Por MARCO ANTÔNIO P. COSTA
Pedro Ramos de Sousa não, Doutor Pedro Ramos. Aos 83 anos, o agricultor, militante e ser humano Pedro Ramos de Sousa, recebeu nesta quinta-feira (5) – pela primeira vez na história de uma universidade amapaense – o título de Doutor Honoris Causa, a maior honraria que uma pessoa pode receber da academia.
Esta qualificação é concedida apenas a pessoas de notório saber em determinada área da sociedade e do conhecimento. É como se a instituição de ensino superior, no caso a Universidade Estadual do Amapá (Ueap), nada tivesse a ensinar àquela pessoa sobre o assunto, reconhecendo seu saber.
Este é o caso de Pedro, que tem um extenso histórico na luta pela terra, sustentabilidade e preservação do meio ambiente no Amapá e, portanto, na Amazônia.
O título foi concedido através da aprovação no Conselho Universitário (Consu), após manifesto datado de janeiro de 2021 assinado por mais de 100 personalidades do mundo acadêmico, político e cultural do Amapá e de outros estados do Brasil que reivindicaram para ele a titulação.
Doutor Pedro emocionou-se e, mesmo com problemas de saúde – ele teve covid-19 e ainda sofre com as sequelas – compareceu à cerimônia realizada no hall da Ueap, no Centro de Macapá. Recebeu o capelo das mãos da reitora da instituição, a professora Kátia Paulino.
“O ato que estamos fazendo aqui, estou me sentindo honrado por isso. Quero agradecer essa honra com o melhor possível de mim, não é só agradecer, é retribuir com o melhor que possam extrair de mim e eu me entrego à disposição dos senhores e das senhoras para explorarem o que puderem de mim”, declarou Doutor.
Conhecimento popular
O professor Luciano Araújo, do Curso de Ciências Naturais, coordenou parte do processo da concessão do título. Ele afirmou que, cada vez mais, as universidades têm valorizado o saber e os conhecimentos de origem popular.
“É simbólico porque ele teve uma participação muito grande na criação das reservas extrativistas do Amapá, ele participou dos grupos de trabalho como representante das comunidades tradicionais, participou bastante das reuniões ministeriais em Brasília na década de 1990, depois da Constituição de 1988, quando isso começou a ser consolidado, ele participou muito ativamente desse processo. A universidade concedeu esse título, muito pelo notório saber dele em relação ao meio ambiente, à sustentabilidade e hoje, em todo o planeta, a academia considera que as comunidades tradicionais têm muito mais a ensinar sobre meio ambiente do que nós mesmos na academia, porque falamos de teoria, e eles fazem na prática as coisas”, declarou o professor.
Ribeirinho, preso político, agricultor e militante
Pedro Ramos de Sousa nasceu na Ilha dos Carás, município de Afuá (PA), no dia 27 de novembro de 1940. Estudou no Grupo Escolar Barão do Rio Branco e retornou à ilha de origem, onde, junto com os irmãos, iniciou sua militância política ao lado dos pescadores da região.
Em 1964, após o golpe militar, Pedro foi preso e levado para uma cadeia na sede do município marajoara, de onde conseguiu fugir oito dias depois, em uma jornada de quatro dias até Caiena, na Guiana Francesa.
De lá, retornaria apenas em 1970, se estabelecendo no oeste amapaense, na região do Água Fria, onde hoje fica situado município de Pedra Branca do Amapari.
Daí por diante Pedro mergulhou de cabeça na criação e direção de cooperativas extrativistas, movimentos de pequenos agricultores, sindicatos de agricultores, campanhas das Comunidades Eclesiais de Base (Cebs) da Igreja Católica e a luta pela reforma agrária.
Também foi parceiro e companheiro político de Chico Mendes, nos encontros e discussões sindicais e políticas dos agitados iniciais anos de 1980, quando também participou da fundação da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e do Partido dos Trabalhadores (PT).
Pedro Ramos, o agora doutor Pedro, é filho da luta por uma Amazônia melhor para o seu povo.