Calçoene, CÁSSIA LIMA
O pescador Enrique Oliveira dos Passos, de 28 anos, nunca imaginou que um dia acordaria e, ao descer da cama, pisaria na água. Mas é exatamente isso que tem ocorrido com ele, a esposa, os três filhos e quase 250 famílias de Calçoene nos últimos dias.
Segundo o pescador, as águas do rio já estavam elevadas na noite de quinta-feira, 10, mas ao acordar a surpresa foi maior ainda. Ele correu logo para o quarto dos filhos. Muitos objetos na casa simplesmente flutuavam.
“Coloquei o pé fora da cama e senti a água gelada. Acordei logo minha mulher e corri para pegar meus filhos. Estamos bem, mas perdemos geladeira e nosso fogão tá quase coberto pela água. Foi um desespero só”, relata Enrique Oliveira.
Ele e a família decidiram levantar os móveis de casa e ficar na residência mesmo pisando no chão molhado. Mas como a água voltou a subir, a esposa foi para casa de parentes com os filhos. Ele conta que não tem água potável e nem comida para os próximos dias.
“A gente estava comprando água, mas estamos sem dinheiro já. E não posso nem pescar porque a água tem muita lama e o peixe está escasso com a correnteza do rio. Estamos vivendo com a ajuda de parentes”, contou o pescador.
A vida do pescador foi de prejuízos no fim de semana, assim como a de 250 famílias atingidas pela enchente do Rio Calçoene. Quase 50 perderam eletrodomésticos e não querem sair de casa com receio de furtos. Ao todo 1.200 pessoas foram atingidas.
De acordo com a Defesa Civil, em Calçoene foram afetados os bairros do Centro, CEA, Comunicação, Liberdade, Parque dos Buritis, Palmeiras, Ramal do Souza e Beira-Rio. Mas também existem desalojados nos Distritos de Lourenço e Carnot e no Assentamento Irineu.
A Defesa Civil divulgou que o nível da água chegou a subir um metro durante a madrugada de quinta para sexta-feira. Entretanto, neste domingo, 12, as águas do Rio Calçoene começaram a baixar e estão 50 centímetros acima do nível normal.
Equipes coordenadas pela Defesa Civil receberam o reforço do Exército e da Secretaria de Inclusão e Mobilização Social (Sims) para fazer um levantamento das necessidades das famílias.
“Essa é a pior situação que tivemos que atender em anos porque queremos ajudar, temos estrutura, mas somos limitados pela legislação eleitoral. Existem famílias que não podem ficar nas casas submersas, mas elas insistem em ficar”, explicou o tenente Helton Souza, da Defesa Civil.
O levantamento deste domingo identificou 21 famílias que deixaram suas casas alagadas e foram para residências de parentes. Mas muitos insistem em ficar e andam pela água com lama e infectada por fossas sépticas.
“A gente está na casa de parentes e eu só estou reparando a casa pela noite. Perdemos uma geladeira e um freezer. Agora vamos esperar a água baixar”, comentou a moradora do Bairro Beira-rio, Maria da Silva, de 49 anos.
Em uma volta rápida pelos bairros Beira-Rio e Parque dos Buritis, que foram os mais atingidos, é possível ver adultos e crianças andado pela água e até tomando banho. Muitas ruas ainda estão alagadas. O Mercado Central do município está rodeado por água e muitos cachorros estão ilhados em canoas ou assoalhos que ainda não foram atingidos.
Na casa do comerciante Antônio Silva Correia, de 59 anos, por pouco a mercadoria não foi perdida. Mas a geladeira, o freezer e fogão não escaparam. A família ainda está dormindo na casa e os móveis estão suspensos.
“Hoje minha mulher vai pra casa da mãe dela por causa dos meninos, mas ontem dormimos assim mesmo. Eu tenho que ficar em casa porque tenho medo que furtem as mercadorias do comércio. Nossa principal dificuldade é agua”, ressaltou o comerciante.
A secretária adjunta de Inclusão e Mobilização Social (SIMS), Luzia Grunho, já organizou com a equipe um formulário de levantamento que deve ser colocado em prática depois da eleição. Mas a situação de algumas pessoas preocupa.
“O trabalho aqui é de assistência mesmo, é um trabalho delicado que exige muito de todos. Nós vamos fazer o cadastro das famílias junto com a Defesa Civil e dar água e cesta básica para os mais necessitados. Tem famílias que ficam com as crianças andando pela água e isso nos preocupa”, destacou a secretária.