Por RICARDO FALCÃO, vice-presidente Mundial da Praticagem
Após várias décadas em utilização, muitos números estão disponíveis sobre a região portuária de Santana. Com estes dados, podemos analisar como a operação logística e comercial se desenrolou até agora. O problema, na verdade, é responder corretamente quais são os limites máximos de operação possíveis de serem alcançados no futuro.
Em 2011, em parceria com o Dr. Edson Mesquita dos Santos, Dsc em hidrodinâmica, realizamos a “Análise Técnica das Manobras com Rebocadores no Porto de Santana/AP” e conseguimos, a partir daí, ter uma conversa bem construtiva à respeito de nosso canal de acesso.
O estudo foi protocolado na Capitania dos Portos do Amapá, que o acolheu e chamou toda a nossa comunidade marítima e portuária para longas reuniões que se sucederam por meses. De lá para cá, outros estudos foram feitos por operadores portuários sem, contudo, serem capazes de responder sobre a capacidade máxima do porto, apenas concluindo como a atual operação poderia ocorrer de forma segura.
A operação segura do porto precisa ocorrer com dois rebocadores azimutais que, resumidamente, são embarcações modernas com dois propulsores e capazes de girar sobre o próprio eixo. Com os tipos de rebocadores que usávamos no passado nem era seguro e nem efetivo.
A corrente que passa pelo canal possui uma velocidade muito alta para a manobra de navios, cujas características abordei em artigo anterior, de cerca de 5 nós (9,2 Km/h) no máximo e quase nunca abaixo de 1 nó (1,852 Km/h). Isso é devido ao desenho natural do canal que existe entre a Ilha de Santana e a cidade, que faz com que a corrente seja cerca de uma vez e meia a do Rio Amazonas.
A consequência é que existem horários em que os terminais podem operar com segurança e horários em que o risco é inaceitável para a segurança da navegação, para o meio ambiente, assim como para o navio e instalações portuárias. Estes horários são chamados de “janelas de operação”.
Até um certo limite, com rebocadores melhores, mais potentes ou em maior número, a janela de operação consegue ser bem ampliada e a margem de segurança aumenta bastante. Como na situação atual há muito poucos navios para dividir a conta, o problema é o custo ficar muito alto.
Para as operações que hoje ocorrem na CDSA, e que envolvem navios petroleiros, é deslocado um rebocador azimutal de Santarém, que custa um milhão de reais para fazer uma atracação e uma desatracação.
Apesar do número ser alto, ele é pequeno quando lembramos que o acidente do petroleiro EXXON VALDEZ, no Alaska, em 1989, custou quatro bilhões de dólares apenas com custo de limpeza, fora indenizações. Nenhum de nós quer que ocorra em águas tucujus um acidente como a tragédia de Mariana/MG, que é quase que impagável e irrecuperável.
Nos meses que se seguiram à apresentação do estudo de 2011, conseguimos chegar à um consenso entre todos os profissionais que à época operavam aqui e a Anglo patrocinou a chegada de dois rebocadores apropriados que seriam utilizados também pela Petrobrás (fui a uma reunião na sua sede, localizada na Avenida Chile, no Rio de Janeiro, só para isso) .
Em 2008, a média era de 1 a 2 navios por mês. Até 2010, média de 6 a 7 navios por mês. A partir de 2011, com os novos rebocadores, passamos a operar de 13 a 22 navios por mês, apesar da queda do terminal da Anglo, ocorrido em 28 de março de 2014 .
Esta quantidade de navios justifica a presença fixa de dois rebocadores e o custo por manobra cai, drasticamente, para a faixa de cem mil dólares, aproximadamente, à época.
Mas a queda do porto não fez apenas o número mensal de navios diminuir. Como consequência, hoje não há qualquer medição confiável de profundidades, as batimetrias como chamamos, naquele ponto do canal. E precisamos de batimetrias ao redor de toda a Ilha de Santana e da Ilha do Oiapoque (quase em frente ao Rio Mazagão), para podermos planejar o futuro de Santana.
Em Santana, passando pelo seu canal de acesso, e de acordo com a carta náutica com batimetrias antigas, não possuímos quase nenhuma limitação de quanto o navio pode carregar (calado), de comprimento máximo nem de sua boca (largura). O que limita o tamanho de um navio por lá é o espaço para girá-lo nas duas bacias de evolução disponíveis.
Só que jamais consideramos sobre o navio contornar a Ilha de Santana, e entrar já no sentido correto para a saída, sem precisar girar. E o motivo é que, para que este aspecto pudesse ser considerado no estudo, precisaríamos de ter as batimetrias atualizadas daquela região que fica logo depois da foz do Rio Matapi, e se estende até a Ilha Salvador, cobrindo todo o entorno da Ilha do Oiapoque.
Apesar de não podermos afirmar nada sem o levantamento batimétrico, algumas considerações são possíveis, caso venhamos a confirmar as antigas profundidades de 8 metros na baixa-mar neste canal e que na região próxima ao porto da Anglo não tenha tido alterações significativas:
- Poderíamos operar navios na faixa próxima a 300 metros de comprimento, permitindo classes neo-panamax (tamanho que trafega no novo Canal do Panamá), desde que construídos terminais apropriados.
- Dificilmente teríamos um porto em Mazagão Velho como já se aventou recentemente porque os calados permitidos não seriam viáveis. Contudo, a aventada região industrial naquela área seria importantíssima para se considerar um terminal de contêineres, ou até mesmo como região de apoio à operação de apoio off-shore para a exploração de petróleo na costa do Amapá, dentre outras utilizações viáveis para a operação de cargas que são transportadas por navios graneleiros.
- A região entre a foz do Rio Vila Nova e a foz do Rio Matapi tem potencial para se construir um terminal extenso, com retroárea ainda liberada de ocupação, caso se confirmem as grandes profundidades próximas à costa..
Há muito debate a ser travado para podermos discutir o futuro portuário do Amapá via Santana e vou apresentar muitas possibilidades nos próximos artigos.