Por PEDRO PESSOA, de Belém
Belém, fim de tarde. O caos calmo de uma cidade à beira do rio, vira cenário do ritual da cuia fumegante, da goma viscosa, da folha de jambu que anestesia os lábios e do caldo amarelo-ácido que abraça o paladar. É nesse instante que o tacacá deixa de ser apenas prato e se torna símbolo.
Entre tantas cuias servidas todos os dias, uma tem nome, história e herança: a de Neide Sobrinho.
“Tenho 41 anos, sou tacacazeira há mais de 30”, diz com orgulho.
“Aprendi com a minha avó. Esse é um empreendimento familiar que começou com ela, já tem mais de 75 anos de banca.”
A tradição que Neide defende nasceu muito antes das luzes de Belém. É herança indígena, mistura de tucupi, goma de mandioca-brava, camarão seco e jambu, ingredientes simples que, juntos, criam sabor e identidade. Cada tacacazeira tem seu toque, sua medida de goma, seu ponto de tucupi.
“Cada uma tem seu tempero. Há diferença até de banca pra banca. Qual é o mais gostoso? O meu, claro!”, brinca ela, entre risadas e a fumaça do tucupi.

Neide aprendeu com a avó…

…na banca que já existe há 75 anos
O ofício das tacacazeiras caminha para ser declarado patrimônio cultural imaterial do Brasil, um título que chega tarde para o que Belém já reconhece há séculos: o tacacá é um símbolo da cidade. Um sabor que conta história, que une o povo e que agora atravessa fronteiras.
Neide que o diga. Em janeiro, ela viajou ao Paraguai para apresentar o tacacá em uma demonstração internacional de culinária amazônica.
“Fui mostrar o nosso prato típico, o nosso carro-chefe. O tacacá teve muita visibilidade lá. Muita gente veio conhecer essa culinária tão única”, conta. Alguns provam com curiosidade, outros com receio.
“Muitos gostam, outros estranham, principalmente a goma. Mas depois acostumam… e pedem mais.”

Cardápio tradicional em português…

…ganhou versão em inglês e espanhol
Para atender os visitantes de longe, Neide até improvisou um “cardápio bilíngue”, com os pratos descritos em inglês e espanhol.
“Good morning, good night, thank you!”, diz ela na banca localizada na avenida Nazaré com a avenida generalíssimo Deodoro, no bairro Nazaré.
Agora, durante a COP 30, o tacacá ganhou ainda mais visibilidade, especialmente com turistas e jornalistas estrangeiros.

