APAGÃO: 4 anos depois, MPF pede R$ 70 bilhões em indenizações

A procuradora da República, Sarah Cavalcanti, conduziu as investigações, que duraram 4 anos, desde o ocorrido, em novembro de 2020.
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Por ALLAN VALENTE

O Ministério Público Federal ajuizou uma ação civil pública no valor de R$ 70 bilhões responsabilizando diversos entes públicos pelos danos provocados pelo apagão ocorrido em novembro de 2020 no Amapá. A informação foi divulgada pela procuradora da República, Sarah Cavalcanti durante coletiva de imprensa, realizada nesta quinta (6) na sede do órgão, em Macapá.

A ação tem como réus a União, a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), o Operador Nacional de Sistema Elétrico (ONS), a Linhas Macapá Transmissora de Energia Elétrica (LMTE), a Companhia Elétrica do Amapá (CEA) e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Também foram processadas as controladoras da LMTE – Gemini Energy e Energisa SA – e a controladora da CEA, Equatorial Participações e Investimentos.

Foram 4 anos de investigação. Foto: LEONARDO MELO/SN

O processo, de mais de 500 páginas, detalha a participação de cada um deles e foi protocolado no dia 1º de fevereiro. A investigação concluiu falhas como o descumprimento dos critérios de segurança pela LMTE, que não realizou a manutenção periódica dos transformadores da Subestação Macapá, ocasionando o apagão. Além disso, segundo o MPF, houve negligência no cumprimento das normas legais que regulamentam o setor e os padrões de prestação de serviços.

Por outro lado, houve omissão por parte do ONS, que tinha conhecimento da indisponibilidade dos equipamentos e da postergação dos prazos para finalização das manutenções, mas não agiu para evitar o incidente. A CEA, por sua vez, não implementou o rodízio de energia durante a crise. A ação judicial também questiona a ausência de atuação fiscalizatória por parte da ANEEL e a falta de planejamento da EPE.

Procuradora da República, Sarah Cavalcanti. Foto: Allan Valente

“A premissa fundamental que estabelecemos desde o início da investigação foi que o apagão não se resumisse à queima de um transformador, possivelmente inicialmente aventado pelos órgãos de fiscalização na esfera administrativa. De fato, a queima do transformador em linhas de transmissão já concluídas foi um fator decisivo para a interrupção do fornecimento de energia elétrica, que perdurou por 21 dias no Estado”, declarou a procuradora.

Ela ressaltou que, em um contexto setorial adequado, o fato poderia ter ocorrido sem maiores danos, mantendo-se dentro da normalidade. Entretanto, uma convergência de omissões, falhas e equívocos no planejamento e na atuação das empresas responsáveis ​​agravou o cenário.

“Houve falta de planejamento setorial, atribuída à EPE e à União. A ANEEL falhou enquanto fiscalizador. Temos vários documentos que corroboram essa afirmação”.

A procuradora também ressaltou que o MPF enfrentou dificuldades no caso, entre as quais está o fato de se tratar de uma investigação de ordem técnica, que envolve aprofundamento, conceitos e atribuições de engenharia elétrica – uma complexidade que, segundo ela, exigiu muitos esforços.

Para o MPF, o apagão não se resumiu apenas à queima de um transformador

“Contamos também com a atuação, seja na cooperação ou na fiscalização, dos próprios órgãos envolvidos no caso. Esse foi outro grande problema, pois precisávamos da apuração pelos órgãos responsáveis, o que gerou uma dificuldade enorme para o MPF. Assim sendo, tivemos que contar com nossa própria perícia técnica – foram 28 mil páginas de apuração e quatro anos de investigação de uma matéria extremamente complexa”, afirmou.

Outro contratempo foi o cálculo do ressarcimento dos danos pelos peritos, que encontrou dificuldades em seus laudos técnicos devido à ausência de uma metodologia adequada para quantificar a extensão do prejuízo.

“Essa é uma oportunidade que o MPF tem de indicar as falhas que consideramos essenciais para que ocorram não apenas a queima de um transformador, mas a queima de um transformador num contexto em que não há um sistema de confiabilidade e segurança, decorrente de omissões e atuações equivocadas de vários órgãos setoriais”, explicou a procuradora.

Filas se formaram em postos de combustíveis. Fotos: Arquivo SN

Quanto às negociações, Cavalcanti destacou que estas serão aplicadas na esfera cível, fundamentadas em três posições.

“Pedimos o ressarcimento ao cidadão amapaense a partir de três fundamentos: temos o dano moral, que é individual e torna a ação onerosa; o dano moral coletivo, que afeta toda a coletividade; e, finalmente, o dano social, que decorre do abalo no próprio estilo de vida da população [um ponto de deficiência na forma de viver naquela comunidade]. O Ministério Público quer, mais uma vez, trazer à tona a reflexão de que a energia elétrica é um bem imprescindível, que não pode ser concebida como um mero bem de consumo, restrito apenas àqueles indivíduos que podem pagar, mas sim como um direito de todos os cidadãos”, concluiu.

O MPF pede na ação o bloqueio de 30% do orçamento da União destinado à publicidade e propaganda a partir de 2025, e de 20% do orçamento total da EPE, também a partir de 2025, para depósito em juízo. Além disso, requer que a LMTE deposite imediatamente R$ 70 milhões em juízo. A ação também busca a condenação solidária de todos os réus pelos danos causados à população.

Capital e outros 12 municípios enfrentaram 21 dias apagão total

O apagão fez com que 13 dos 16 municípios do Amapá ficassem sem energia elétrica. O blecaute atingiu mais de 90% da população. Cerca de 660 mil pessoas ficaram no escuro em plena pandemia de covid-19 e em um período de muitas chuvas e alagamentos no estado. O evento provocou, ainda, o adiamento das eleições gerais de 2020.

Seles Nafes
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