Sobre marabaixo, beleza e intolerância nas redes

Os "tribunais virtuais" estão formados, e são constituídos por “especialistas”.
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POR GESIEL OLIVEIRA

De uma hora pra outra apareceu um monte de intelectuais virtuais. Gente que conhece muito de história, geografia, cultura, música, dança e arte do Amapá (MODE IRONIA HARD ON). Gente que ridiculariza, escarnece e achincalhar sem dó, sem vislumbrar as consequências na vida de uma pessoa tão jovem.

Os “tribunais virtuais” estão formados, e são constituídos por “especialistas”, gente “estudada”, gente que “sabe tudo” sobre marabaixo, batuque, sobre a origem do nosso povo, relevo, vegetação, lutas, música e arte. Gente que vai comemorar o feriado do próximo dia 15/05 e nem sabe quem foi Cabralzinho, ou se ele realmente merece o título de herói aqui no Amapá, gente que nem sabe o que aconteceu no dia 15/05/1895, nem muito menos sabe o que foi a República do Cunanis, e quem foram os Tucujus e Cunanis.

Não sabem quem são os Palikurs, Galibis, Karipunas, nem de onde vieram e onde habitam, mas são capazes de chamar a menina Miss Amapá de “burra” e afirmam que a menina não conhece a história do nosso Estado. Será que conhecemos tanto assim a história da nossa terra a ponto de pedirmos para esse menina estudar mais sobre o Amapá? 

Festejos de marabaixo Fotos: Márcia do Carmo

São “juízes virtuais” que fazem montagens e memes, determinam a “sentença”, e espalham o seu nefasto e vituperioso “veredicto” nas redes, e na velocidade dos compartilhamentos, vidas são destruídas e sonhos são destroçados, lágrimas são derramadas e traumas são eternizados. Tá sobrando hipocrisia e faltando empatia.

Tá transbordando apedeutas virtuais e faltando gente resiliente que reconheça que essa menina tem potencial de sobra e não será um deslize de poucos segundos que levará a sua carreira à derrocada.

O que fica na rede, de lá não sai nunca mais. Interessante observar que a entrevista, que foi muito boa e mostra que ela conhece muito de outras áreas, durou mais de 11 minutos, mas por um lapso de apenas 10 segundos, seus conterrâneos não a perdoaram.

A massa virtual adora essas coisas, ri demais, e sem mesmo conhecer a história de luta e superação de uma menina tão nova, a chama de “burra”, “alienada” e a enxovalha sem piedade, por conta de um deslize, de um comentário, e isso tudo sem nenhum tipo de remorso.

Até mesmo gente adulta e velha, que tem filhos na mesma idade, aproveita o embalo e não se contém na hora de espalhar, e logo prepara a sua pedrada, que hoje vem em forma de comentários insanos, sem mesmo se dar conta de que isso poderá estar acontecendo amanhã com um filho seu, com um amigo, com alguém conhecido.

Não há pelo menos uma gota de empatia no reservatório de maldade desses seres virtuais insanos? Mas o que vale mesmo é a risada né? a gargalhada, mesmo que para isso seja necessário destruir a carreira e a vida de uma menina que falava do nosso Estado com tanto orgulho e com brilho nos olhinhos, antes vívidos e cheios de vida, que agora só vertem lágrimas.

As redes sociais promoveram um bullying virtual avassalador, taxando dos piores adjetivos a jovem que só queria representar o Amapá. De tão triste que ela ficou, que resolveu devolver o título de Miss Amapá para esse povo tão “educado”, “ordeiro” e “compreensivo”(ON) , mormente os que patrulham as redes sociais com  comentários eivados de terríveis erros ortográficos, de concordância e sintaxe, mas que se acham acima da “estratosfera cognitiva mediana”, tudo a ponto de crucificá-la por um mero erro, uma falha tão comum na vida da maioria dos nossos jovens de hoje.

Uns segundos de comentários da menina, que lhe custaram tão caro nas mãos de um povo que se acha tão “inteligente”. Infelizmente uma jovem sonhadora de apenas 20 anos não está a altura de tanta “intelectualidade e sapiência” (ON), e não suportou tanta pressão.

Resta-nos agora ficar com a risada, com o sarcasmo da casta cognitiva superior (ON). Mas é isso aí, vamos rir gente abjeta e “intelectualizada”, que prossiga a exéquias virtual de outros tantos; como é bom fazer isso e sentir-se acima de alguém que errou publicamente (ON), e como dizem os mais conectados patrulheiros virtuais: “The zuera never ends”, e realmente não tem fim, a não ser para quem está do outro lado.

Seles Nafes
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