JÚLIO MIRAGAIA
Tinha acabado de assistir ao lançamento da Netflix, “Extinção”, uma ficção científica, quando fui checar o Twitter. Entre os assuntos mais comentados, estava lá, no topo: Neymar.
Logo, assisti ao vídeo em que nosso camisa 10 nas últimas duas copas do mundo, através de uma peça publicitária de um de seus patrocinadores, pede desculpas por ter deixado de apresentar bom futebol no mundial da Rússia e por ter exagerado nas quedas e nas encenações em campo.
Voltando a falar sobre o filme, Extinção trata de uma aparente invasão extraterrestre à Terra, que na verdade é uma guerra entre humanos “naturais” e “sintéticos”, forma vulgar como são chamados os seres de inteligência artificial. A trama mostra um mundo em que uma civilização inteira de sintéticos é formada.
Chegando à comparativa com o comercial-discurso do craque brasileiro, a impressão que tive ao assisti-lo é que Extinção não havia acabado. Nesse futuro distópico (o nosso presente), a espontaneidade e naturalidade da vida real foram substituídas por grandes simulações.
Neste tempo presente, que aparenta ter saído das páginas de um 1984, de George Orwell, a propaganda é a alma do negócio muito além do que podemos conceber. O perdão deve ser calculado palavra por palavra e não pode ser espontâneo ou desajeitado. A vida parece estranhamente uma ordem em forma de espetáculo.
Infelizmente, o que fez Neymar num oferecimento da Gillette é um padrão de comportamento tão nosso quanto dele. O perdão em busca do like, da visibilidade e da aceitação é diretamente proporcional com as relações superficiais que construímos também em busca dos mesmos likes, visibilidade e aceitação.
A foto com o cachorro, com os parentes que quase não vemos, a aparente felicidade ou bem estar econômico e emocional, tudo tão semelhante a todas as outras simulações da vida que de tão aparentes acabam virando esse lado da vida o que nos importa e a vida que mais nos interessa.
Essa “vida real” é uma grande festa comunicacional, que conduz cada passo dado em direção a um espetáculo que se forma a cada tweet e que torna essa sociedade cada vez mais decadente moralmente. Nela, o perdão pode ser “sintético”.