Por RANDOLFE RODRIGUES, senador
O caso envolvendo Bruno Araújo e Dom Philips traz à tona importantes questões a respeito da Amazônia e o desafio de nossa geração em relação ao bioma que ocupa mais da metade do território nacional.
O episódio reúne alguns dos elementos mais significativos que caracterizam a situação atual da região: o abandono do Estado, a ação criminosa de narcotraficantes, madeireiros e garimpeiros ilegais, além das constantes ameaças às comunidades tradicionais e áreas indígenas. É um triste réquiem que sintetiza a política do governo Bolsonaro para Amazônia que estimulou as ilegalidades, gerando a sensação de impunidade aos criminosos, política essa tão bem expressa na notória expressão de “passar a boiada”, verbalizada pelo ex-ministro Ricardo Salles.
Nós, amazônidas, somos seguidamente confrontados com duas posições extremas e igualmente equivocadas sobre a gestão da região: de um lado os preservacionistas radicais que propõem fechar a Amazônia em uma redoma intransponível a qualquer atividade econômica, mantendo assim a situação atual de carência do povo que mora na região. Por outro lado, os predadores advogam o crescimento a qualquer custo, desprezando a relevância socioambiental da manutenção do bioma.
Tais posições igualmente retrógadas estão sendo superadas por novas concepções de desenvolvimento que propõem, em meio a ataques e ameaças, conciliar desenvolvimento e meio ambiente. É possível crescer, gerar emprego e renda, melhorar as condições de infraestrutura da Amazônia, produzir do minério de ferro ao açaí, sem ameaçar nem unidades de conservação nem terras indígenas, mantendo e regenerando a floresta em pé.
Um dos modelos que comprovam essa tese é a bioeconomia, sistema que reúne as atividades produtivas baseadas em recursos naturais renováveis, com alta agregação de tecnologia e ampla aplicação na alimentação, fármacos, cosméticos, indústria química, energia limpa, etc. Um estudo realizado no Pará, por exemplo, identificou que, em 2019, o setor gerou mais de 5,5 bilhões de reais, com forte predominância para o açaí e o cacau.
Da mesma forma, é possível produzir madeira a partir do manejo sustentável, com certificação internacional, desde que asseguradas os níveis adequados de industrialização e a fiscalização dos procedimentos.
Tampouco há que se proibir agricultura intensiva, pecuária ou mineração na Amazônia. Para definir as áreas em que essas atividades podem ser praticadas, é fundamental aprimorar o zoneamento ecológico econômico, definindo potencialidades, vulnerabilidades e restrições ao território.
Outro ponto que causa controvérsia é a necessidade de reforçar a infraestrutura da Amazônia. Falo das rodovias, portos, aeroportos, energia elétrica, comunicações (em especial internet), condições urbanas dos municípios, particularmente no saneamento básico. É plenamente possível aliar a infraestrutura à preservação ambiental, melhorando a qualidade de vida e potencializando o aproveitamento sustentável das riquezas da região.
Amazônia pode e deve se industrializar. Tenho defendido o modelo de “Zona Franca Verde” já em vigor no Amapá, Rondônia, Acre e Roraima, apesar da ainda pequena efetividade. Tal concepção promove incentivos fiscais à industrialização desde que haja predominância de matéria-prima regional, estimulando as cadeias produtivas locais.
É fundamental reforçar qualitativa e quantitativamente a presença do Estado. Trata-se de equipar e ampliar as equipes do IBAMA, do ICMBio, da FUNAI, do Exército Brasileiro, da Polícia Federal e dos órgãos ambientais estaduais e municipais, garantindo-lhes condições para monitorar com inteligência e fazer cumprir a lei na região.
Esse é o caminho para que, num futuro próximo, não voltem a ocorrer episódios como o que hoje consterna o Brasil e o Mundo.