GESIEL OLIVEIRA
Quando eu era criança, uma das coisas que eu mais gostava de fazer era brincar em uma bicicleta velha com meu irmão. A bicicleta era tão velha que nem sequer tinha pneus, só o aro, mas mesmo assim descíamos e subíamos incontáveis vezes aquela ladeira em frente de casa. Tudo era sorriso.
Em casa faltava quase tudo, menos esperança, fé, união e amor. Eu era uma criança de 8 anos, e nem percebia os apertos financeiros que meu saudoso e falecido pai passava à época para cuidar, com seu único emprego, de 6 filhos e esposa.
Eu adorava subir na árvore em frente a minha casa, e subia até o último galho, onde eu pudesse colocar a minha cabeça acima das folhas daquela árvore e olhar o céu estrelado, sentir o vento frio no meu rostinho, ver as luzes da noite e ficar imaginando, sonhando em voar naquela imensidão de céu.
Eu fechava meus olhos e sonhava em ter uma bicicleta nova, uma lancheira pra levar à escola, um sapato só pra mim que eu não precisasse dividir com meu irmão. Sonhava em chupar uma lata de Leite Moça sozinho, e ter um bom carrinho de rolimã só meu.
Lá de cima daquela árvore eu ficava observando os aviões que partiam do aeroporto. Eu mesmo construí uma casinha de madeira no alto daquela árvore, e ficava observando os aviões até eles desaparecerem da minha visão. Ah, como eu queria ser piloto.
Eu só descia daquela árvore quando a minha mãe me chamava para o jantar e para dividir a pouca farofa de ovo com todos os meus irmãos. Eram tempos de “overnight” e de inflação galopante, mas eu nem sabia o nome do presidente do Brasil, muito menos entendia de crise financeira ou compreendia seus efeitos.
Eu era movido pela esperança da inocência dos mais puros instintos de uma criança sonhadora. Na verdade, eu não conseguia ver nada além da vida de uma criança muito feliz e bem amada. Um menino, de olho brilhantes, gordinho, sorridente, sapeca e feliz, que viveu uma infância num lugar pobre, mas que pra mim era um pedaço do céu.
Tem horas que eu me ponho a relembrar de tudo aquilo, e custo a acreditar que muitos personagens dessa minha historinha feliz já nem mais estão entre nós. Mas às vezes tenho a impressão que essa realidade ainda existe em um universo paralelo que está ao alcance de um piscar de olhos, que está ao alcance de uma memória viva e colorida que persiste em sobreviver em minha mente. A vida segue, mas as memórias boas permanecem.