No Amapá, fake news atrapalham vacinação indígena

Numa das aldeias com mais de 1 mil moradores, apenas 195 aceitaram ser vacinados
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Por MARCO ANTÔNIO P. COSTA

O inverno amazônico, os rios, estradas sinuosas e as enormes distâncias não têm sido os únicos desafios das equipes envolvidas na vacinação dos povos indígenas do Amapá e norte do Pará. A tudo isso, somou-se o enfrentamento à desconfiança e às fake news que assolam o mundo inteiro, e que encontram no Brasil atual uma forte caixa de ressonância. Nas aldeias, onde os indígenas também estão conectados, a desinformação é uma doença tão letal quanto a covid-19.

Ainda assim, os números, dada a complexidade da ação, são considerados exitosos pelo Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei Amapá e norte do Pará). Além do Amapá, o Estado Brasileiro fez a divisão para que a zona sanitária também alcançasse as tribos e etnias que estão localizadas geograficamente nos municípios de Óbidos e Almeirim (PA), em localidades onde só é possível chegar após horas de voo, em pleno Parque Nacional do Tumucumaque, já próximo ao Suriname.

Carros, ônibus, voadeiras, aviões e helicópteros têm a tarefa de chegar em 142 aldeias e atingir 7.616 indígenas. Destes, 4.053 (53%) já receberam a primeira dose do imunizante.

Mas, além de tudo, as fake news chegaram com mais força em alguns lugares. Andreia Pacheco coordena o Núcleo Estadual de Saúde Indígena, o Nesi, e está acostumada a fazer trabalhos como esse. Desta vez, em tribos como a Kumenê, na Terra Indígena Uaçá, às margens do Rio Urukawá (Oiapoque), a dificuldade encontrada foi grande. Com quase 1 mil indígenas, apenas 195 quiseram tomar a vacina. Os motivos da recusa são os mesmos das redes sociais: o medo de efeitos colaterais graves, uma mentira disseminada por grupos políticos negacionistas.

“Teve muitos casos de fake news. Na aldeia Kumenê, eles foram bem atingidos com essa questão e a gente teve uma dificuldade para vacinar. Muitos indígenas queriam esperar alguns serem vacinados primeiros para terem certeza que as pessoas não vão morrer, que se fosse vacinados com 20 dias as pessoas iam morrer, que iriam virar jacaré ou que também eles não poderiam fazer filhos. Essas fake news que atingiu lá bastante essa aldeia”, contou Andreia.

Conectados nas redes sociais, muitos indígenas acreditam nas fakes. Fotos: Alessandro

A aldeia Kumenê abriga o povo da etnia palikur, sob uma paisagem fantástica e com uma cultura muito interessante, onde os indígenas falam o próprio idioma, francês, crioulo e português. A denominação evangélica Assembleia de Deus é muito forte no local e, de um ponto de vista antropológico, as casas de farinha são parte do centro de organização social e familiar da etnia. O portal SelesNafes.Comcontou um pouco dessas características em outra oportunidade.

Mesmo assim, a enfermeira exaltou o resultado obtido até agora e a participação dos profissionais da saúde do Amapá e a parceria com o Dsei, que além de levarem a vacinação em si, desenvolveram o papel de agentes de saúde, explicando e convencendo os povos indígenas a tomarem a vacina.

É necessário ir de casa em casa

Com medo, alguns preferem esperar para ver se haverá efeito colateral nos primeiros vacinados

No mesmo caminho, o coordenador do Dsei Amapá e norte do Pará, Roberto Bernardes, conta que há muitas dificuldades, e que é necessário ir de casa em casa. Na estação das chuvas as aeronaves não podem decolar em algumas situações e as condições de trafegabilidade atrapalham. Mesmo com tudo isso, o Estado Brasileiro, com a ajuda do exército, do governo do Amapá, Ministério da Saúde e outros atores, vai conseguindo chegar nos lugares mais remotos.

“O Dsei Amapá e norte do Pará continua, nesse momento, com a primeira fase da campanha deimunização contra a covid-19. Isso tudo se dá tendo em vista o vasto território sanitário que o distrito é responsável, estamos aí com o Amapá todinho e o norte do Pará com o município de Óbidos e Almeirim. O trabalho em conjunto, vai rendendo resultado e logo, logo, deveremos começar a segunda etapa da imunização”, contou Roberto.

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