Brenda, entre a compaixão e o descaso

Diagnosticada com retardo mental, a adolescente cresceu entre pacientes em surto, e passa por um drama parecido com o de outras pessoas sem tratamento adequado
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SELES NAFES

Em 18 anos, Brenda nunca teve um lar. Negra, pobre e com transtornos mentais, foi logo abandonada pela família, e passou a viver internada em instituições, entre um surto e outro.

Depois de passar alguns anos morando na Clínica de Psiquiatria do Hospital Alberto Lima (Hcal), em Macapá, a menina passou a receber a ajuda de voluntários.

Como ela é incapaz e não tem parentes para receber o benefício, servidores, sensibilizados com a situação dela, é que tiram o aluguel de R$ 350 dos próprios bolsos para mantê-la sob um teto digno.

Com o dinheiro, uma quitinete foi alugada para ela no Bairro do Perpétuo Socorro, na zona leste de Macapá. Brenda ganhou um colchão e um ventilador de funcionários da Psiquiatria e do CAPS. Seria um recomeço, mas durante toda a vida ela não teve que lhe ensinasse a ter cuidados com higiene e com a casa.  

Quitinete onde Brenda está morando: colchão e ventilador doados para recomeço. Fotos: Movimento Anti-manicomial

Brenda teve uma vida institucionalizada. Ficou um tempo na Casa da Hospitalidade (em Santana), e há uns cinco anos foi morar na Psiquiatria. A adolescência dela, a formação da personalidade, todas as referências foram com pessoas em crise, mesmo ela não sendo uma paciente psicótica. Brenda foi diagnosticada apenas com um retardo mental.

Os psicólogos que acompanham o caso dela, garantem que se tiver um apoio social e familiar, ela pode ser estimulada e ter uma vida normal.

Além de Brenda, outros 10 pacientes, muito mais graves que ela, passam pela situação. Há pacientes com surtos violentos. Em dois casos, uma mulher mutilou com uma faca a própria vagina e precisou passar por uma cirurgia. Em outro episódio, o paciente em surto tentou arrancar um dos olhos com as mãos.

Esses pacientes estão vivendo em dois lugares: Centro de Custódia do Zerão, onde ficam presos os servidores públicos acusados de crimes, e na Clínica de Psiquiatria. Alguns já cumpriram penas, e já deveriam estar soltos para continuação do tratamento.

Residência terapêutica

Como os manicômios são proibidos no país desde os anos 1980 (hoje, inclusive, é o Dia Nacional de Luta Anti-manicomial), a Psiquiatria do Estado seria classificada como manicômios se aumentasse a quantidade de leitos para internação. Mesmo assim, há pacientes que vivem lá há vários anos.

Institucionalizada, Brenda se sente melhor na Psiquiatria

A assistência a pacientes mentais é uma obrigação das prefeituras. Em todo o país, existem 400 residências terapêuticas, casas que funcionam como abrigos e que forneçam tratamento psiquiátrico e assistência social.

No ano passado, depois de uma provocação do Ministério Público, o governo do Estado se comprometeu em assumir a contratação de 10 técnicos que farão os acompanhamentos. Coube à prefeitura apenas alugar uma residência de R$ 1,2 mil com três dormitórios.

As contratações foram autorizadas pela Secretaria de Saúde do Estado, mas a prefeitura, um ano depois, ainda não alugou a residência.

Enquanto isso, Brenda não quer mais morar no mundo novo que é viver sozinha, por conta própria. Institucionalizada, o desejo dela é voltar logo para Clínica de Psiquiatria do Hcal.

A prefeitura de Macapá prometeu um posicionamento sobre o aluguel da casa ainda nesta sexta-feira (18).

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