Por MARCO ANTÔNIO P. COSTA
O Portal SelesNafes.com conversou com Washington Luiz de Oliveira Brandão, psicólogo que atua no Ambulatório de Atenção à Crise Suicida (Ambacs), que é um projeto de extensão e pesquisa da Universidade Federal do Amapá (Unifap), em Macapá, onde ele é professor.
Para as pessoas que estão com ideia de tentar o suicídio, qual a primeira coisa a falar para elas?
Washington: A gente observa na nossa intervenção clínica com pessoas que tentaram o suicídio e tem ideação suicida, que a grande lacuna é a busca de ajuda. Pessoas que cometem o suicídio tem um histórico importante de falta de acesso a um cuidado. A ideação suicida envolve um desejo de tirar a própria vida. Esse desejo pode ser muito planejado ou com pouco planejamento. Quanto mais planejamento de dia, hora, local e instrumento a ser utilizado o risco é maior. Em ambos os casos há risco e o importante, o mais importante mesmo, é buscar ajuda. No plantão psicológico no Hospital de Emergências do Estado do Amapá existe esse serviço 24h; quando as faculdades de psicologia estão funcionando, este serviço também existe e é gratuito; no Ijoma, o Ambacs instituiu uma parceria no projeto “Acolher”, que também compõe a micro rede de assistência à crise suicida onde a pessoa pode buscar ajuda.
Agora, é óbvio que existem algumas questões aí. Há de convir que alguém em crise, alguém em sofrimento, em melancolia, pode não ter muita energia para se deslocar. Então ela pode ligar para o número 188 para o CVV ou dialogar com alguém de confiança próximo para que essa pessoa possa mediar esse acesso à ajuda. A ideia é que a pessoa aceite essa fragilidade emocional, aceite esse sofrimento como algo que não é esperado, não é saudável, e procure ajuda com alguém próximo ou no 188.
Como lidar com as dificuldades, com as derrotas?
Washington: Nessa perspectiva, o sofrimento faz parte do processo de vida. Todos nós passamos por situações em que há o sentimento de frustração, isso vai acontecer com todos nós. A frustração faz até parte desse movimento de reabilitação que a gente chama de resiliência. Temos que encarar esses processos como normais, mas não é saudável permanecer muito tempo em uma atmosfera de desamparo, por exemplo. Tem que compreender que existe algo que é esperado que aconteça após a perda de alguém, o luto, mas a permanência nesse estado por muito tempo e a experiência de deixar de fazer coisas por conta desse luto, já não é saudável.
Quando nós percebemos que há alguém próximo com indícios de depressão ou ideação suicida, como operar para não ser invasivo e, ao mesmo tempo, não ser negligente. Qual o protocolo?
Washington: O protocolo sugere que você, como pai ou mãe que tem uma relação saudável com seu filho, que tem uma interação adequada, seja capaz de perguntar: “você tem pensado em se matar?” Tem que abrir o jogo. Isso vai quebrar aquele mito de que falar sobre suicídio, aumenta os riscos de suicídio. Mas não é só perguntar, é perguntar e em caso afirmativo ajudar a pessoa a procurar ajuda profissional. Também deve-se evitar falar coisas como “isso vai passar”, “Tem pessoas em situações piores que a sua”, desqualificar a dor. Tem que perguntar e se colocar junto de forma empática, para juntos procurarem ajuda. Tá em jogo aí, também, a qualidade da relação dessas duas pessoas.
No geral, em se tratando de adolescentes, parte do problema pode estar nessa relação com os pais. No caso de ser um amigo ou amiga, como proceder?
Washington: Não existe uma receita, um manual, somos seres humanos com sensibilidades e reações diferentes. A ideia é investigar a possibilidade de ideação suicida e juntos buscarmos meios para colocar essa pessoa em acompanhamento psicológico. Eu parto do princípio que a intervenção nessa esfera deve ser sistemática e contínua, não é qualquer palestra que eu vá assistir que eu vou melhorar. Eu posso até diminuir uma tensão, compreender os motivos pelos quais eu estou passando por aquele situação, mas se eu não trabalhar cotidianamente, eu não vou me reabilitar. Então pressupondo uma relação de amizade, subtende-se uma fala mais íntima, é perguntar: “você está pensando em se matar?”, “como você está pensando em fazer isso?”. Se a pessoa tem um plano, fortalece aí uma intervenção mais rápida.
O amigo ou a amiga é fundamental, mas em algum momento pode ficar sem recursos para ajudar. Por isso, o que o amigo realmente deve fazer é levar a pessoa a procurar ajuda profissional.
O que o senhor deixa de mensagem para os jovens ou para qualquer pessoa que vá ler essa entrevista e esteja enfrentando dificuldades, melancolia ou até quem sabe com ideação suicida, o que falaria para essa pessoa?
Washington: É importante você buscar se conhecer e avaliar de forma clara e honesta, consigo mesmo, aquilo do seu jeito de ser que promove saúde e o que promove adoecimento. Uma coisa é o nosso funcionamento, os nossos comportamentos são bons pra nós porque garantem nossa sobrevivência. Mas nem tudo que é bom é saudável, do ponto de vista social, do ponto de vista psicológico. A pessoa pode, por exemplo, mentir muito, e esse comportamento de mentir parece ser bom pra ela, porque garante a adaptação dela, mas uma hora essa “engrenagem” vai falhar. Então a ideia é buscar se conhecer e se avaliar sincera e honestamente, buscando recursos de assistência psicológica, buscando manejar, mudar, se auto controlar.
Foto de capa: The Guardian Nigeria