DA REDAÇÃO
Os áudios interceptados na “Operação Garimpeiros da Propina” foram liberados pela Justiça Federal. Eles foram divulgados pelo Ministério Público Federal (MPF) na manhã desta terça-feira (27).
Nos diálogos, os interlocutores falam sobre propina no valor de R$ 100 mil supostamente cobrada pelo ex-deputado federal Badú Picanço. A quantia seria condição para efetivar autorização de empreendimento no garimpo do Lourenço. O ex-parlamentar, que está preso, é apontado como um dos líderes da organização criminosa.
Segundo o MPF, o áudio tem duração de 13 minutos. Nele, Evandro dos Santos Oliveira, diretor financeiro da Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros do Lourenço (Coogal), conversa com Sebastião Chagas Carneiro, o “Bastião”, diretor de patrimônio da cooperativa.
Os diretores acabam revelando na conversa como funcionava o esquema, e deixam entender que a relação com Romero Peixoto, ex-diretor do extinto Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), atual Agência Nacional de Mineração (ANM), era bem melhor.
Veja a transcrição e ouça o áudio divulgado pelo MPF
Bastião: … e o Tinho, macho?
Evandro: rapaz, tá em Macapá … eu vou lá com ele agora … vou só levar os negócios pro contador lá … vou dar um pulo com ele lá … ele ia se reunir com o promotor … ia pro DNPM … bicho, o negócio tá feio aqui oh, bicho! … deixa eu chegar aí …
Bastião: (INAUDÍVEL)
Evandro: deixa eu chegar aí …
Bastião: (INAUDÍVEL) … disse que Romero era enjoado … Romero não era enjoado …
Evandro: meu amigo … Romero era um santo … Romero era um Deus …
Bastião: com certeza … as vezes a gente pensa que as coisas eram ruim e depois as coisas é bem diferente …
Evandro: meu amigo … mercenário … mercenário mesmo é o Badu (ex-deputado federal, preso)…
Bastião: é …
Evandro: Romero era um santo, meu amigo …
Bastião: tu é doido, cara …
Evandro: tô te falando … se tu soubesse o que esse cara aprontou pra nós ontem, meu amigo .. . se eu tivesse um revolver, eu tinha matado ele …
Bastião: (risada)
Evandro: tô te falando …
Bastião: e Maranhão?
Evandro: Maranhão junto … resolvendo junto, meu amigo … o Maranhão com toda aquela manha dele … o cara colocou nós no bolso …
Bastião: e o Zé Mapa?
Evandro: o Zé Mapa também ajudando …
Bastião: não apita nada, né?! …
Evandro: … tentando ajudar, mas … o que é que adianta galinha brigando com raposa?!
Bastião: é … não funciona …
Evandro: galinha brigando com raposa ontem …
Bastião: … por isso que o nosso país tá do jeito que tá, Evandro … viu?!
Evandro: … é por isso que o brasil tá quebrado, bastião … tá morto!
Bastião: hein?
Evandro: é por isso que o brasil tá morto … por causa de gente desse jeito …
Bastião: é … o Brasil tá morto … é por causa desse tipo de gente … enquanto a população nossa … a população … os políticos … e a nossa população que trabalha no governo tiver essa mentalidade, o Brasil nunca vai pra frente! … toda vida vai ficar nessa situação aí … e cada um só vai defender o que é seu …
Evandro: bastião, parece assim que é uma lei … parece assim que é uma lei que tu tem
que pagar propina … parece até brincadeira!
Bastião: é … tu é doido!
Evandro: parece assim que é imposto …
Bastião: Deus castiga! … o cara que é propineiro, Evandro … Deus castiga! … nós se livra dos caras daqui, mas só que de Deus, tu não se livra não!
Evandro: o cara pedindo 100 mil e num baixava nem um real … não, é 100 mil porque vocês tão montado no dinheiro … parece que o cara pensa que nós somos ricos …
Bastião: só se for a mãe dele que tá montada no dinheiro …
Evandro: o cara pensa que nós tamo rico aí com esse contrato com essa empresa …pensa que nós tamo rico …
A captação da conversa foi feita seis dias antes da deflagração da Operação Minamata, no dia 24 de novembro e cerca de duas semanas após a saída de Romero Peixoto da direção da ANM. Thiago da Justa Ribeiro havia sido recentemente empossado no cargo de diretor da agência. A indicação dele teve a participação direta de Antônio da Justa Feijão, seu tio, também tido como um dos chefes da organização.
Outro alvo da Operação Minamata, o ex-promotor Moisés Rivaldo, é também citado nos áudios. Ele é tratado como sendo um dos investidores do garimpo, a quem os interlocutores chamam de “mão de vaca”.
Evandro diz o seguinte sobre o ex-promotor: “mas ele [Moisés Rivaldo] vai arrumar dinheiro pra pagar lá pros caras lá… que tem que pagar, se não pagar, não sai nada”.
E Sebastião concorda: “é, se não pagar, não tem a liberação não”.
A liberação que se referem é da Mina Salamangone, que recebeu investimento de Moisés Rivaldo, e estava interditada pela ANM desde 2008, entre outros motivos, devido a mortes de garimpeiros por soterramento.
Os dois diretores da Coogal e Romero Peixoto foram presos preventivamente no dia 15 de fevereiro, a pedido do MPF. Os três já estão em liberdade. Permanecem no Instituto de Administração Penitenciária (Iapen) os ex-deputados federais Antônio da Justa Feijão e Badu Picanço; João Batista de Azevedo Picanço, irmão de Badu Picanço; e Thiago da Justa Ribeiro. Todos tiveram o pedido de liberdade negados. José Guimarães Cavalcante foi libertado ontem.
O promotor aposentado Moisés Rivaldo, que ficou três meses preso preventivamente, teve a prisão revogada há duas semanas, e está impedido de se ausentar do Amapá sem autorização judicial.