Por MARCO ANTÔNIO P. COSTA
Quem vai aos supermercados já percebeu: o preço dos alimentos subiu. No Amapá, carne, feijão, óleo de soja e açúcar são alguns dos itens que tiveram maior variação para cima.
Em Macapá, Érica Souza, de 40 anos, relata que seu carrinho de compras, que antes custava R$ 380, agora chega a R$ 800.
No restante do país, o arroz é o item que mais tem empurrado a inflação. Em capitais como Rio Janeiro e São Paulo, já começou a ocorrer limitação da compra de itens por cada consumidor.
Peixe no lugar de carne
Alguma das alternativas encontradas, é a substituição da proteína principal da alimentação diária. É o que Érica fez.
“A carne tá bem cara, além da falta. Já tentei em vários lugares e não encontro, por exemplo, o contrafilé. A última vez que eu encontrei foi a R$ 28 o quilo, hoje tá mais de R$ 50. Eu tenho comprado peixe, é o que eu mais a gente tem consumido. O que a gente consumia menos, agora a gente consome mais. E outros produtos, no geral, estão muito mais caros. Já comprei em todas as redes e atacadões e está tudo muito mais caro”, reclamou Érica.
Em uma rede de supermercados da capital do Amapá, por exemplo, a popular bisteca, estava sendo comercializada, na tarde desta quarta-feira (9), a R$ 25,98 e a alcatra, que há pouco tempo custava aproximadamente R$ 24, agora está R$ 33 o quilo do pedaço e R$ 35 se fatiada em bifes.
Mesmo a costela bovina, que há menos de um ano custava em torno de R$ 15, agora está custando R$ 25.
A carne é, sem dúvida, o preço que mais disparou no Amapá até agora. Outro produto que o preço saltou largamente é o feijão, tendo sido encontrado até no valor de R$ 7,28 o tipo preto, e a R$ 6,49 o tipo carioquinha. O quilo destes produtos era comercializado, poucos meses atrás, na casa de R$ 4, em média.
Explicações
O fenômeno de efeito devastador na mesa do consumidor, especialmente do mais pobre, tem explicações na economia e na política.
Na tarde desta quarta-feira o presidente da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), João Sanzovo Neto, negou que o setor esteja inflacionando os preços. Além disso, ele sugeriu a substituição de arroz por macarrão e disse que os mercados irão incentivar, inclusive, a troca dos produtos.
O IPCA (Índice de Preço ao Consumidor Amplo), que é a inflação oficial, acumula uma alta de 2,31%, mas nos itens da cesta básica, o índice chega a 7,61% nos últimos doze meses. O consumidor, porém, tem uma sensação de alta muito maior.
O Portal SelesNafes.Com conversou com o economista Charles Chelala, que elucidou algumas das razões para a crise atual.
Uma das explicações é a alta do dólar, que influencia em dois movimentos. Por um lado, essa escalada da moeda americana encarece a importação de produtos como o trigo, que o Brasil acaba pagando mais caro e influencia toda uma cadeia de alimentos e comércio.
Essa mesma alta do dólar faz com que o produtor brasileiro, do agronegócio, sinta-se muito mais atraído pela lucratividade de vender em dólar, ou seja, de exportar. Este movimento já é amplamente conhecido no país, mas o professor agrega um ponto.
“Esse mesmo dólar sobrevalorizado acabou estimulando a exportação e você teve uma retomada da demanda, especialmente da China, pós-pandemia – [China que foi o único país que cresceu no último trimestre], eles passaram a importar muito alimento e não apenas aquelas commodities [produtos de baixo valor agregado, como soja e minérios], foi tudo: carne – muita carne – feijão, arroz, milho, enfim, esse excesso de exportação acabou escasseando o produto e elevando o preço internamente. Essa, talvez, tenha sido a principal causa para essa inflação localizada nos alimentos”, analisou o professor.
Um outro elemento que, segundo Chelala, tem menos importância, é o auxílio emergencial de R$ 600, o qual a maior parte foi usada para comprar alimentos. Então, como houve uma demanda maior por alimentos dentro do país, isso contribuiu, ainda que minoritariamente, para essa pressão inflacionária.
O que o professor mais chama a atenção é que o Brasil descuidou da política de segurança alimentar, que é praticada em todos os países. Para Chelala, o Brasil não tinha porque passar por essa crise.
“O Brasil, até pelas suas condições de grande produtor, não tinha porque passar perrengue com preço e abastecimento de alimentos, pelas suas dimensões continentais, pela sua estrutura, por ser um grande ‘celeiro do mundo’. Mas, acontece que o governo não se preocupa em ter uma política de segurança alimentar clara, específica, pensada. E o país tem uma política de estímulo fortíssima à exportação, então, sempre o produtor vai preferir exportar do que abastecer o mercado interno, e não existe nada pensado em estoques reguladores e estímulos para a produção interna”, concluiu Chelala.