No Amapá, juiz permite que condenados prestem serviço doando sangue

Ideia foi do juiz André Gonçalves e ganhou apoio da direção do tribunal. No entanto, opção só vale para crimes leves
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Por SELES NAFES

No Amapá, o juiz André Gonçalves assumiu há três meses a Vara de Execuções Penais e Medidas Alternativas e se deparou com uma nova realidade na pandemia. Ele ficou preocupado porque os locais para prestação de serviços comunitários estão fechados pelas restrições sanitárias, e vendo o desespero de famílias em busca de doações de sangue teve uma ideia: passou a permitir que condenados tenham a opção de doar para o hemocentro como forma de prestar serviço. E que serviço.

A iniciativa rapidamente ganhou o apoio de servidores e recebeu sinal verde do presidente do Tribunal de Justiça, o desembargador Rommel Araújo. A nova medida alternativa já começou a receber as primeiras adesões, e surge num momento delicado do Instituto de Hemoterapia do Amapá (Hemoap). Nunca houve tanta procura por sangue e tão poucas doações.

Doar sangue pode ser então uma espécie de remissão da pena?

Não chega a ser remissão (redução da pena). É uma alternativa para cumprir a prestação de serviço à comunidade realizando um serviço de grande interesse público, que é a doação.

Por que os detentos do Iapen não podem ser beneficiados?

Fazendo o projeto, eu descobri que eles só podem doar sangue 12 meses depois de sair do presídio. Por isso, o foco são as pessoas condenadas e não perigosas, que nunca entraram no Iapen.

Como o condenado pode ter acesso a essa alternativa? Já existe um acordo entre os magistrados para oferecer esse tipo de prestação de serviços?

Quando o magistrado determina a prestação de serviço vem pra a unidade que eu estou respondendo, que é a Vara de Execuções de Penas e Medidas Alternativas. Publicamos uma portaria, estamos divulgando e temos um serviço que seleciona os reeducandos para encaminhar ao hemocentro. A captação é pelo nosso setor social, onde as servidoras têm contato mensal com os reeducandos. Elas foram treinadas e vão perguntando para quem tem determinado perfil se eles têm interesse em participar.

Foto de antes da pandemia: doações despencaram. Foto: Rodrigo Índio

Quantos apenados podem se encaixar nesse projeto?

Temos mais de 1 mil.

Em que tipos de crimes é aplicada a prestação de serviços?

Crimes sem violência com pena inferior a quatro anos, mas também pode ser aplicado no contexto dos juizados especiais nas infrações de menor potencial, como calúnia, difamação, lesão corporal leve e até no acordo de não persecução penal, quando o réu ganha o direito de não ser processado mediante acordo com o Ministério Público. Uma das cláusulas do acordo pode ser a prestação de serviços…

De onde surgiu a ideia de oferecer essa possibilidade de doar sangue como prestação de serviço?

Estávamos batendo cabeça porque, com a pandemia, a maioria dos locais onde os serviços são prestados está fechada por causa das restrições sanitárias, como escolas e órgãos públicos. Tivemos esse impacto. Não tinha para onde mandar os apenados. Vimos então muita gente precisando de sangue, pesquisamos e vimos que em Goiás o tribunal já faz isso. Houve questionamentos no CNJ, que acabou apoiando a ideia. Se o Conselho Nacional diz que pode, então pedimos autorização do presidente que se entusiasmou. Entrarmos em contato com o Hemoap e foram super receptivos. Fomos atrás das autorizações e fizemos o projeto.

Seles Nafes
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