EDITORIAL
A negativa do juiz Fábio Santana, da 1ª Vara do Juizado Especial Cível de Macapá, para que matérias fossem apagadas do Portal SelesNafes.Com foi mais uma prova de que a justiça do Amapá garantirá sempre o direito legítimo de informar, desde que não haja exacerbação, como temos visto nas redes sociais.
O processo julgado no último dia 8, onde um investigado e condenado por estelionato exigia a retirada de reportagens, não foi a primeira e nem será a última tentativa de calar o site e outros jornalistas por meio do Judiciário. Nos últimos 5,6 anos, o portal e o jornalista Seles Nafes foram alvos de ações judiciais parecidas e de ataques pelas redes sociais que também viraram processos contra os agressores.
Os ataques acontecem porque alguns poucos internautas ainda desconhecem a diferença entre liberdade de manifestação e os crimes de calúnia e difamação. Ou simplesmente sabem, mas acreditam que não serão alcançados pela justiça.
Opinar dentro do tema abordado por uma reportagem é essencial. O contraditório é o verdadeiro sentido da democracia. Mas quando falta argumento e entram os xingamentos e ofensas, a lei passa a assegurar outros direitos, como o de reparação do dano e até a prisão. A Constituição protege a opinião, mas não ameaças e ofensas.
“As pessoas precisam entender que liberdade de expressão não é uma carta branca para ofender e nem destruir a reputação de ninguém”, explica o advogado criminalista Pablo Nery.
Direito de informar
O exercício da atividade jornalística é assegurado pelo direito constitucional de informar, mas nem todos entendem assim.
Em 2018, a suplente de deputado federal, Patrícia Ferraz (Pode), não compareceu à audiência e teve arquivado o processo movido por ela. Patrícia pedia que fosse deletada do Portal SN uma reportagem sobre a exoneração dela de um cargo no governo federal.
A demissão ocorreu em 2016, em pleno governo Temer. Patrícia apresentou um atestado médico ao Ministério da Saúde e logo em seguida viajou para a Espanha, onde fez selfies em passeios por Madri e publicou em suas redes sociais.
Após a repercussão do passeio em plena licença médica, ela foi demitida, e dois anos depois, em ano eleitoral, ela processou o portal SN afirmando que a reportagem atrapalhava sua campanha para deputada federal.
Em 2016, o médico Ednaldo Gusmão tentou a retirar a reportagem que mostrava que ele saiu de seu posto de trabalho, numa unidade de saúde, e deixou os pacientes sem atendimento. Ele também pediu uma indenização de R$ 20 mil. O médico chegou a ganhar em primeira instância, mas o processo foi arquivado na análise do recurso.
Neste caso, assim como em outros, os juízes da Turma Recursal entenderam que houve apenas o relato de fatos, e que o direito de informar foi exercido pelo Portal SN.
No ano passado, a justiça negou pedido a José Azarias de Macedo. Ele tinha sido preso por se passar por um estudante de psicologia que se apresentou em uma escola infantil para estagiar. A reportagem mencionou que já tinha sido investigado por estupro em 2013.
Na audiência de instrução, a advogada disse que a reportagem havia destruído a reputação de seu cliente, e que, por isso, ele estava tendo dificuldades para conseguir emprego. Todos os pedidos foram negados.
Outros processos foram vencidos pelo Portal SN, como na ação movida por Gilvam Borges. Ele processou o portal por uma reportagem que mostrava quanto o MDB tinha recebido em doações da JBS. Ele era o presidente do partido, e, em vez de se defender, fez ataques pessoais em suas redes.
Acabou sendo processado criminalmente e condenado por calúnia e difamação. Ele também terá que pagar indenização após condenação em ação cível.
O mesmo ocorreu com o médico Raimundo Ubiratan Picanço, conhecido no Twitter como “RupSilva”. Ele foi condenado criminalmente por proferir ofensas pessoais quando uma reportagem mostrou a prisão de um filho dele numa operação da Polícia Federal.
Anonimato
Mas o caso mais emblemático, que mostrou que a internet não era terra sem lei e que o anonimato não protege o agressor, envolveu o ex-candidato a vereador pelo PSB e empresário, Jeferson Sampaio.
Ele se identificava no Facebook como “Black Bloc Amapá”, e se escondia por trás do codinome para atacar diversas pessoas. Depois que a justiça determinou que o Facebook revelasse a identidade do dono do perfil, ele foi processado e condenado em duas instâncias. No decorrer do processo, ele também reivindicou a liberdade de expressão.
Além de ser obrigado a retirar todas as postagens ofensivas do ar, também foi obrigado a pagar indenização por calúnia e difamação. Ele chegou a recorrer, mas também perdeu.
Atualmente, o jornalista Seles Nafes move cerca de 20 ações por calúnia e difamação contra pessoas que ainda não entenderam que a tão falada liberdade de expressão tem limites, e que o principal marco nessa fronteira é a honra e a dignidade.