Por JORGE ABREU
Uma jovem de 21 anos deu à luz em uma ambulancha (embarcação usada para o transporte de pacientes) no rio Amazonas. Ela, em gravidez de risco, teve as primeiras contrações em Afuá (PA) e precisou de um atendimento de alta complexidade, o que exigiu transferência para Macapá.
Contudo, a situação não saiu como a mãe e a equipe de saúde esperavam. Durante o trajeto, o barco apresentou problemas na palheta do motor e ficou à deriva. Diante do imprevisto, a enfermeira Izane Pimentel Soares, de 40 anos, e o técnico de enfermagem Flávio Lima, de 27, tiveram que improvisar para salvar as vidas que estavam ali em risco.
O episódio ocorreu na segunda-feira (29), um dia que Izane nunca esquecerá. A enfermeira relata que a gestante deu entrada pela manhã na Unidade Mista de Saúde de Afuá com uma dilatação de 3 centímetros, e como a jovem fez apenas um exame de pré-natal sem ultrassom, a equipe decidiu encaminhá-la para a capital amapaense, onde teria um suporte mais adequado.
Inicialmente, a ambulancha partiria apenas com uma outra paciente que tinha acabado de dar à luz a uma menina que precisava de internação por apresentar complicações. Então, em cima da hora, a jovem gestante também foi levada. Quando o barco teve a pane, outro foi acionado para fazer o resgate do grupo, porém o bebê não pôde esperar mais.
“A paciente começou a entrar em trabalho de parto pélvico. Eu não tinha avaliado ela antes. Quando fui verificar, ela já tava realmente toda dilatada. A gente estava sem estrutura nenhuma. O processo ali foi muito difícil porque engatou o ombro e a cabeça, além do calor e do balanço do barco”, detalhou a enfermeira ao Portal SN.

Izane na segunda ambulancha a caminho de Macapá: só Deus
Posição do bebê
Izane explicou que o parto pélvico ocorre quando o bebê está posicionado com o bumbum ou os pés voltados para o canal vaginal, em vez da cabeça, o que complica ainda mais a saída. A mãe, por sua vez, ainda sofreu com atonia uterina, que é a falha do útero em contrair adequadamente após o parto, levando a uma hemorragia grave e potencialmente fatal.
“Só Deus mesmo para salvar a vida daquela mãe. Eu espero nunca mais passar por uma situação dessa. Foi desesperador. Eu tava com quatro vidas em risco, duas puérperas e dois RN [recém-nascidos]. Os bebês estavam em estado gravíssimo. Eu nunca presenciei, assim, um parto pélvico, que precisa de um suporte com médico e estrutura de UTI”, acrescentou.
O técnico de enfermagem Flávio Lima enfatiza que o bebê, nascido no barco, ainda precisou ser reanimado antes da chegada do segundo barco. De acordo com o profissional da saúde, a mãe perdeu forças durante o parto, o que levou a equipe fazer manobras de massagem. Quando o bebê saiu, estava desacordado.

Flávio: menino precisou ser reanimado
“Na ambulância, a gente tinha poucos recursos. Não era que nem um hospital. Então a gente fez ali o que podia para salvar a mãe e o bebê. A criança nasceu, mas demorou para chorar, porque ficou parada por alguns minutos. Ai nós tentamos reanimar o menino até que conseguimos”, lembrou.
Com a chegada do resgate, o grupo foi levado em segurança para Macapá e as mães e os bebês foram entregues à equipe do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu). Os pacientes, então, deram entrada no Hospital da Mulher Mãe Luzia. Para a enfermeira Izane e o técnico Flávio, a sensação foi de dever cumprindo.