DA REDAÇÃO
Um estudo realizado por um grupo internacional com participação de 53 cientistas brasileiros demonstrou que antes da chegada dos europeus os povos indígenas tiveram um papel importante na distribuição de árvores encontradas atualmente nas florestas da Amazônia. A descoberta acaba com a tese de que antes da colonização as florestas eram intocadas pelo homem.
O estudo tem a participação de dois pesquisadores do Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá (Iepa), Marcelo Carim e Renan Guimarães, e foi publicado no último dia 3 de março na Revista Science.
A equipe foi liderada por Carolina Levis, doutoranda pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e pela Wageningen University and Research Center, da Holanda.
“Por muitos anos, os estudos ecológicos ignoraram a influência dos povos pré-colombianos nas florestais atuais. Um quarto das espécies de árvores domesticadas por esses povos são amplamente distribuídas na região e dominam grandes extensões de florestas. Estes resultados indicam que a flora amazônica é em parte uma herança viva de seus antigos habitantes”, avalia Carolina Levis.
A equipe de cientistas analisou dados de mais de 1 mil inventários florestais comparando com a localização de mais de 3 mil sítios arqueológicos. Ao comparar as espécies e as distâncias desses sítios arqueológicos, que são restos de ocupação humana, foi possível perceber a influência dos povos na biodiversidade atual.
O estudo se concentrou em 85 espécies de árvores usadas pelos povos antigos da Amazônia para alimentação, abrigo ou outros usos nos últimos milhares de anos.
A maior variedade e quantidade dessas espécies foi encontrada perto de sítios arqueológicos. Entre as espécies, estão tipos comercializados mundialmente, como o cacau, castanha-do-Brasil e açaí.
“Nossa concepção sempre se baseou no entendimento absoluto da investigação científica para constatação desse fato. Este trabalho, além de mostrar objetivamente o que demonstramos quanto à dominância de espécies florestais na Amazônia, estabelece estreita relação com a capacidade de nossos antepassados em identificar espécies potenciais para sua sobrevivência. Muito ainda há de se desvendar, estamos seguindo sobre uma plataforma de dados da nossa floresta que cresce a cada dia, dirigindo nossas hipóteses a partir de levantamentos exaustivos e fidedignos da nossa vegetação”, diz o botânico Marcelo Carim, do Iepa.
Embora o número de espécies domesticadas tenha revelado um forte efeito das ocupações humanas nas florestas atuais, os autores sugerem que esse efeito possa ser ainda maior.
Desvendar a complexa interação de fatores históricos e ambientais que estruturam a flora amazônica é uma questão urgente, já que essas heranças deixadas pelos povos pré-colombianos, sítios arqueológicos e florestas, estão em risco devido ao desmatamento, degradação, construção de estradas, mineração e outras ameaças.
“Esse estudo mostra a importante contribuição que os povos pré-colombianos tiveram na formação da biodiversidade da Floresta Amazônica, através da domesticação de espécies” relata Renan Guimarães, do Iepa.
Link do artigo http://science.sciencemag.org/content/355/6328/925