Feminicídio: casos aumentam na pandemia em quase metade do Brasil

Policiais retiram corpo de mulher morta pelo marido no conjunto Açucena, na periferia de Macapá. Na pandemia, casos cresceram em quase metade do país
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Por ARTEMIS ZAMIS, empresário e articulista

Era pra ser apenas um plantão tranquilo como quase todos no pequeno hospital de uma também pequena cidade do interior do Rio Grande do Sul, quando a noite, a rotina quase sempre calma, seria alterada com a entrada às pressas de uma mãe e sua filha de 8 anos de idade no pronto socorro.

A mãe tinha o rosto totalmente desfigurado, com o maxilar e o braço fraturados e marcas de forte espancamento por todo o corpo. Sua filha, em estado quase que de catatonia, tinha forte hemorragia interna resultado do estupro que acabara de sofrer do próprio pai.

O sentimento de revolta, extrema indignação e nojo, tomou conta de toda a equipe que fez o atendimento e não poderia ser diferente. São humanos, e graças a seus esforços e cuidados, puderam ser transferidas para outra unidade com toda segurança.

Esta ocorrência, chocante e cruel, infelizmente acontece com mais frequência do que se imagina e os requintes de crueldade sempre se superam a cada caso ocorrido por todo o país.

O feminicídio é o assassinato de uma mulher, devido ao desprezo que o autor do crime sente quanto à identidade de gênero da vítima. Quase sempre perpetrado por homens, parceiros ou ex-parceiros, são na maioria das vezes ocasionados por abusos, ameaças ou intimidações, violência sexual ou em situações em que a mulher se encontra em total vulnerabilidade.

Operação durante a pandemia cumpriu mandados contra homens acusados de violência doméstica em Macapá

Desde que a pandemia se instalou no Brasil, onde nos vimos obrigados ao isolamento social, casos de feminicídio crescem a cada dia assustadoramente em todo o país.

Segundo relatório produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), em 12 estados da federação, os casos subiram 22,2% entre março e abril deste ano, comparativamente ao mesmo período do ano passado.

No Acre, o aumento foi de 300%, Maranhão, 166% e Mato Grosso, 150%. Triste e preocupante também é se verificar na pesquisa que houve considerável queda na comunicação das ocorrências de agressão.

* No Amapá, segundo a Secretaria de Justiça e Segurança Pública, houve redução de 52% nos casos de violência doméstica. Em um junho, a Polícia Civil fez uma grande operação para prender acusados de crimes contra mulheres, a maioria maridos e ex-companheiros.

Mais próximas

O crescimento do feminicídio e da violência doméstica em quase metade do país se deve muito ao fato de as vítimas estarem por mais tempo próximas a seus algozes, que por conta do isolamento social podem muito facilmente impedir suas as vítimas de buscar socorro, indo a uma delegacia ou a outros locais que prestam assistência as vítimas, como centros de referência especializados ou qualquer outro canal alternativo de denúncia.

Por esta razão, especialistas consideram que a estatística pode estar longe da realidade vivenciada, conforme informa o próprio relatório do FBSP.

Equipe do GTA prendeu acusado de agredir a esposa constantemente. Fotos: Olho de Boto/SN

A violência vivida não é só física, mas também psicológica. É gritante. O feminicídio, termo criado pela socióloga sul-africana Diana E.H. Russel, é um dos crimes mais covardes e perversos criados pelo homem.

Hoje, vivemos em um Brasil totalmente dominado pelo pior da masculinidade. Somos um país menos alegre, mais dividido, mais violento e com o ódio disseminado por todos os lugares.

Urge que lutemos para mudar esse quadro de horror por que passam as mulheres. O patriarcado criado desde os tempos das cavernas, não pode permanecer nesse mundo novo que surgirá. A igualdade entre nós homens e mulheres deve ser a norma da qual tenhamos que ter orgulho e não medo da mulher.

A pouca severidade das leis só ajuda no aumento dessa crueldade. Em uma sociedade onde a misoginia e o machismo são estruturantes, a violência contra a mulher se tornou algo naturalizado em nosso cotidiano.

Precisamos romper com essa mentalidade, e desaprender o mito do patriarcado. A abordagem do tema nas salas de aula, aliada a criação de novas políticas públicas com campanhas de conscientização nas redes sociais e mídia em geral é imprescindível para criarmos um futuro sem misoginia, sem homofobia, sem racismo e sem desigualdade de gênero.

Rotineiramente, polícia do Amapá faz operações para cumprir mandados contra agressores de mulheres. Fotos: Rodrigo Índio/SN

A luta para que a história deixe de ser contada apenas por governos de homens brancos que criaram leis onde a mulher sempre foi colocada a margem dela, precisa ser mais intensa. A mulher tem a liberdade e é totalmente preparada para começar a contar a nova história de um novo mundo, de um novo amanhecer.

Homens, abominem a misoginia e respeitem quem vocês escolheram como parceiras para a vida.

Precisamos lutar e acreditar que esse mundo é possível.

Seles Nafes
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