Por SELES NAFES
A denúncia que o Ministério Público do Amapá encaminhou à justiça contra o ex-presidente da Assembleia Legislativa, Júnior Favacho (DEM), e mais seis pessoas, é um extrato detalhado de como o dinheiro público é tratado no parlamento amapaense, envolvido em tantos escândalos de corrupção nas últimas duas décadas.
O MP afirma que dinheiro da Assembleia financiou a instalação de uma empresa de construção civil de Júnior Favacho, especializada em concretagem. Segundo a investigação, não houve nem a preocupação em mascarar o esquema usando processo de licitação e contrato.
Favacho e o grupo, que inclui o ex-deputado Charles Marques, três empresários, uma ex-gestora da Alap e um agiota, teriam colaborado para desviar mais de R$ 2 milhões, em valores atualizados. Eles foram denunciados por peculato, associação criminosa, lavagem de dinheiro e uso de documento falso.
A assessoria de imprensa do deputado Júnior Favacho informou que “ele ainda não foi notificado sobre o teor das investigações e que, assim que tiver acesso ao processo, irá formalizar sua defesa e prestar os esclarecimentos”.
Pagamentos
Em um mês, entre 3 de maio e 5 de junho de 2013, narra a denúncia, a Assembleia Legislativa emitiu oito cheques totalizando R$ 865 mil, o que em valores atualizados corresponde hoje a R$ 2.052.852,84.
Os cheques, assinados pelo então presidente Júnior Favacho, foram emitidos para a empresa A. Costa Pereira, de propriedade de Emerson Aparecido Costa Pereira. Também assinaram os cheques o então 1º secretário da Assembleia, ex-deputado Charles Marques (PSDC), e a secretária de Finanças, Daniele Siqueira.
Segundo as investigações do Ministério Público do Estado, nenhum serviço foi prestado ou qualquer mercadoria foi vendida pela empresa à Alap, que justificasse esses pagamentos.
“(…) Tão somente mais um caso criminoso de subtração ilícita de dinheiro dos cofres públicos”, define trecho da denúncia assinada pelo promotor de justiça Afonso Guimarães.
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Ex-deputado Charles Marques (PSDC) era o primeiro-secretário da Alap, e assinou os cheques. Fotos: Arquivo/SN
Em depoimento, o empresário Emerson Pereira alegou que conheceu o deputado em Júnior Favacho em 2010, quando as empresas de ambos prestavam serviços na BR-156. Em 2013, quando assumiu a presidência da Casa substituindo Moisés Souza (afastado pela Justiça), o deputado teria convidado o empresário a implantar um sistema informatizado na Assembleia. Um pagamento mensal de R$ 30 mil teria sido combinado entre ambos.
O MP afirma que o deputado não quis implantar sistema informatizado na Assembleia. Se quisesse, frisou na denúncia, teria utilizado os profissionais de informática da própria Alap para o serviço, sem precisar contratar para tal um engenheiro civil.
Ainda em depoimento, o empresário alegou que chegou a fazer os estudos para a implantação do sistema, mas a Assembleia não contratou uma empresa desenvolvedora de software. Pereira ainda admitiu que, além dos R$ 30 mil mensais, recebeu outros cheques totalizando mais de R$ 200 mil.
A verdadeira intenção de Júnior Favacho, afirma o MP, era que o empresário o ajudasse na instalação de sua empresa especializada em concretagem, a Amapamix, situada na zona oeste de Macapá. A firma está em nome da esposa do deputado.
Sem contrato
Todas as tratativas e pagamentos foram feitos sem licitação e contrato, o que teria demonstrando a confiança dos gestores na impunidade, avaliou o MP.
Em alguns momentos, dois empresários emprestaram suas bancárias para que valores fossem depositados pela Alap. Um agiota identificado como Frank Roberto Góes da Silva teria atuado para lavar o dinheiro.
Ao final da denúncia, o promotor Afonso Guimarães e a procuradora-geral de Justiça, Ivana Cei, pedem a condenação dos sete investigados, devolução do dinheiro e solicitam a oitiva dos empresários João Paulo Monteiro, Emerson Pereira (o engenheiro civil) e Fabrício de Souza. Os três assinaram termo de delação premiada.