Catatau: o assassinato do fliperama de 1991

O jovem que gostava de jogar videogame e queria seguir carreira militar foi morto por engano aos 20 anos de idade. (Foto: Reprodução))
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Por MARCO ANTÔNIO P. COSTA

No dia 6 de dezembro de 1991, um assassinato marcou uma família e toda uma geração de jovens macapaenses. Lucivaldo Ferreira Damaso, o Catatau, foi morto aos 20 anos de idade, com um tiro de um revólver 22, dentro de um fliperama onde os jovens do centro de Macapá costumavam se reunir.

Vinte e nove anos depois, o Portal SelesNafes.Com reconta essa história lembrando os passos do jovem que gostava de videogame e queria seguir carreira militar.

Calmo e de poucas palavras, o jovem havia acabado de dar baixa do serviço militar. (Foto: Reprodução)

Quem era Catatau?

Lucivaldo tinha acabado de dar baixa de seu serviço militar no Exército Brasileiro. Segundo sua mãe, era um jovem calmo, de poucas palavras, e era o companheiro dela para fazer as compras do mercado. Era muito querido pelos amigos. A família morava na avenida Cora de Carvalho e a moçada da mesma idade e do mesmo perímetro – no centro de Macapá, desde a avenida Coaracy Nunes até à avenida Presidente Vargas – tinha o costume de se juntar, seja para brincadeiras de rua, jogar futebol ou videogame, hábito conquistado durante os anos anteriores.

Depois da sua baixa no Exército, queria continuar a seguir a carreira militar. Lucilda Ferreira Damaso, a mãe que hoje tem 79 anos, aposta que hoje ele seria policial militar, como o irmão, que é major.

Catatau era apelido de infância, por causa do personagem do desenho animado americano de Willam Hanna e Joseph Barbera. Sua mãe o achava mais parecido mesmo com Topo Gigio, um personagem de um desenho italiano que tinha orelhas bastante sobressaltadas. Eram apelidos comuns da época.

Catatau era o companheiro de sua mãe nas compras do mercado. “Ele andava de braços dados comigo”, lembrou a mãe. (Foto: Reprodução)

O fliperama e o assassinato

O ano era 1991, mas a aura imperante ainda era toda dos anos 1980. Ainda não havia os videogames em consoles disponíveis em locadoras por hora, o que se consolidaria anos mais tarde, então a opção eram os jogos em arcade, onde se jogava por ficha.

O fliperama fez a cabeça da juventude da época. Ficava na avenida Presidente Vargas, entre as ruas São José e Tiradentes, onde hoje funciona parte do Vila Nova Shopping.

Neste dia, 6 de dezembro de 1991, entre as 16h30 e 17h, um jovem entrou no fliperama e atirou em Catatau pelas costas. Catatau sequer chegou a ver seu algoz, que segundo vários relatos estava na primeira máquina, logo na entrada, jogando Tartarugas Ninja. O tiro foi na nuca e o atirador saiu logo depois do disparo em uma bicicleta.

Catatau foi levado ao pronto socorro de carro por uma pessoa que o conhecia. O irmão, Antônio Ivaldo Ferreira Damaso, major da PM hoje, com 50 anos, falou sobre o socorro.

“Cheguei [no HE] e falei que era irmão do Lucivaldo. Passaram-se uns cinco minutos e veio um médico informando que ele tinha vindo a óbito. Aí na hora veio uma mulher lá de dentro gritando que ele tinha dado sinal de vida de novo, foi aí que foram subir com ele. Aí estava na porta, comecei a chorar, e uma hora depois informaram que ele não tinha resistido”, contou Antônio.

No dia 6 de dezembro de 1991, entre as 16h30 e 17h, um jovem entrou no fliperama e atirou em Catatau pelas costas. (Foto: Marco Antônio P. Costa)

Morto por engano e crime impune

Catatau morreu por engano, por estar no local errado, na hora errada. Dias antes, uma briga selaria o destino de Catatau.

Seco, alcunha de um jovem morador da Rua Tiradentes que jogava basquete, havia brigado e batido em jovens do Bairro do Trem. Na época, era comum a imitação das gangues que se espalhavam nas grandes capitais, gerando grande acirramento entre jovens da Baixada do Japonês, com os jovens do Trem e da Vacaria (atual Santa Inês), por exemplo.

O irmão e a mãe confirmam que Catatau foi confundido com o Seco. O assassino, segundo o irmão, se chama Derlei Figueira Nunes.

“O Seco estava jogando lá no play game. Aí os moleques chegaram com o Derlei, que estava bebendo na Praça da Conceição e falaram: olha, o moleque que te deu porrada tá lá no fliperama. Aí ele emprestou a arma de um moleque que estava na praça com ele e foi pra lá. Só que ele desceu, o Seco já tinha ido embora e o meu irmão estava de costas, e eles realmente eram muito parecidos, aí o cara estava chapado, e deu o tiro, bem de perto” lamentou o irmão.

Derlei se entregou à polícia dias depois. A mãe de Catatau diz que lhe contaram que ele não tinha paz. O irmão apenas relata que ele se entregou após saber que tinha matado por engano. O jovem era de família humilde e de boa índole, mas tinha enveredado por um mau caminho. Não ficou preso, pois era menor de idade e, após ser solto, menos de um mês, a família o mandou para fora do Amapá.

“Eu não acreditei. Só quando eu cheguei na rua de casa e vi o tanto de gente que entendi. Daí desabei”, conta a mãe de Catatau. (Foto: Marco Antônio P. Costa)

A dor de uma mãe

De toda a história, o lado que mais sente é o da mãe. Conversamos com Dona Lucilda por horas e seu amor pelo filho tem uma fortaleza incólume, inacreditável. No dia da sua morte, estava em Castanhal, no Pará, por causa de tratamentos de saúde. Ela contou que no dia sentiu-se muito mal desde muito cedo.

Não almoçou, banhou-se e tomou um calmante para tentar dormir. Quando lhe chamaram, ela já desconfiava.

“Mataram o Luiz [outro filho] no vídeo game”, ao que ela apenas respondeu que não, que tinha sido Lucivaldo, o Catatau. Ela conseguiu vir para Macapá no mesmo dia e disse que ao chegar no aeroporto abraçou Antônio e perguntou se era verdade.

“Eu dizia que ele ia ser a minha bengala e a vida me deu uma rasteira”, lamenta Dona Lucilda. (Foto: Marco Antônio P. Costa)

“Assim, não sei explicar, vai que fosse uma brincadeira, não sei. Ele me abraçou e disse que infelizmente era verdade. Mesmo assim, coração de mãe é assim, eu não acreditei. Só quando eu cheguei na rua de casa, de madrugada, e vi o tanto de gente na frente, que entendi. Daí desabei e nem sei mais”, relembrou, com pesar, a mãe de Catatau.

Ela garante que sua vida nunca mais foi a mesma. Fala várias vezes que seu filho era maravilhoso e que não fala isso porque ele morreu. Ela conta que este é o mesmo testemunho de todos que o conheceram.

“Ele andava de braços dados comigo. Todo mundo gostava dele. A gente se engana muito com a vida. Eu dizia que ele ia ser a minha bengala e a vida me deu uma rasteira. Eu não esqueço dele nunca. Meu filho está vivo na minha memória e eu fico esperando ele”, desabafou, saudosa, a mãe de Catatau, filho e amigo querido.

“Eu não esqueço dele nunca. Meu filho está vivo na minha memória”, conta saudosa dona Lucilda. (Foto: Marco Antônio P. Costa)

Seles Nafes
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