Afinal, por que tem tanto amapaense indo para o Sul?

Zelindo com a família em Florianópolis: emprego, segurança e assistência à saúde estão entre os principais motivos
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Por MARCO ANTÔNIO P. COSTA 

Virou lugar comum que o amapaense tenha um conhecido, amigo ou parente que, nos últimos anos, deixou o Estado para aventurar-se no Sul do país, notadamente, em cidades dos estados de Santa Catarina e do Paraná.

A busca por emprego, saúde, segurança, serviços de qualidade no geral e perspectivas de vida melhores, estão na origem deste processo. Conversamos com alguns amapaenses que estão morando nestes estados para contar um pouco de suas histórias e fazer um recorte desse fenômeno.

Migração

Fluxos migratórios são parte dos processos históricos de formação de qualquer país. O Amapá mesmo, é fruto um pouco dos períodos dos “soldados da borracha” vindos do Nordeste e, em outra época, da vinda de paraenses e cariocas quando da fundação do Território Federal do Amapá, para pararmos nestes dois exemplos.

A migração atual de amapaenses (também de paraenses) para cidades catarinenses como Florianópolis, Joinville,  Blumenau e Brusque, e paranaenses como Curitiba e Londrina, dentre outras, ainda não consta nos números no IBGE, isto porque os fluxos migratórios são medidos nos censos que ocorrem de dez em dez anos e apenas em 2021 teremos maior exatidão sobre a envergadura do processo, mas seu tamanho – que deve seguramente passar de um milhar de amapaenses -, não deixa de ser notório e relevante. 

Por que estão indo embora?

Há diversas histórias e quase todas elas têm origem em uma palavra: emprego. Mas os relatos que dão conta de uma série de fatores que se entrelaçam, como a qualidade da saúde e segurança pública, educação e lazer.

Qualidade de vida e muita vontade de trabalhar

Este é o caso de Zelindo Viana Figueiredo, macapaense de 36 anos, que está morando em Florianópolis. Sua filha tem fibrose cística, uma patologia que não tem tratamento, centro de referência, em Macapá. Zelindo é enfermeiro e conseguiu emprego cerca de um mês depois de chegar à Florianópolis.

“Emprego tem, basta a pessoa querer trabalhar. A diferença é a seguinte: aqui não tem corpo mole, ou você trabalha, ou você trabalha” declarou o enfermeiro. 

Mas ele também elogia outros elementos. O transporte público é um deles e, andar de ônibus na “Ilha da Floripa”, é bom, afirma Zelindo.

O passageiro anda em ônibus novos, até com carregador para celular e também paga apenas uma passagem para circular nos coletivos na cidade inteira, por causa do sistema de terminais de integração, uma antiga promessa que sempre ressurge em campanhas eleitorais de Macapá.

“É uma capital bem segura de se viver. São bem poucos os casos que tu ouve de homicídio. É um a cada três meses e geralmente esses homicídios são entre pessoas que praticam atos ilícitos”, contou Zelindo.

Quanto ao Amapá, ele torce pela melhoria, acredita que há formas de se avançar, até palpita e aponta a criação de um grande porto náutico como uma das possíveis saídas ao desenvolvimento amapaense.

“Eu vim por causa da minha filha, mas quem vem à procura de emprego, também encontra bastante emprego aqui. Em relação ao Amapá, infelizmente é só a economia do contracheque: ou você passa em concurso público ou você puxa saco de algum político. Infelizmente, essa é a realidade”, concluiu o enfermeiro.

Dados

A Pesquisa Nacional por Amostra de domicílios (Pnad contínua) do IBGE é o melhor instrumento para a verificação das taxas de ocupação em cada Estado. Ao olharmos a última disponível, a do terceiro trimestre de 2020, encontramos respostas não apenas do porquê de muitas pessoas estarem indo embora do Amapá, mas também o motivo de serem Santa Catarina e Paraná os principais destinos.

O Amapá teve o segundo maior aumento em sua taxa de desocupação entre o segundo e o terceiro trimestre de 2020, um aumento de 3,8%. O Estado, que por tempos esteve perto da liderança nas taxas nacionais, hoje ocupa a 13ª posição do ranking.

Mas há outros dados importantes. O percentual de “pessoas trabalhando por conta própria” no Amapá é de 35,8%, o maior do país. Já Santa Catarina tem a maior taxa de empregados com carteira assinada com 90,5%, seguido justamente do Paraná, com 85,1%. São estados que têm indústrias variadas, desde as tradicionais alimentícias e metalurgia automotiva, até o turismo e um setor de serviços crescente.

Perspectivas e qualidade de vida

A macapaense Cássia de Souza Lima, de 25 anos, está completando um ano desde que se mudou para Curitiba junto com o esposo e o cachorrinho do casal. Ela, formada em administração e ele em vias de se formar em engenharia civil, tinham casa, carro e emprego em Macapá, mas sentiam falta de algo mais. E este algo a mais se chama perspectivas.

“A gente não tinha visão de futuro, porque Macapá não tinha muita oportunidade de crescimento na nossa área, no nosso trabalho. O mercado em Macapá para a engenharia civil, é muito escasso. A gente decidiu migrar para Curitiba em busca de oportunidades, crescimento, realizações”, contou a jovem.

Cássia está empregada, seu esposo também, eles moram em apartamento alugado e tem carro, e ela considera a ida exitosa até aqui.

“A nossa experiência em vir pra Curitiba foi como mudar da água pro vinho, nossa perspectiva cresceu, o nosso crescimento no mercado também, Curitiba é uma cidade muito grande, então tanto pro ramo de engenharia civil, que é do meu esposo, quanto na minha área de corretora de imóveis, eu ganhei bem mais espaço aqui do que em Macapá, e olha que eu amo minha cidade, nascida e criada em Macapá, porém, Macapá tem muitos problemas que têm que ser resolvidos”, destacou Cássia.

A corretora de imóveis, agora habitante da cidade do poeta Paulo Leminski, destaca coisas básicas, como a qualidade do asfalto das vias e opções de lazer para o final de semana, como também a complexidade que é o isolamento amapaense, de onde é caro se viajar para outros estados do país.

Nem tudo são flores

Apesar da qualidade de vida, nenhum dos entrevistados afirma que é tudo fácil e uma maravilha. Todos ressaltaram que é necessário esforço, dedicação e qualificação.

Além disso, a saudade da família e da comida, especialmente o açaí, são alguns dos pontos negativos que nossos personagens elencaram. Nenhum deles tem planos para voltar à Macapá em definitivo e, ao contrário, Zelindo já levou mais familiares seus para Florianópolis, enquanto que Cássia aguarda um grupo de mais oito amigos que irão se mudar para Curitiba, em fevereiro.  

Seles Nafes
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