Por SELES NAFES
A situação judicial da deputada federal Sílvia Waiãpi (PL-AP), acusada de pagar um tratamento estético com dinheiro público do fundo eleitoral, demonstra como a justiça eleitoral e a legislação podem ser tão complexas e inusitadas. Ao mesmo tempo em que ela teve as contas de campanha aprovadas pelo colegiado do Tribunal Regional Eleitoral do Amapá, em outro processo (também no TRE) ela pode ser condenada exatamente por essa acusação, e ainda por ter mentido sobre a aplicação dos recursos.
A então candidata foi denunciada por uma ex-coordenadora de campanha que procurou o Ministério Público Eleitoral, ainda em setembro do ano passado, para afirmar que Sílvia tinha usado mais de R$ 9 mil do fundo eleitoral para pagar uma harmonização facial, num consultório odontológico. Sílvia nega que tenha feito o tratamento e utilizado recursos do fundão.
Apesar do parecer técnico interno do TRE indicar que havia irregularidades na prestação de contas da campanha, por 4 votos a 2 o tribunal aprovou as contas em dezembro. O relator do processo, juiz Mário Júnior, considerou que todos os recibos e notas fiscais da campanha haviam sido apresentados pelo contador, conforme prevê a legislação.
Por mais que as contas tenham sido aprovadas por esse mero legalismo, há um segundo processo que gera preocupação à parlamentar. Também movido pelo Ministério Público Eleitoral, a ação apura o “gasto ilícito de recursos”.
O processo, no entanto, parou. Primeiro o tribunal precisa decidir sobre o pedido de impedimento de uma juíza feito pelo MP. Paola Julien Oliveira dos Santos, a nova relatora do processo, tem um parente que concorreu a uma cadeira de deputado estadual pelo Solidariedade, nas eleições de 2022.
Apesar dele não ter sido eleito, o MP Eleitoral pediu que a juíza seja retirada do caso para evitar o risco de um voto influenciado por questões partidárias. O desembargador João Lages concordou com esse entendimento, mas o juiz Mário Júnior, o mesmo que aprovou as contas de Silvia Waiãpi, pediu mais tempo para analisar o pedido de impedimento.
Os magistrados precisam decidir essa questão antes de analisarem as robustas provas do Ministério Público Eleitoral. E não são poucas. Recibo da clínica, comprovantes de movimentação bancária e depoimentos enriquecem a denúncia de abuso do Fundo Especial de Financiamento de Campanha do PL.
Além disso, agora o procurador eleitoral Pablo Luz está pedindo a condenação dela por litigância de má-fé, ou seja, a deputada teria mentido à justiça quando nega que tenha feito o tratamento, principalmente com recursos públicos. O MP usa o depoimento do odontólogo William Rafael (foto em destaque) que confirmou ter atendido Sílvia.
Procurada, a assessoria de imprensa da deputada confirmou que existe esse pedido, “mas não tem consistência, uma vez que a deputada federal é a ré e não a litigante. Ela acredita que o Ministério Público erra ao fazer esse tipo de pedido exatamente por não ser ela a autora da ação”.