Por SELES NAFES
A situação jurídica da ex-prefeita de Laranjal do Jari, Euricélia Cardoso (PP), é muito mais do que complicada. Condenada à prisão em pleno exercício do mandato de deputada federal por desvio de recursos, ela coleciona uma série de processos judiciais, além de ter chegado a ser presa numa operação da Polícia Federal, em 2013. Agora, ela acaba de virar ré em mais uma ação penal, e talvez a mais grave de todas.
No último dia 14 de agosto (antes de ser internado com problemas do coração), o juiz João Bosco Soares, da subseção da Justiça Federal em Laranjal, aceitou a denúncia de improbidade administrativa do MPF contra ela e mais três réus por desvio de recursos da Fundação Nacional de Saúde (Funasa).
Em 2014, uma auditoria do Tribunal de Justiça do Amapá (TCU) identificou graves irregularidades na aplicação de recursos de obras de ampliação do sistema de abastecimento de água da cidade.
Segundo o TCU, medições da obra, de um convênio de 2012, foram fraudadas para desviar mais de R$ 4,5 milhões. Os réus estão com os bens indisponíveis até esse valor. As conclusões do TCU deram origem à Operação Citrus, da Polícia Federal e Ministério Público Federal, que prendeu a ex-prefeita e gestores da Funasa, no fim de 2013.
Em abril de 2014, a denúncia foi enviada à Justiça Federal e lá permaneceu parada até o último dia 14. Foram mais de cinco anos tentando notificar todos os investigados.
O juiz considerou que o tempo de espera foi demasiado, e que alguns réus não foram sequer localizados para serem notificados a respeito do processo. Com base em julgamentos do STJ, ele observou que isso não pode mais ser impeditivo para que o processo siga adiante.
Defesa
Euricélia Cardoso apresentou defesa argumentando que as provas colhidas eram nulas, mas essa tese foi descartada pelo juiz. Em sua decisão, João Bosco citou que todas as interceptações telefônicas e apreensões de documentos na Operação Citrus foram autorizadas pela justiça, o que “fulmina” o argumento.
A suposta ausência de dolo, ou seja, de cometer as irregularidades, e possível falta de provas, conforme alegado pela defesa da ex-prefeita, serão analisados durante a instrução do processo, avisou o magistrado.
Ficha corrida
Euricélia Cardoso já tem um amplo histórico de denúncias e processos, com reflexos, inclusive, no âmbito eleitoral. Em 2016, ela foi impedida pelo TRE de concorrer de novo ao cargo de prefeitura de Laranjal do Jari, a pedido do Ministério Público Eleitoral. Concorreu por força de uma liminar, mas os votos foram considerados nulos. Se fossem validados, teria ficado em quarto lugar.
Em setembro de 2018, ela teve rejeitada pelo TCU a prestação de contas de outro convênio da época de prefeita. Os recursos eram do Programa Calha Norte. Euricélia foi multada em R$ 20 mil.
Em outubro também de 2018, ela foi condenada a 5,6 anos de prisão, em regime semiaberto, por desvio de recursos da atenção básica em 2008, quando também era prefeita. Na época da condenação, ela ocupava o cargo de deputada federal como 6ª suplente, após uma articulação para que os outros suplentes declinassem de assumir a vaga de Roberto Góes (PDT), que estava licenciado.
Ela ainda responde pelo desvio de R$ 15 milhões da obra da ponte sobre o Rio Jari, que já deveria estar ligando o Amapá ao Pará. A obra está parada desde 2008. Em 2016, o MPF denunciou ela e ex-gestores da Estacon Engenharia, que teria recebido o valor integralmente R$ 20 milhões sem executar toda a obra.