“É preciso vivenciar o luto para a dor virar saudade”, diz psicóloga que atua em velórios

Ruth Lobo é especialista em conversar com parentes que acabaram de perder alguém muito querido
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SELES NAFES

A sensação de cair num poço muito profundo e escuro quando alguém amado morre é o sentimento que toma conta da maioria das pessoas. Enquanto alguns se curam rapidamente e aceitam a perda, outros se fecham internamente e levam uma vida inteira se inconformismo, e sofrem sem saber a razão.

A psicológica Ruth Lobo, da equipe de acolhimento do Cemitério Parque Coração Eterno, no Distrito do Coração, diz que é preciso chorar, deixar desaguar todo o sofrimento.

O Portal SN conversou com a psicóloga, que ajudou a preparar um receptivo com música e uma roda de conversa entre parentes neste Dia de Finados.

O que você diz para os parentes nesses momentos antes do sepultamento, em que todos estão tristes?

A primeira coisa é permitir que a pessoa vivencie sua dor. Ela está ali num momento muito delicado, e a gente coloca um ambiente confortável, entregando para ela uma tranquilidade para ela chorar. A gente diz que ela deve chorar o que for necessário. Não esconder e nem camuflar.

Quando a pessoa não chora ou não se permite vivenciar a dor o que pode acontecer?

Ela está postergando esse sofrimento que está estagnado agora, mas depois de algum tempo ele surge mais forte e a pessoa talvez nem saiba explicar essa tristeza. Por isso, é melhor vivenciar logo para não sofrer depois. Algumas pessoas têm essa ferramenta de se privar de sofrer naquele momento para ser forte e ajudar as outras pessoas, mas acaba se prejudicando internamente.

Ruth Lobo ao lado do “descendor”: é preciso chorar. Fotos: Seles Nafes

Então a pessoa não consegue virar a página depois?

Isso. Ele acaba não vivenciando o luto, o que pode refletir até em conflitos e brigas conjugais.

As pessoas que você atende aqui no cemitério normalmente aceitam a perda?

Aceitam. O luto é limitado ao tempo que transforma a dor em saudade.

Hoje, no Dia de Finados, muitas famílias se reúnem em torno das sepulturas. Muitos parentes que não se viam até se reencontram. Interessante isso…

Muito. As pessoas se reencontram e passam o dia conversando, descobrindo coisas da vida do outro. Estão vivenciando a saudade, mas celebrando a vida, comemorando aquele parente que se formou (na faculdade) e você não sabia. Tem aquelas piadas e acabam retomando a memória afetiva. Outras pessoas até estranham quando se deparam com parentes sorrindo num velório ou lado do túmulo, mas aquelas pessoas sorrindo estão vivenciando um luto, e celebrando a vida. A vida se torna até mais presente porque ela é um fio, e quando a gente perde esse fio a gente se reaproxima ainda mais das pessoas.

Capela no cemitério parque: acolhimento com carinho

Parentes recepcionados por violonista no Dia de Finados do Cemitério Parque Coração Eterno. Foto: Divulgação

 

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