ANDRÉ SILVA
Três anos depois do grande incêndio que devastou uma área com 250 casas no Bairro Perpétuo Socorro, na Zona Leste de Macapá, muitas famílias ainda amargam a dura realidade de morar em boxes na Feira da Ana Nery. A área, localizada no fim da Avenida Pedro Américo, está abandonada e fica ao lado do local onde o fogo se alastrou. No mesmo lugar em 1997, aconteceu um primeiro incêndio nesse perímetro.
O local é insalubre. Existem boxes que chegam a abrigar cerca de 15 pessoas de uma mesma família. Outros são ocupados por uma ou duas pessoas. As necessidades fisiológicas são feitas em um único local por quase cinquenta pessoas. Um banheirinho de madeira com apenas um vaso sanitário.
Entre os desabrigados está a dona Antônia de Sena (foto destaque), de 97 anos. Ela nasceu na Ilha Viçosa, no município de Chaves no Pará. Junto com o marido, chegaram no Amapá há mais de 60 anos. Dona Antônia é viúva e não tem filhos. Quem cuida dela é uma sobrinha. A idosa conta que esse é o segundo incêndio que ela enfrenta no mesmo lugar.
“A primeira casa que eu tive aqui queimou. Essa é a segunda vez que isso acontece comigo. Se nós tivéssemos uma casa… Estamos aqui há três anos e um mês”, disse com dificuldade.
Ela toma banho na casa de uma vizinha que mora ao lado da feira e faz as necessidades fisiológicas dentro de uma vasilha. A sobrinha, Maria de Jesus Monteiro, de 45 anos, é quem cuida da idosa.
Ela disse que a promessa era que elas iriam ocupar um apartamento no conjunto Macapaba, mas até agora, depois de sorteios realizados, a família não conseguiu um apartamento.
“Nós estamos esquecidas aqui. Nem a nossa família mais apareceu. Primeiro nós iríamos para o Macapaba I, nada; depois para o Oscar Santos, nada; depois o São José, nada. Agora estão dizendo que vamos para o Macapaba II. Eu já estou descrente”, desabafou a mulher desabrigada.
“Três anos e um mês faz amanhã. Eu sou um dos pioneiros aqui nessa baixada. Todo mundo me conhece. Um dia desses nós tentamos voltar para dentro do terreno, há duas semanas, mas a Guarda Municipal veio e nos tirou de novo. Paguei um ano de IPTU. Estou jogado nesse boxe”, relatou Orlando da Paixão, de 49 anos.
Os moradores formaram uma associação para representar as pessoas vítimas do incêndio. Um dos representantes ao ver a reportagem desabafou:
“Todo dia nós somos revistados pela polícia. Eles pensam que todos que moram aqui são bandidos. Cheguei a pagar mais de dois anos IPTU. Eu tinha acabado de chegar em casa quando o incêndio começou. Os meus filhos acharam que era pneu pegando fogo. Foi muito rápido”, contou com lágrimas Idelza da Silva, 46 anos. Ela mora com dois filhos em um boxe.
Ela conta que já participou de várias audiências na Promotoria da Cidadania do Ministério Público estadual, mas sem nenhum resultado. Todos se queixam do atraso no aluguel social pago pelo Governo do Estado.
Outros moradores
Além das famílias vítimas de incêndio, tem outras que trabalhavam no local e resolveram ocupar depois que ele foi invadido. Uma delas é Leonete Amoras da Silva.
Ela respira por meio de uma traqueostomia, e o marido Raimundo de Sousa Gonçalves, vive deitado em uma rede porque sofre de esclerose múltipla. O casal já participou de sorteio por um apartamento no Residencial São José, mas não foram contemplados.
O nome dela foi aprovado na primeira e na segunda lista, mas não conseguiram um apartamento. Ela não sabe que critério foi usado, já que as pessoas com deficiência são prioridade no sorteio.
“Estou desde 2009 tentando um local para morar. Passei nas duas listas e nada. Agora estou esperando um apartamento no Açucena”, contou a mulher.
Na inauguração de um estação de tratamento de água, no Conjunto Macapaba, na Zona Norte de Macapá, esta semana, o governador Waldez Góes (PDT) anunciou que um dos grupos que terão prioridade para ocupar os apartamentos seria o de pessoas vítimas do acidente. Enquanto a promessa não se cumpre, as famílias seguem sobrevivendo um dia de cada vez.