Por MARCO ANTÔNIO P. COSTA
Tomada pelo mato, com portões escancarados e com restos de lixo, a sede da União dos Negros do Amapá (UNA) e do Centro de Cultura Negra do Amapá (CCNA), prossegue no abandono, que parece não ter fim.
Inaugurada em 1998, no histórico e negro bairro do Laguinho, área central de Macapá, parece ser o ponto mais agudo da crise das entidades sociais pela qual passam os grupos da tradicional comunidade macapaense, que também engloba o clube esportivo São José e a 1ª escola de samba do Estado, a Boêmios do Laguinho – outra instituição que luta constantemente para se reerguer.
Há alguns dias o Portal SelesNafes.com busca posicionamento da direção da entidade sobre os problemas, porém, não houve retorno.
Anualmente, no mês de novembro, o espaço sofre intervenções do poder público, por causa do Encontro dos Tambores, festividade que faz parte da programação oficial do Estado em comemoração ao Dia da Consciência Negra. Mas, nos últimos anos, é praticamente o único evento realizado no local que leva orgulho às raízes negras da comunidade.
No restante do ano, o complexo onde é a sede e antes era uma praça fica largado ao tempo. A reportagem do Portal SN esteve na sede da entidade, onde não há qualquer tranca nos portões. Mato, lixo, resto de roupas, fezes e outros tipos de sujeira confirmam o abandono. Há vidros de portas quebrados, enquanto outras estão no chão.
Francisco Lino da Silva, o Mestre Lino, de 84 anos, morador antigo do bairro e vizinho da UNA, fala, com lamento, sobre a situação.
“Ali é o Centro de Cultura Negra, né, que cedeu para a UNA, mas até agora não está dando certo. Quantos presidentes já passaram por lá e nada fizeram? E a gente tá aqui, torcendo para que haja uma solução, para que a gente possa reviver os bons tempos quando era da praça, a gente se abraçava e se encontrava e agora não. Não sei, parece que tem dono. É praxe, é São José, Boêmios, parece que tem dono. Isso pertence à comunidade, que tem que se manifestar e pode contar com meu apoio”, declarou Mestre Lino.
UNA
Josivaldo Libório, que está à frente da junta governativa da entidade, não poupou críticas às gestões passadas, autoridades governamentais, políticos, empresários e até à Justiça, de quem reclama morosidade. Ele esclarece a questão do tempo, que de outubro para cá foi realizada a programação do Dia da Consciência Negra e eles sempre buscaram o poder público para construir alternativas.
Em fevereiro, relata, foi chamado e repassou plantas para a Secretaria de Infraestrutura do Estado (Seinf), que tem um projeto de reforma. Mas ele diz que depois veio carnaval e depois a pandemia.
Para Libório, a entidade está atolada em uma crise moral, culpa das gestões passadas, e financeiramente não tem nenhuma possibilidade de fazer sozinha a manutenção do espaço ou revitalização.
“Bem sabemos de toda a realidade em que passou a ser aquele complexo, que de centro de referência passou a ser centro de vergonha e elefante branco, bem como galinha dos ovos de ouro, que desde a sua inauguração teve seus gestores arquitetados por grupos político-partidários, sempre com o único interesse em contrapartida: formar uma base política e eleitoral em troca de benefícios escusos, que levaram a tornar o lugar em um cemitério predial, após plano maquiavélico arquitetado pelo então presidente, apoiado por um forte grupo político que o apoiou integralmente”, desabafou Libório.
Como conclusão, o atual gestor disse que está de passagem e quer mesmo é chamar atenção dos políticos, especialmente os deputados e gestores negros, para que façam alguma coisa.
GEA
A Secretaria Extraordinária de Políticas para os Povos Afrodescendentes (Seafro), através do Secretário Aluizo Carvalho, declarou:
“O Estado entende a importância da UNA e do Centro de Cultura Negra. Todavia, em relação a UNA, esperamos que ela supere logo as dificuldades que por ventura estejam passando. Em relação espaço físico (Centro de Cultura Negra) buscamos diálogo com a comissão que está à frente, com a intenção de auxiliá-los na busca de recursos emenda para viabilizar a reforma”, declarou o Secretário.
Improir
Já o Instituto Municipal de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Improir), órgão vinculado ao município de Macapá, deu mais detalhes sobre os planos e dificuldades de implementação.
Maykom Magalhães, titular da pasta, afirmou que o município se coloca à disposição para colaborar, mas respeitando a autonomia da UNA e do movimento negro.
Ele confessa que gostaria que sede do Improir pudesse funcionar no espaço, mas fala sobre as dificuldades orçamentárias.
“O meu sentimento é de tristeza por ver um espaço tão importante, com tanta história, se degradando. Nos reunimos várias vezes com a diretoria, com o movimento e discutimos algumas alternativas. Eu, particularmente, defendo que ali seja uma gestão compartilhada, só que para isso precisamos de duas coisas: revitalizar, o que tem custo alto e, segundo, é o movimento querer, porque a UNA, embora o terreno seja da PMM e a estrutura do Estado, ela é uma entidade social, e nós respeitamos muito isso”, declarou Maykom.
Ele ainda revelou que estudos preliminares apontam que uma reforma ideal no espaço custaria mais de R$1 milhão e que estão todos correndo atrás de verbas parlamentares para a realização das obras.
Maykom informou que a Zeladoria Municipal irá realizar uma limpeza local nos próximos dias.