Por LEONARDO MELO
O lançamento de uma agroindústria na Amazônia aumentará em até 60% a renda familiar de comunidades extrativistas do Amapá e do Pará. Os trabalhadores poderão, agora, processar as sementes colhidas na floresta para retirar óleo e manteiga vegetal, usados na produção de diversos cosméticos – antes, eles só lucravam com a venda da matéria-prima.
Inaugurado oficialmente no dia 23 de maio, o complexo industrial fica na Ilha das Cinzas, região do arquipélago do Marajó (PA). O seu sistema é operado 100% por energia solar e possui baterias de lítio para armazenamento de carga elétrica. Este projeto é o primeiro do tipo em uma área de várzea, cuja água do rio sobe em alguns períodos e inunda o território.
A iniciativa é resultado da parceria entre a Natura Cosméticos e a WEG, fabricante de equipamentos elétricos. As empresas trabalharam junto com a Associação dos Trabalhadores Agroextrativistas da Ilha das Cinzas (Ataic), que atende comunidades de Afuá, Gurupá, Breves, Chaves e Anajás, no Pará, e Mazagão, no Amapá.

Cosméticos feitos a partir de frutos da Amazônia – Divulgação
Josi Malheiros, de 42 anos, é cofundadora da Ataic. Ela destaca a união das mulheres extrativistas que iniciaram na coleta de ucuuba em 2015, e nos anos seguintes incluíram também o murumuru e a patauá. No início das atividades, as trabalhadoras chegaram a sofrer preconceito nas comunidades por ficarem com o cheiro dos frutos no corpo.
“A agroindústria para nós vem trazer mais do que um sonho: é uma realização. De onde nós saímos, não éramos permitidos sonhar a essa altura. Nós construímos espaços de articulação para que isso acontecesse e chegamos a um patamar de relação comercial até esta conquista”, disse.
Formada em gestão ambiental em uma faculdade de Macapá, a extrativista é natural da Ilha das Cinzas, onde mantém uma vida dedicada à sua comunidade. Josi celebra a união dos estados do Amapá e do Pará para o fortalecimento de atividades sustentáveis na Amazônia, que geram renda familiar e autonomia para as mulheres.

Extrativistas no Centro das Mulheres do Maniva
“Os dois estados compartilham o majestoso rio Amazonas, que é a nossa principal via de transporte. No Marajó, nós estamos em uma região muito rica de saberes e cultura tradicionais, mas também é um lugar distante e de difícil acesso”, acrescentou.
A tecnologia empregada na agroindústria consiste em um sistema fotovoltaico off grid, que utiliza painéis solares instalados na unidade produtiva para gerar energia, eliminando a opção de uso de diesel, o que também reduz os custos. O excedente dessa produção é armazenado em baterias, garantindo eletricidade mesmo à noite ou em dias de menor incidência solar.

Josi Malheiros em cerimênia de inauguração da agroindústira
De acordo com Daniel Godinho, diretor de sustentabilidade e relações institucionais da WEG, o projeto do complexo foi idealizado exclusivamente para a região, pois não existia um modelo para operar em área alagável. O gestor destaca que diversas adaptações foram realizadas para o sucesso e segurança do funcionamento, que agora será replicado para outros lugares.
“A implementação deste sistema fotovoltaico reafirma o nosso compromisso com a sustentabilidade. Com esta iniciativa, a WEG demonstra na prática como suas soluções contribuem para a transição energética, oferecendo um modelo replicável para outras regiões da Amazônia e comunidades isoladas. Além disso, gerar valor agregado e promover o desenvolvimento local tornam esse trabalho ainda mais especial para nós”, destacou.
Para Angela Pinhati, diretora de sustentabilidade da Natura, a agroindústria, além de aumentar a renda dos extrativistas, proporciona mais ofertas de trabalho na comunidade, como a manutenção e cuidado com o sistema elétrico. Os moradores recebem capacitações para operarem as atividades, desde o processo de extração de óleo e manteiga das sementes até a parte elétrica.
“A entrega é também uma maneira de fortalecer nosso plano de industrialização sustentável na Amazônia e reconhecer o protagonismo das comunidades tradicionais na conservação da floresta em pé. Agora os jovens não precisarão deixar a sua comunidade em busca de trabalho”, finalizou