Por MARCO ANTÔNIO P. COSTA
Um animal fantástico, belo, raro e imponente resolveu fazer seu ninho perto de uma estrada de chão, em uma comunidade rural de Porto Grande, município central do Amapá, distante cerca de 100 Km de Macapá.
Quando o extensionista rural Luiz Carlos Brito da Silva viu o grande ninho do Gavião-Real, ficou tanto empolgado e impressionado, quanto preocupado. Ocorre que o ninho que abriga uma família – fêmea, macho e um filhote gavião-real – está próximo de áreas habitadas, e Luiz, que aos 50 anos ainda não tinha se deparado com um ninho na região, começou a correr atrás das autoridades.
A ideia do extensionista é trabalhar a conscientização da comunidade sobre a importância, e até o privilégio, da família Real ter escolhido o local para fazer sua reprodução.
Gavião-Real é o nome popular da Harpia harpyja, uma das maiores aves de rapina do mundo, podendo chegar a uma envergadura de 2,5 metros e pesar até 12 quilos.
A Harpia é, sobretudo, um grande predador. Alimenta-se, basicamente, de mamíferos de médio porte, como macacos, preguiças, quatis, e também come outras aves. É um monogâmico e geralmente viverá com um único parceiro pela vida toda.
Hoje é um animal raro, que demora a se reproduzir e apesar de existir de uma faixa que vai do México até o limite do cone sul, na Argentina, a sua maior incidência é mesmo na floresta amazônica, especialmente a brasileira. Também existe, embora muito raramente, na mata atlântica.
É difícil encontrar o ninho do animal. Geralmente, ele os constrói em árvores de 40 metros ou mais, aquelas em que as copas se destacam das demais. No caso desta família de Porto Grande, a árvore escolhida foi um angelim de aproximadamente 30 metros.
Quando constrói seu ninho, costuma voltar para o mesmo local de dois em dois anos para se reproduzir. É um processo demorado, entre a incubação, criação, os primeiros voos do bebê harpia e, finalmente, a autonomia, leva-se, em média, 10 meses. Por isso, os ninhos são centralmente importantes para essa ave. Apesar de ser grande, não é fácil catalogar um ninho. Este é o primeiro que está sendo catalogado no Amapá.
O biólogo especialista no estudo das aves, o ornitólogo Kurazo Okada, explicou sobre as características deste animal.
“Essa espécie é a maior ave de rapina das américas. Ela precisa de grandes áreas verdes para poder sobreviver. Raramente se desfaz do seu ninho. Como é uma reprodução de dois em dois anos, um tempo demorado, como é um filhote só por ninhada, isso faz com que a densidade da espécie seja muito baixa, mais um motivo para ela e para as áreas serem protegidas. É um bicho ameaçado e protegido por lei”, contou Okada.
Conscientização
Luiz já foi ao secretário estadual de meio ambiente no Amapá em busca de apoio. Esteve no Bioparque da Amazônia e foi seguindo sua busca até encontrar o Projeto Harpia, do Amazonas, que já enviou uma pesquisadora e um fotógrafo para o local.
Foi o fotógrafo Fábio Sian Martins que fez as lindas fotos que ilustram esta matéria.
“Como é uma ave raríssima, e o local que está inserida é muito próximo da comunidade de Porto Grande, uma estrada passa por debaixo do ninho, eu fiquei preocupado, sabendo que as pessoas tem o costume de matar, inclusive falaram lá na comunidade que, pouco tempo atrás, mataram um, então, fiquei preocupado”, comentou o extensionista.
O próximo passo é buscar apoio da Secretaria de Meio Ambiente do município e envolver pesquisadores do Iepa.
Através da reportagem, o ornitólogo Kurazo Okada já entrou em contato com Luiz e os dois agendaram uma visita ao local.
Sem esperar por nada, o extensionista tem feito sua parte: leva pessoas para observarem a família, conversa com a comunidade, e lhes deu até a ideia de mudarem o nome para “Comunidade do Gavião-Real”.
“É uma ave característica aqui da nossa Amazônia. Hoje já é bastante rara, mas ainda a temos, e deve ser preservada, deve haver uma mobilização para preservar. A ideia que estou tendo é mobilizar a secretaria municipal [de meio ambiente], a estadual já estive lá, pra que a gente faça um trabalho junto à comunidade”, explicou Luiz Carlos.