WASHINGTON PICANÇO, advogado
“A Mãe” é uma história revolucionária em todos os sentidos. Talvez nunca o espírito revolucionário tenha sido expresso de uma forma tão pungente, sincera e romântica. Diria mesmo, de uma forma tão ingênua, em todo o bom sentido que este adjetivo pode ter.
Escrito e publicado em 1907, este romance descreve em pormenor a desgraça, a tristeza e a miséria em que vivia o povo russo no tempo do czar Nicolau II. É entre essa miséria que emerge um grito lancinante de revolta, o grito profundo das almas feridas que arrancará a esperança das profundezas da injustiça.
Um grupo de jovens operários desperta para as ideias bolcheviques e encara-as como a solução para pôr fim à miséria e à injustiça de que eram vítimas os operários e camponeses russos.
Mas essa revolta que se sonha é encarada como um movimento universal, capaz de libertar todos os injustiçados do mundo. É nesse sentido que se trata de uma mensagem ingênua. Essa mensagem não encerra em si qualquer ambição de poder. Pelo contrário, o que se pretende é acabar com o poder como forma de opressão.
Pavel é o mais brilhante desses jovens. Mas, por trás dele, ou melhor, ao lado dele, emerge a força imensa de uma mulher: a sua mãe, Pelágia.
Sinceramente não faço a mínima ideia se Gorki conhecia a história da Península Ibérica, mas o certo é que este nome é semelhante aquele que é considerado um dos maiores guerreiros da história ibérica: Pelágio, primeiro rei das Astúrias, herói da resistência e guerra aos muçulmanos na reconquista cristã.
Seja como for, Pelágia é a grande guerreira, que sofre em silêncio todas as vicissitudes de uma mulher pobre na Rússia czarista: vítima da miséria, mas também de um marido bêbado e violento. Até que ele morre e Pelágia passa a seguir o caminho do filho na senda da revolução.
Pelágia sente-se a mãe de todos os revolucionários; a mãe da revolução. Neste aspecto, Gorki estabelece um curioso paralelismo entre o amor maternal e uma espécie de amor universal que comanda a mente e a ação destes revolucionários; uma espécie de “amor ao próximo”, ao fim e ao cabo. Aliás, é bem clara a proximidade entre este comunismo nascente e o verdadeiro espírito do cristianismo.
Esta pureza do ideal revolucionário fica bem clara nesta ideia: não devemos derramar sangue dos inimigos porque ele envenenará a terra; o nosso sangue, pelo contrário, quando derramado, purificá-la-á.
No entanto a luta irá, mais tarde ou mais cedo, desencadear a violência, quando o ódio vencer. E ele vencerá mais tarde… dez anos após a publicação desta obra, Lenin liderará, finalmente, a Revolução. E, mais tarde, Stalin encarregar-se-á de a manchar com todos os crimes.
Bem, já escolhi o presente que darei a minha mãe e com certeza é uma boa sugestão aos amigos de leitura e de presente neste festivo domingo.
Inicio com este texto minhas homenagens ao Centenário da Revolução Russa de Outubro de 1917.