Crônica, por SELES NAFES
É impossível não perceber o esforço, muitas vezes patético, dos candidatos para transmitir credibilidade no horário eleitoral. Tradicionalmente, os recursos de retórica mais utilizados nas propagandas são “Deus” e “povo”. Aqui no Amapá, este ano, esses dois substantivos ganharam a companhia de outras duas palavras: conta de luz.
O tema tem sido muito usado. Exaustivamente, eu diria. Tanto por candidatos ao governo, como ao Senado, deputado federal e estadual.
Na semana passada, num dos programas para deputado estadual, que também inclui as propagandas de Governo e Senado, baixar o preço da conta de luz foi o tema de 11 candidatos num intervalo de 30 minutos.
Detalhe: nenhum deles explicou como vai fazer para baixar a conta de luz. E tem sido assim desde o início da propaganda eleitoral, no dia 31 de agosto.
Desde que o Amapá foi conectado ao Sistema Nacional Integrado (SNI), em 2016, o Estado passou a exportar energia. Hoje, temos 3 hidrelétricas em pleno funcionamento, e em breve haverá a quarta, em Laranjal do Jari.
Com esse advento, o Amapá passou também pagar a conta de outros estados. Sempre que a produção de energia fica cara em outras partes do Brasil, geralmente por causa da geração térmica (óleo diesel), a bandeira tarifária entra no vermelho. Resultado: o alto custo para gerar energia em outros estados é dividido também entre os consumidores amapaenses.
Além desse fator, é preciso entender que a CEA ficou mais de 10 anos com a tarifa congelada por estar inadimplente com a Eletrobrás. Quando isso foi resolvido, deixaram a companhia promover reajustes sucessivos (e grandes) para recuperar o tempo perdido. O consumidor, naturalmente, sentiu.
“Baixar a conta”, como dizem os candidatos, não é tão simples assim. Seria necessário mudar a legislação, costurar uma ampla negociação com o Executivo e conquistar o apoio do próprio Congresso Nacional. E tem até deputado estadual afirmando que irá baixar a conta.
A luz é só um exemplo. Muito candidatos afirmam que irão gerar emprego, renda, aparelhar o sistema público de saúde, escolas e muito mais, mas sem dizer como pretendem fazer isso. Puro lugar comum e linguiça.
O eleitor de hoje, mesmo o mais humilde, não se convence mais tão facilmente. É preciso apresentar números, informações precisas que ilustrem a estratégia a ser utilizada.
Não é à toa que o Ibope, neste ano, tem registrado queda de até 26% na audiência da TV aberta em relação aos dias normais, apesar do crescimento de 14% em relação à eleição de 2014. Apesar de menos pessoas assistirem, ainda há público.
Mas o que convence o eleitor não é colocar a Bíblia debaixo do braço, mostrar o pôr-do-sol, crianças brincando, falar em Deus e no povo. E ainda tem os humoristas, que tentam convencer o eleitor sendo engraçados, como se o futuro das pessoas fosse resolvido com piada.
O tempo em que esse tipo de horário eleitoral convencia já passou.