Por SELES NAFES
Uma investigação minuciosa da Corregedoria da Polícia Civil do Amapá revelou detalhes de um escândalo envolvendo o delegado Vladson Souza do Nascimento. O inquérito, concluído no último dia 12 de junho, apontou que o delegado usou a estrutura da Polícia Civil para tramar a prisão flagrante do atual companheiro de sua ex-namorada, forjar provas e, além disso, manteve drogas armazenadas em sua própria sala na delegacia de Pracuúba.
O inquérito, de número 8880/2024, foi instaurado em novembro do ano passado e detalha um enredo de vingança pessoal, abuso de autoridade, tráfico de drogas e destruição de provas. Ao final das investigações, Vladson Nascimento foi indiciado por abuso de autoridade (duas vezes), tráfico de drogas (duas vezes) e porte ilegal de arma de fogo.
Prisão forjada por vingança pessoal
O episódio mais grave relatado no inquérito ocorreu em outubro de 2024, quando o delegado teria orquestrado a prisão de Amadeu Moraes de Souza Júnior e Semiana Maciel Chagas. A motivação, segundo o relatório, foi pessoal: Amadeu teria exposto à esposa do delegado, Soane Ferreira, o relacionamento extraconjugal que Vladson mantinha com Semiana.
O relatório aponta que, após a exposição, Vladson passou a perseguir o casal. Ele criou um perfil falso no Instagram para enviar ameaças a Amadeu Júnior, acessou ilegalmente sistemas da polícia para obter dados pessoais das vítimas e utilizou um dispositivo de rastreamento instalado no veículo de Amadeu para monitorá-lo chamado de “carrapato”.
No dia 23 de outubro, monitorando a localização das vítimas, Vladson se deslocou até Santana, onde, segundo o relatório, teria repassado um “kit flagrante” contendo drogas e arma ao seu cunhado, o tenente da Polícia Militar Estefany Johansson Ferreira, responsável pela abordagem.
Logo após, o casal foi preso na Rodovia Duca Serra, acusado de porte de drogas e arma de fogo. Entretanto, imagens de câmeras de segurança e laudos técnicos comprovaram que a suposta perseguição policial não ocorreu como relatado. Exames e perícias também confirmaram que as vítimas não tinham envolvimento com drogas ou atividades criminosas.

Momento do flagrante a Amadeu, na Rodovia Duca Serra
Drogas no gabinete e destruição de provas
Dois meses depois, em dezembro, durante buscas na Delegacia de Pracuúba, onde Vladson era titular, a Corregedoria encontrou drogas escondidas na gaveta de sua mesa. As porções de crack e cocaína tinham as mesmas características das supostamente plantadas no carro das vítimas.
Segundo servidores, apenas Vladson tinha acesso ao local, e não havia registros de apreensões de drogas na delegacia naquela semana.
Quando agentes cumpriram mandado de busca em sua residência, o delegado formatou o celular, destruindo provas que seriam cruciais para as investigações.
O relatório também cita que Vladson vinha monitorando ilegalmente boletins de ocorrência da Corregedoria e usava suas redes sociais para tentar desacreditar o trabalho dos investigadores, insinuando perseguição institucional.

Pedras de crack que teríam sido encontradas no carro

Delegado Vladson continua afastado das funções
Histórico de abusos e indiciamento
Não é a primeira vez que o delegado é investigado por condutas abusivas. Desde 2018, nove procedimentos apuram excessos de autoridade praticados por ele, incluindo um caso em que teria prendido uma médica grávida por se recusar a realizar um exame sem respaldo legal.
Diante das provas reunidas, a corregedoria indicia Vladson Nascimento e recomenda a aplicação de medidas cautelares como monitoração eletrônica, suspensão do exercício da função e do porte de arma.
Ele continua afastado das funções. Agora, com o compartilhamento de provas do inquérito autorizado pela justiça, inicia-se o Processo Administrativo Disciplinar (PAD), que pode resultar na demissão de Nascimento. O Portal SN tenta contato com a defesa dele.
O caso também foi encaminhado à Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público, à Promotoria Criminal e à Auditoria Militar, para aprofundamento das investigações, inclusive sobre o suposto envolvimento do tenente da PM, cunhado do delegado.
O relatório, assinado pelo delegado Tilly Agra Oliveira Marreiro, conclui que as atitudes de Vladson revelam “conduta gravemente incompatível com o cargo público e os deveres funcionais”.