Por MARCO ANTÔNIO P. COSTA
Seis dias após os primeiros animais aparecerem mortos em Pedra Branca do Amapari, município do centro-oeste amapaense, distante 190 quilômetros da capital, a causa da morte dos animais segue um mistério sem solução, envolto em muitas teorias e possibilidades que pairam – e até dividem -, as opiniões dos moradores e atores econômicos e políticos da cidade.
O Portal SelesNafes.Com esteve na cidade na quarta-feira (1º), visitou diversas propriedades, a prefeitura e a empresa Mina Tucana, grupo canadense com capital aberto nas bolsas de Toronto e Nova Iorque que explora ouro na região.
Foram muitas histórias e versões sobre o fato. Até o momento, mais de duas toneladas de animais mortos foram retiradas dos igarapés e do rio, e mais de 10 mil pessoas estão sem consumir a água do ‘seu’ próprio rio, o Amapari, gigante que nasce no Tumucumaque e despeja suas águas no Araguari.
Cianeto?
O cianeto é um composto químico utilizado em diversos ramos da economia e também na mineração. A empresa Mina Tucano o utiliza como parte do processo de obtenção e concentração do ouro que extrai de toneladas de rochas, terra e outros elementos.
O cianeto foi o primeiro a ser apontado como causador do problema, no entanto, a Prefeitura de Pedra Branca do Amapari anunciou, nesta quarta-feira (2), que os resultados das primeiras análises do composto químico deram resultado negativo. Outros testes, de outros órgãos e prazos similares estão sendo realizados.
Timbó ou garimpo?
Outras hipóteses levantadas por autoridades são o timbó, prática de pesca que utiliza a toxicidade de uma planta; o garimpo rudimentar, que utiliza mercúrio para concentrar o outro; e a chamada ‘macaxeira braba’, que também produziria cianeto ou algum outro elemento químico danoso aos animais.
Porém, os moradores dos igarapés mais atingidos contestam com veemência qualquer uma destas hipóteses.
Eles explicaram que a prática de se usar o timbó não é comum na região, mas pela vivência amazônica, seria necessária uma quantidade enorme – quase incalculável – de timbó, para causar tamanha mortandade em tal vasta área. Além disso, usam seu conhecimento de ribeirinhos para refugar a tese.
“A lontra, se percebesse timbó na água, ia pra terra. Se fosse timbó, não mataria lontra. Isso é veneno que vem da empresa. Esse aqui é o Igarapé do Areia. Isso aqui que nós estamos vendo é de onde eu acho que veio o veneno que saiu, eu acho, o cianeto, que veio da barragem deles. Eu não estou falando que é uma verdade, mas eu sinto que é do ´arroto´ deles que veio isso aí. Na quinta-feira choveu e na sexta-feira começou a morrer peixe pela tarde”, revelou Arnaldo Viana de Almeida, morador da comunidade Xivete.
Caminho da mortandade
A equipe do Portal SelesNafes.Com seguiu o caminho apontado pelos moradores como o sendo o caminho por onde a mortandade alastrou-se.
Saindo da empresa Mina Tucano, a estrada onde a mesma localiza-se, a do Taperebá, segue até Serra do Navio e antes disso, ao seu lado direito e depois atravessando-a, segue o Igarapé do Areia. É dele e por ele que começou a morte de peixes. Em dado momento, ele junta-se aos igarapés Silvestre e Xivetem até, aproximadamente 4 quilômetros depois, desaguar no Rio Amapari.
Em todo o trajeto o que chamou atenção foi a ausência de peixes no Igarapé do Areia. Nos outros, antes do momento em que se encontram, há peixes. Depois, não. A observação dos moradores foi confirmada por nossa equipe in loco.
Quanto às hipóteses de garimpeiros rudimentares e ou das toxinas da mandioca, eles acreditam ser tão ou mais mirabolantes que a do timbó, destacando que nunca tinha ocorrido um evento similar na região.
Prefeitura
O secretário de meio ambiente de Pedra Branca, Raphael Araújo, falou em aguardar os resultados, e acrescentou às três hipóteses, o vazamento de algum agrotóxico.
Mina Tucano
A Mina Tucano é a maior empresa de mineração em atividade no Amapá. Sua estrutura é bastante grande, gerando 495 empregos diretos e cerca de 1.500 indiretos, importante para a economia dos municípios de Pedra Branca e Serra do Navio.
A empresa informou ao portal, ainda na segunda-feira (30), que havia tomado conhecimento do problema e que estava colaborando. Parte de nossa equipe foi recebida na sede da empresa Pedra Branca. Não pudemos entrar com celular ou outro equipamento que pudesse realizar gravações. A conversa foi cordial e nos foi explicado que desde o início a empresa tem colaborado.
A comunicação oficial, no entanto, parte de uma empresa específica que faz assessoria de comunicação. Mesmo assim, os representantes da empresa comunicaram que colocaram carros pipa e abriram a sede da Mina Tucano para a prefeitura e representantes do Governo do Amapá.
A assessoria nacional respondeu, nesta quinta-feira aos questionamentos do Portal SN. Acompanhe as respostas:
Houve vazamento de algum tipo de material, seja químico ou rejeito da Mina Tucano?
Não. Não houve registro de qualquer vazamento nas dependências da empresa.
A empresa trabalha com cianeto? Com qual finalidade?
Sim. A empresa utiliza o cianeto em seu processo de extração de ouro, adotando todas as normas de segurança impostas pelas autoridades competentes.
O Igarapé do Areia, que tem sua cabeceira na área da Mina Tucano. Nossa reportagem seguiu a trajetória do igarapé e as propriedades pelas quais ele passa, estando claro que ele foi um dos mais atingidos, até se chegar ao igarapé Silvestre, depois Xivete e, por fim, no Rio Amapari. Por conta disso, moradores acreditam que a empresa pode estar relacionada à mortandade. O que a Mina Tucano tem a declarar sobre a acusação?
Em 28 de novembro, a Mina Tucano tomou conhecimento sobre a mortandade de peixes no Igarapé Xivete. Desde então, a empresa vem contribuindo com as autoridades para avaliar as razões.
De forma proativa, a companhia disponibilizou às autoridades, durante toda a última segunda-feira, 29, uma equipe técnica e recursos internos, incluindo o laboratório químico para dar apoio à análise das primeiras amostras coletadas.
Para apoiar as ações de assistência à comunidade, a companhia disponibilizou três caminhões-pipas para auxiliar a Prefeitura de Pedra Branca do Amapari no fornecimento de água do município, além de água mineral que está sendo distribuída à comunidade.