Por SELES NAFES
Demorou décadas, mas finalmente começa a acontecer. O Porto de Santana passa a exercer seu papel vocacional natural: o escoamento de grãos do Centro-Oeste brasileiro rumo a outros continentes. Esta semana, a cidade de Santana, a 17 km da capital do Amapá, assistiu ao primeiro transbordo de milho do Mato Grosso tendo como destino a Europa.
O transbordo é a transferência da carga para outro modal, neste caso, de barcaças para um navio graneleiro. Foram 38 mil toneladas, numa operação executada pela Cianport com apoio da Companhia Docas de Santana (CDSA).
O Porto de Santana tem uma vantagem comparativa que o Amapá vem tentando mostrar para o restante do Brasil e do mundo há várias décadas: Santana é um enorme atalho para a Europa, Ásia e Estados Unidos.
Para se ter uma ideia, a distância entre Sorriso (MT) e o Porto de Santos (SP), o maior do país, é quase 800 km maior do que a distância para a CDSA.
“Além do que os caminhões pegarão uma estrada congestionada, e chegarão a um posto congestionado. Sem falar que estamos no meio do caminho para o Canal do Panamá, Europa e Estados Unidos. Para sair de Santos é preciso contornar toda a costa brasileira”, explica o presidente da companhia, Glauco Cei.
Engenheiro civil, 59 anos, com pós-graduação em segurança do trabalho e MBA em perícia e meio ambiente, Cei se afastou da presidência do Sindicato da Construção Civil para se dedicar integralmente à nova missão: encontrar investidores para o Porto de Santana.
E ele está entusiasmado com a real possibilidade de os transbordos passarem a ser rotineiros a partir de agora. A atividade gera alguns empregos diretos, mas gera muito mais indiretos, além da arrecadação de ICMS.
E o futuro é promissor. Num cenário a médio prazo, a tendência é de que haja outras atividades agregadas ao transporte de grãos, como a instalação de indústrias para beneficiar a soja, um antigo sonho de todo amapaense.
Outras operações no Porto de Santana já estão ocorrendo, desta vez com soja e o farelo de soja.
O que representa em redução de custo exportar pelo Amapá?
Até 34%.
Mas então porque ainda não somos tão procurados pelas transportadoras?
Temos um gargalo. Desde 1997 não há investimentos no berço de atracação. O píer 1 tem 220 metros de comprimento, e o píer 2 tem apenas 160 metros.
Então navios maiores, com mais de 300 metros, não conseguem entrar?
Com esse estudo que a Marinha está realizando, que deve terminar dentro de um ano para atestar calados maiores, teremos navios maiores. Hoje já operamos com navios de 50 mil toneladas. Quando o estudo terminar, passaremos a operar com navios de até 100 mil toneladas. Queremos mostrar pro Brasil que a saída mais viável não é Oiapoque e nem Caiena, mas Santana.
O que a operação portuária pode representar em recursos para o Amapá?
Só a operação com navios que transportam combustíveis representou R$ 145 milhões em ICMS para o Estado em um ano (2017/2018). É o mesmo valor investido no novo Aeroporto de Macapá. O combustível vinha do exterior, e daqui era distribuído para o restante do Brasil. Essa operação ocorreu até o ano passado.
Mas o Amapá continua sendo rota de navios, não?
Sim. No ano passado, segundo a Marinha, tivemos mais de 1,3 mil navios fundeados no rio Amazonas, mas apenas 40 atracaram. Foram 159 navios de passageiros, e nenhum atracou aqui.
Além do estudo da Marinha, o que é preciso para aumentar a capacidade de atracação do Porto de Santana? Mobilização política?
Quando o Helder Barbalho (atual governador do Pará) foi ministro de Portos do governo Dilma/Temer, e o secretário de portos era o ex-senador Luiz Otávio (PA), eles direcionaram todos os investimentos portuários para o Pará. Ficamos para trás.
Com o crescimento da nossa atividade portuária o que pode acontecer?
Em alguns momentos vamos agregar outras atividades. Os produtores vão perceber que é melhor montar uma indústria aqui. Outra atividade viável é um ponto de abastecimento de navios.
O que pode ser feito para a CDSA ser ainda mais atrativa?
Baixar o custo com o serviço de praticagem, com aluguel de rebocadores. Nos próximos dias reuniremos com os operadores e com a praticagem para vermos uma forma de diminuirmos esse custo.