Por PEDRO PESSOA, correspondente do Portal SN em Belém
Um procedimento odontológico que deveria ser simples e de rotina terminou em dor, indignação e revolta para a família de Juliana Martins, de 19 anos, diagnosticada com autismo grau 3. Juliana necessita de alto nível de apoio em suas atividades diárias e interações sociais. A jovem foi levada a um centro público de reabilitação especializado no atendimento a pessoas com deficiência no bairro do Telégrafo, em Belém, para realizar uma limpeza dentária e, se necessário, uma restauração. No entanto, após o procedimento, os pais encontraram a filha com 17 dentes extraídos sob sedação, sem que a família fosse informada ou tivesse autorizado a intervenção.
“Minha filha foi levada para fazer uma limpeza. Nunca houve queixas de dor, ela escovava os dentes normalmente. Quando eu abri a porta da sala e perguntei ao dentista se tinha dado tudo certo, ele simplesmente respondeu: ‘extraí 17 dentes da sua filha’. Eu entrei em choque”, relatou Isabel Machado, mãe de Juliana.
A responsável pela jovem afirma ainda que sempre acompanhou os atendimentos odontológicos da filha, justamente por ela apresentar hipersensibilidade e não conseguir realizar os procedimentos sem anestesia. Na primeira tentativa, em 19 de maio, a sedação precisou ser interrompida por problemas na máquina de oxigênio do centro. Já neste mês de junho, um novo procedimento foi marcado. Um termo de autorização assinado antes do procedimento referia-se apenas à sedação, prática comum no acompanhamento odontológico da jovem.
“Assinei porque é o mesmo documento que eles pedem sempre. Não havia nada sobre extração. Ninguém me consultou. Minha filha foi mutilada”, completou a mãe.

A mãe Isabel: “foi uma mutilação”. Fotos: Pedro Pessoa

Izabella, irmã de Juliana: “violência institucional”

Juliana faria apenas uma limpeza
A irmã de Juliana, Izabella Martins, também denunciou o que considerou uma série de irregularidades por parte da equipe odontológica. Ao tentar acessar o prontuário da irmã, ela conta que foi impedida. Em reunião com a coordenação do centro, recebeu a justificativa de que a extração foi considerada necessária durante o procedimento, e que o profissional não poderia interrompê-lo para consultar a família.
“Minha irmã foi sedada. Não tinha como se manifestar. E mesmo assim decidiram tirar 17 dentes sem autorização. E depois ainda disseram que isso é prática comum em outros pacientes com deficiência. Isso é um absurdo. Isso é violência institucional. É mutilação”, desabafou Izabella.
BO e repercussão
A família registrou um boletim de ocorrência e procurou o Instituto Médico Legal para a realização de exame de corpo de delito. Informou também que vai apresentar uma denúncia formal contra o profissional responsável ao Conselho Regional de Odontologia, cobrando providências e apuração dos fatos.
O caso repercutiu nas redes sociais e chegou ao conhecimento do governador do Estado, Helder Barbalho, que se manifestou publicamente dizendo que determinou o imediato afastamento do profissional envolvido e a abertura de uma investigação para esclarecer o caso e reunir todos os responsáveis.

Unidade onde ocorreu o atendimento
O Conselho Regional de Odontologia do Pará também emitiu nota, afirmando que tomou conhecimento do caso e que se coloca à disposição da sociedade para investigar as denúncias. O órgão reforçou que qualquer processo ético contra o profissional envolvido depende de documentação formal que comprove as irregularidades.
Enquanto as investigações são conduzidas, Juliana, agora com a saúde fragilizada, enfrenta um doloroso processo de recuperação, tanto físico quanto emocional.
“Eu vou lutar não só pela Juliana, mas por todas as crianças e adolescentes que possam estar passando por isso. Isso não pode continuar acontecendo. Isso não é inclusão. Isso é abuso”, afirma a irmã.