A Amazônia Azul Amapaense e a ‘Década do Oceano’

Pororoca no município de Amapá. O professor Gutemberg de Vilhena fala sobre a ação da ONU que pretende evidenciar ação científicas proativas
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Por GUTEMBERG DE VILHENA SILVA, geógrafo

Que a humanidade tem uma grande dependência do oceano, isso não é novidade. Boa parte do comércio internacional, a rica vida marinha, recursos energéticos e a regulação do clima são algumas das muitas de suas utilidades e do seu imenso valor. O curso de 2021 é particularmente importante para a agenda internacional voltada para ele. Inicia-se a “Década do Oceano” (2021-2030), uma ação estratégica promovida pela Organização das Nações Unidas (ONU) e abraçada por muitas nações que tem como slogan “a ciência que precisamos para o oceano que queremos”. Espera-se que seja um momento dedicado a intensos debates e ações científicas mais proativas dedicadas ao entendimento do “mundo marinho” para aprimorar a disponibilidade de dados e fortalecer a sua gestão responsável e sustentável.

Municípios amapaenses na zona costeira e a Amazônia Azul

Para o Brasil, com seus quase 7,5 mil km de litoral (16º maior do mundo), a década é muito importante. É um momento de redobrar as estratégias político-econômicas e científicas sobre a Amazônia Azul – expressão da Marinha do Brasil para uma área de cerca de 3,6 milhões de km2 na sua zona costeira. Esta zona é a interface entre o continente e o mar, com sua configuração definida por processos originados nas bacias de drenagem fluvial e por dinâmicas oceanográficas e atmosféricas. Por isso, é um ambiente complexo, diversificado e de extrema importância para a manutenção-sustentação da vida marinha. Em outras palavras, a zona costeira apresenta sistemas ambientais extraordinariamente diversos e relevantes para a vida no mundo.

Na Amazônia Azul, estão 279 municípios de 17 estados brasileiros. Um destes estados é o Amapá, o estado mais ao norte do litoral do Brasil e o único cuja maior parte da costa está acima da linha do Equador. De seus 16 municípios, quatro estão na zona costeira, incluindo Macapá, sua capital, por onde desagua uma parte do grandioso Rio Amazonas, rio este que influencia muito a hidrodinâmica de todo o litoral amapaense. Além da capital, estão Amapá, Calçoene e Oiapoque, municípios altamente dependentes da pesca marinha e com um enorme potencial (eco)turístico.

O mangue é um grande exemplo da complexidade dos ambientes fluvio-marinhos no litoral amapaense. Fonte: Gutemberg Silva. Trabalho de Campo, outubro de 2021. Fotos: Clícia Di Micelli

Praia do Goiabal, município de Calçoene

Dois fenômenos: pororoca e terras caídas

Toda a zona costeira amapaense é identificada como extremamente relevante para a vida biológica (ver Mapa 1). Em razão dessa riqueza, três grandes unidades de conservação de proteção integral colaboram para a segurança de uma parte da vida nativa contra a degradação: o Parque Nacional do Cabo Orange, em Oiapoque e Calçoene; a Estação Ecológica Maracá-Jipioca e a Reserva Biológica do Lago Piratuba, ambas no município do Amapá. Tal proteção é particularmente relevante porque o aumento demográfico nos municípios litorâneos e a demanda internacional de pescado implicam em maior pressão nos recursos da zona costeira, seja para alimentação seja como valor comercial.

As forças contra a integridade e ao equilíbrio ambiental das zonas costeiras fazem delas uma das mais ameaçadas do planeta e, de outra parte, sua conservação se mostra cada vez mais difícil e onerosa financeiramente ainda mais quando submetidas à pressão econômica quando da descoberta de reservas de petróleo, como é o caso do Amapá. Sabe-se que essa exploração seria um desastre para bancos de corais de grandioso valor para a vida marinha.

Foto tirada há uma semana no município de Amapá, sinalizando que na localidade ainda é possível visualizar a pororoca

A “Década do Oceano” é momento oportuno para se avançar nas ações de conhecimento científico e na valorização de potencialidades locais com responsabilidade ambiental. A Amazônia Azul Amapaense precisa, assim, ser entendida, ‘ressignificada’ e tratada como efetivamente merece: palco de uma multiplicidade de ritmos de vida marinha e indutora do desenvolvimento dos municípios litorâneos. O que a zona costeira dispõe tem muitos significados e importância.

Ela é fonte alimentar, possui valor para fármacos, cosméticos, produtos medicinais, fertilizantes, biotecnologia e, ainda, matéria-prima para indústrias. Toda sua cadeia de uso estratégico precisa ser considerada e as ações político-institucionais de curto, médio e longo prazos precisam pôr em evidência essas variáveis.

Doutor Gutemberg de Vilhena Silva é professor na Universidade Federal do Amapá. Email: [email protected]

Seles Nafes
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