Por SELES NAFES
O juiz Diego Moura de Araújo, da 1ª Vara Criminal de Macapá, condenou três servidores públicos do Instituto de Administração Penitenciária do Amapá (Iapen) que emitiam e atestavam diplomas falsos para reduzir, proporcionar a progressão de regime e até remir a pena de detentos. O magistrado avaliou que os três causaram um “bug” no sistema judiciário.
Foram condenados:
Chefe da Unidade Profissionalizante, Carlene Alfaia Monteiro, que era servidora do contrato administrativo: 14,7 anos de prisão, em regime fechado, pelos crimes de corrupção passiva; ingresso de aparelhos telefônicos em prisão, e associação criminosa;
Detento Patrick Pinheiro do Nascimento: 6 anos e 11 meses, em regime fechado, por falsificação de documento particular e associação criminosa;
Professor e secretário escolar, Márcio Ronei dos Santos Fonseca, servidor da Secretaria de Estado da Educação: 12,6 anos, em regime fechado, além de multa, pelos crimes de associação criminosa e corrupção passiva.
De acordo com a denúncia do Ministério Público do Estado, que gerou a ação penal, o grupo operou entre o início de 2016 e março de 2018.
Internos que concluam cursos profissionalizantes, ou mesmo os estudos, dentro da cadeia são beneficiados com redução da pena e, em alguns casos, até com a remissão completa.
A defesa dos três alegou a inépcia da ação, mas o juiz descartou essa tese, afirmando que todas as condutas dos acusados estavam individualizadas com o grau de participação de cada um.
O magistrado elogiou o trabalho da Polícia Civil do Amapá, por ter desbaratado a quadrilha e impedido que centenas de detentos fossem beneficiados.
“(…) As condutas dessa quadrilha, além de afrontarem a Constituição Federal, a Lei de Execuções Penais e as recomendações do CNJ, colocaram em descrédito o próprio Poder Judiciário que foi induzido a erro por meio de certidões falsas”, destacou.
Ainda não é possível saber quantos detentos foram beneficiados com a redução das penas ou quantos até deixaram a prisão por conta disso. Na época da operação, em dezembro de 2018, a Polícia Civil divulgou que pelo menos 600 detentos teriam comprado os diplomas a preços entre R$ 10 mil e R$ 12 mil.
Como funcionava
Carlene Monteiro, então chefe da Unidade de Assistência Escolar e Profissionalizante do Iapen, foi apontada com a líder do grupo. A agente recebia dinheiro para certificar que detentos tinham concluído cursos profissionalizantes do Sest, Senai e Senac e até de faculdades particulares, segundo o MPE.
Num dos “serviços” feitos pelo grupo, Carlene teria recebido R$ 2 mil para emitir uma certidão de curso de 708 horas. Em outro caso, ela teria pedido mais R$ 2 mil para emitir um certificado de um ano de curso.
Parte das provas contra o grupo foi obtida em conversas de WhatsApp em celulares apreendidos. Em depoimento, Carlene negou todos os crimes.
Já o professor e secretário escolar Márcio Ronei declarou em depoimento que estava sendo ameaçado por internos do Iapen. O juiz ressaltou, no entanto, que ele nunca apontou quem o estaria ameaçando, e também nunca registrou ocorrência.
Ele também negou que tenha recebido dinheiro, apesar de declarar saber que detentos normalmente pagavam R$ 500 por certidão. Nas conversas de WhatsApp, no entanto, fica claro que alguns presos pagavam até R$ 3 mil por diploma. A partilha de um valor assim teria, inclusive, sido o tema de uma conversa entre Márcio Ronei e Carlene no aplicativo de mensagens.
Nos autos do processo, Patric Nascimento confessou que pagou R$ 26 mil a Carlene para “contabilizar tempo falso de penas”.
O magistrado afirma que as provas indicam que Patric atuava na confecção de diplomas falsos de cursos para serem entregues a Márcio e Carlene “a fim de garantirem a contagem e tempo falso de detentos que resolvessem pagar pela empreitada criminosa”.
Carlene também teria acertado com uma pessoa identificada apenas como “Beto” a entrada de vários celulares no Iapen, também mediante pagamento.
Carlene e Márcio, que estavam cumprindo prisão domiciliar, tiveram o benefício cancelado pelo juiz, e terão que cumprir as penas no próprio Iapen. Patric já estava em regime fechado por ser reincidente.