Por RODRIGO DIAS
“Crianças nascem cientistas, engenheiras, tecnólogas. O que as cala é uma educação falha. A escola, muitas vezes, apaga a curiosidade e a capacidade de observar o mundo ao redor”.
Essas são palavras sábias e poderosas da famosa professora e engenheira Roseli de Deus Lopes, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), que inspirou muitos com sua paixão pela ciência, entre eles o amapaense Aldeni Melo.
Ele, apesar das dificuldades, encontrou no senso comum a força para apoiar novas ideias, sempre com o sonho de uma sociedade melhor.
Na infância, Aldeni já mostrava o espírito inquieto de um inventor. Sempre curioso, queria criar, queria inovar, mas o apoio dos professores foi tímido diante do tamanho dos sonhos do aluno. No entanto, ele seguiu firme e determinado.
Seu grande objetivo foi alcançado há 24 anos, quando se tornou professor de ciências em escolas públicas do Amapá. Ao longo de sua jornada, passou por cidades como Porto Grande, Santana, Amapá e Macapá, sempre com o mesmo desejo: transformar a educação.
Mas foi na capital amapaense que a semente do seu grande projeto germinou. Em 2012, Aldeni criou um projeto de Alfabetização Científica na Escola Estadual Irmã Santina Rioli, no Bairro Trem, zona sul da capital. A ideia de descobrir e lapidar novos cientistas dentro da escola pública era uma missão pessoal, pois, como aluno, sentiu a falta desse tipo de incentivo. E os frutos não demoraram a aparecer.
Em 12 anos, Aldeni orientou mais de 200 alunos, acumulando mais de 500 premiações em competições estaduais, nacionais e internacionais. Os prêmios abrangem 7 áreas do conhecimento: Engenharias, Ciências Agrárias, Ciências Biológicas, Ciências Sociais Aplicadas, Ciências Humanas, Ciências Exatas e Ciências da Saúde.
“No Amapá, temos muitos alunos talentosos. A minha ideia é expandir essa iniciativa para mais escolas, começando por Macapá e Santana, e aumentar o número de projetos de pesquisa”, afirma Aldeni.
Entre as muitas conquistas está o tricampeonato latino-americano, que deu a Aldeni e seus alunos a oportunidade de representar o Brasil na Intel-ISEF, a maior feira internacional de ciências e engenharia do mundo, realizada nos EUA.
Em 2018 e 2019, com o apoio do Governo do Amapá, ele e o pupilo, Caio Vinícius, estiveram no importante evento com um projeto que usava energia solar para dessalinizar água, pensado para a comunidade ribeirinha da Vila Sucuriju, por onde só se chega de barco, no município Amapá. O projeto surgiu a partir da realidade vivida pelas famílias da comunidade, que não tinham acesso a tratamento de água para consumo.
“Esses eventos são o topo para o pesquisador, sendo do Norte, de Macapá, da rede pública e ser premiado é significante porque permite entender que nós estamos no hall a nível de Brasil e internacional, a gente não está romantizando, estamos sonhando, acreditando e levando isso pras feiras mostrando que o aluno de escola pública é capaz”, pontuou o professor.
Em 2024, mais um orgulho: Miguel Moreira, ex-aluno de Aldeni, levou uma medalha de bronze na Genius Olympiad, em Nova Iorque. O jovem apresentou o projeto “Mauritia”, que propunha a limpeza de rios e lagos da Amazônia com sementes de moringa oleifera. Hoje Miguel estuda no Instituto Federal do Amapá, mas ainda é orientado pelo professor Aldeni.
“Temos bastantes comunidades ribeirinhas e urbanas que sofrem com a questão da água contaminada. A exemplo disso, é nosso próprio canal aberto em Macapá que é despejado no Rio Amazonas, pensei na ideia para limpar essa água e para que ela possa ser utilizada. Deu certo e estou levando o projeto para o mundo e ganhando vários prêmios com a orientação do professor que é um amigo e incentivador”, compartilha Miguel.
Outra jovem inspirada pela atuação empolgante de Aldeni é Ana Clara Rodrigues, que desenvolveu um adubo sustentável a partir de carcaças de caranguejo. O produto tem aplicações em culturas como hortaliças e no plantio de soja. O projeto foi testado e validado com sucesso pela Embrapa Amapá.
“Desde criança sempre tive interesse em ciência e inovação. Conhecer o professor me dez acreditar que é possível eu chegar onde eu quiser. O meu projeto surgiu depois que eu vi que dão muitos destinos para restos de açaí e camarão, mas e o caranguejo que 80% dele é descartado? Então decidi fazer um estudo que reutilize o caranguejo de feiras ou restaurantes, trituramos e misturamos com outros materiais. Vira uma farinha não comestível. Serve para adubação, em porcentagem certas pode funcionar para hortaliças, soja, cana-de-açúcar e laranja. Fizemos vários testes pela Embrapa, e deu certo”, diz Ana, que também foi aluna dele durante sua passagem pela Escola Santina Rioli. Ela agora estuda na E.E Dr. Alexandre Vaz Tavares.
Esses são apenas alguns exemplos dos projetos inovadores que o professor orientou ao longo dos anos. No ano passado, ele descobriu ser autista nível 1 e, mais do que nunca, acredita que o potencial científico e inovador existe em todos nós.
Ele segue incentivando seus alunos. Esta semana esteve à frente da equipe “A Ciência Que Eu Faço”, que participou da 21ª Semana Nacional de Ciência e Tecnologia no Amapá, realizada no Aeroporto Internacional de Macapá.
O evento anual é uma celebração da inovação, com debates, trocas de ideias e apresentações de projetos tecnológicos e resolutivos. Este ano, o tema foi “Biomas do Brasil: diversidade, saberes e tecnologias sociais”. Aldeni continua firme na missão.
“Precisamos dar voz aos alunos e suas comunidades. A ciência nos dá soluções sustentáveis para os problemas que encontramos. Sinto uma enorme satisfação ao olhar para trás e ver que estamos deixando um legado. E continuarei incentivando”.