Por GESIEL OLIVEIRA
A política do “pão e circo” (panem et circenses, no original em latim) como ficou conhecida, era o modo com o qual os líderes romanos lidavam com a população em geral, para mantê-la fiel à ordem estabelecida e conquistar o seu apoio.
Esta frase tem origem na Sátira X do humorista e poeta romano Juvenal (vivo por volta do ano 100 d.C.). No seu contexto original, ele criticava a falta de informação do povo romano, que não tinha qualquer interesse em assuntos políticos, e só se preocupava com o alimento e a diversão.
Com a sua gradual expansão, o Império Romano tornou-se um estado rico, cosmopolita, e sua capital, Roma, tornou-se o centro de praticamente todos os acontecimentos sociais, políticos e culturais na época de seu auge.
Isso fez, naturalmente, com que a cidade se expandisse, com gente vindo das mais diferentes regiões em busca de uma vida melhor. Como acontece até hoje em qualquer parte do mundo, pessoas humildes e de poucas condições financeiras iam se acotovelando nas periferias de Roma, em habitações com conforto mínimo, espaço reduzido, de pouco ou nenhum saneamento básico, e que eram exploradas em empregos de muito trabalho braçal e pouco retorno financeiro.
Esses ingredientes, em qualquer sociedade, são perfeitos para detonar revoltas sociais de grandes dimensões. Para evitar isso, os imperadores optaram por uma solução paliativa, que envolvia a distribuição de cereais, e a promoção de vários eventos para entreter e distrair o povo dos problemas mais sérios na fundação da sociedade romana. Isso ajudava a desviar a atenção do povo para os reais problemas.
Assim, nos tempos de crise, em especial no tempo do Império, as autoridades acalmavam o povo com a construção de enormes arenas, nas quais realizavam-se sangrentos espetáculos envolvendo gladiadores, animais ferozes, corridas de bigas, quadrigas, acrobacias, bandas, espetáculos com palhaços, artistas de teatro e corridas de cavalo.
Outro costume dos imperadores era a distribuição de cereais mensalmente no Pórtico de Minucius. Basicamente, estes “presentes” ao povo romano garantiam que a plebe não morresse de fome e tampouco de aborrecimento. A vantagem de tal prática era que, ao mesmo tempo em que a população ficava contente e apaziguada, a popularidade do imperador entre os mais humildes ficava consolidada.
No Brasil, não é diferente. Enquanto os hospitais e escolas estão sucateados, presenciamos um inconcebível desperdício de dinheiro na construção de estádios supervalorizados, que, no final das contas, só acomodou uma minoria endinheirada, que nunca enfrentou nenhuma dificuldade em pagar alguns mil reais por um mísero ingresso.
Já dizia a letra de uma conhecida música: “Carnaval, futebol! Não mata, não engorda e não faz mal”. Será que não? Mata sim! Mata milhares de pessoas indiretamente nos hospitais sucateados quando o governo desviou bilhões de dólares para a construção estádios de futebol (verdadeiros elefantes brancos), como a Arena da Amazônia (AM), que hoje está sem utilidade alguma, enferrujando e se acabando.
Mata quando milhares de crianças estão morrendo por falta de atendimento na rede pública de saúde. Mata quando o orçamento para propaganda oficial para escamotear uma administração ineficiente é maior que o orçamento da segurança pública, que sucateada, agoniza. Mata quando nossas crianças ficam sem merenda escolar o dia inteiro.
Isso nos ajuda a entender porque não vemos mais aquela empolgação de antes, quando as ruas eram pintadas e enfeitadas e tudo ficava verde e amarelo. Não que em outras épocas não existisse crises. Elas sempre foram recorrentes, mas hoje vivemos o ápice do descaso, aliado à maior operação contra corrupção do mundo, que é a Lava Jato, que vem se delindo dia após dia, num verdadeiro processo de “solapamento” de seus alicerces.
É o sistema, o “mecanismo” como definiu o cineasta José Padilha, se remontando, se realocando movido pelo xadrez das velhas raposas e asfixiando a operação paulatinamente.
Mas quer saber por que o Brasil não quebrou de vez diante de toda essa corrupção como aconteceu com Grécia que não conseguiu se reerguer até hoje? Porque o brasileiro é muito trabalhador e tem segurado o Brasil de pé, na esperança de que dias melhores virão.
Não me levem a mal, mas não há razão pra despertar o patriotismo levado por camisas que valem bilhões de dólares. Enquanto o povo não acordar, continuaremos ouvindo e “dançando” a música: “Carnaval, futebol! Não mata, não engorda e não faz mal”.