Macapá: cidade sem “sebos” e sem leitores?

Ausência de sebos, poucas livrarias, bibliotecas vazias. Somos uma cidade não-leitora?
Compartilhamentos

ÁGORA, coluna de JÚLIO MIRAGAIA

Durante os sábados do mês de janeiro, ajudei minha amiga, Alline Costa, em sua campanha de doação, troca e venda de livros na Praça Floriano Peixoto. De família amapaense, Alline é estudante de medicina em Rosário, na Argentina, e sempre vem passar o fim e o começo do ano na terra natal. Ela aproveita o tempo livre e toca a iniciativa desde o ano passado.

Ao fim do projeto, parte das obras arrecadadas é doada para a biblioteca de uma escola pública. A feira de leitura na praça é uma iniciativa que tem rendido boas conversas com leitores e mostrado o contrário da indagação do título desta crônica: Macapá é uma cidade de leitores.

Confiabilidade baixa no conteúdo web: uma das possíveis motivações para procura pelo livro impresso. Fotos: Júlio Miragaia

Feira de troca, venda e doação de livros está na segunda edição

Paradoxalmente a essa afirmativa, mesmo com um considerável público de pessoas que busca no “livro usado” leituras a preços mais acessíveis e raridades que estão fora dos circuitos das grandes livrarias e editoras, dificilmente se encontra em nossa capital quem empreenda tal atividade.

Vivemos o tempo da cultura digital, e com ela grande parte dos conteúdos escritos foram parar nessa plataforma. Porém, esse tecnológico momento não conseguiu, pelo menos ainda, inviabilizar o livro impresso. As razões são várias: a imprecisão de informações na internet por conta das “fake news” e conteúdos adulterados, falta de confiabilidade no conteúdo online, o conservadorismo dos leitores que preferem um material em mãos do que no tablet, no smartphone ou no notebook, e etc.

Sebo Online Macapá: empreendimento no Instagram de troca e venda de livros

Nesse momento histórico, da internet como ponto de referência e acesso ao conhecimento, há outros fenômenos dignos de nossa atenção: as bibliotecas não mais como referências para pesquisa e o esvaziamento de publicações nas bancas de revista. Outro fato relacionado com a leitura que chama atenção é que em Macapá, apesar da existência de jornais impressos, os mesmos acabam não sendo referência de acesso às informações, como a internet e o rádio, por exemplo.

Faço essas afirmações com alguma imprecisão, mas observando a falta de projetos e visível esvaziamento de nossa única biblioteca pública.

Os sebos também estão ausentes em nossa cidade. Recordo somente de um que havia há mais de dez anos na Tiradentes, no Centro. Pelas redes sociais, vemos pouquíssimos projetos, como o Sebo Online Macapá, no Instagram.  

Livrarias migraram para shoppings nos últimos anos. Foto: reprodução

Creio que o sebo tem uma importância para além do que se imagina. É um espaço mais democrático que as livrarias tradicionais que hoje, em sua maioria, estão instaladas dentro dos shoppings. Para além do sebo, carecemos de projetos, como os da Alline, que adentrem nos bairros da cidade e incentivem a formação de novos leitores.

A leitura de bons livros não pode de forma alguma ser um privilégio para a classe média alta em diante, que sabe onde encontrar suas obras favoritas. Deve estar ao alcance dos jovens das periferias, nas escolas, nos espaços comunitários, para que descubramos novos talentos e, principalmente, formemos uma sociedade mais crítica e que enxergue na educação uma alternativa para construirmos uma cidade melhor, menos violenta e que acesse o direito fundamental estabelecido no poema de Eduardo Galeano: o direito a sonhar.

Deixo no encerramento desta crônica os versos do escritor uruguaio, alimentando a esperança de que é possível trabalhar pela formação de novos leitores.     

Seles Nafes
Compartilhamentos
Insira suas palavras de pesquisa e pressione Enter.
error: Conteúdo Protegido!!