Da energia fóssil à energia do conhecimento

Negar o petróleo poderia significar abrir mão dos recursos que viabilizariam a transição
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Por GUTEMBERG VILHENA SILVA, professor da Universidade Federal do Amapá

Na fronteira amazônica, o Amapá propõe uma resposta ousada ao dilema global da transição energética: usar o petróleo não como fim, mas como meio para financiar o próprio futuro sustentável. Cada vez mais conhecida pela população em geral, a Margem Equatorial Brasileira é uma extensa faixa marítima que se estende do Amapá ao Rio Grande do Norte, abrigando reservas significativas de petróleo e gás em águas profundas. Trata-se da nova fronteira energética do país, comparável ao pré-sal em potencial econômico, mas situada em um território de altíssima relevância ambiental — justamente onde se encontra uma das porções mais preservadas da Amazônia.

A Margem Equatorial ingressou no epicentro de um debate global: é possível usar o petróleo para financiar a própria superação do petróleo? A resposta que começa a emergir da fronteira amazônica é sim. Enquanto o mundo discute a descarbonização, a Margem Equatorial — onde o Amapá desponta como protagonista — propõe um paradigma sustentado: transformar o ciclo de exploração petrolífera em trampolim para a inovação científica, tecnológica e ambiental. A questão, portanto, não é mais “extrair ou não extrair”, mas como transformar essa riqueza em soberania energética e sustentabilidade.

Na prática, isso significa destinar parte da renda petroleira ao financiamento de laboratórios de pesquisa, centros de inovação e programas de proteção da biodiversidade — pilares de uma bioeconomia amazônica de escala, capaz de gerar valor a partir da floresta em pé. O petróleo, nessa visão, não é o inimigo, mas a ponte financeira e tecnológica que pode sustentar a transição justa rumo a uma economia de baixo carbono.

No Amapá — onde a França europeia se encontra com o Brasil amazônico — o desafio é criar modelos institucionais que unam soberania, ciência e justiça social. O estado, já reconhecido por manter 95% de cobertura florestal e por políticas públicas que conciliam inovação e conservação, assume agora o papel de ponta de lança de um novo modelo de gestão territorial.

Gutemberg Vilhena é professor da Unifap e presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa

O próximo passo é usar o ciclo energético que se aproxima como instrumento estratégico de transformação. Trata-se de um chamado à lucidez: negar o petróleo poderia significar abrir mão dos recursos que viabilizariam a transição. Governá-lo com inteligência, transparência e propósito, ao contrário, pode fazer do Amapá um exemplo mundial de como o Sul global financia sua própria revolução verde.

O futuro do Amapá não está em repetir o extrativismo do passado, mas em provar que é possível transformar o ouro negro em combustível para a ciência, a inovação e a sustentabilidade amazônica.

Gutemberg de Vilhena Silva é professor da Universidade Federal do Amapá e diretor-presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amapá (FAPEAP).

 

 

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